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Setor aeroespacial é motor de desenvolvimento em Marrocos

Daniel Michaels
The Wall Street Journal

Nassima Boukhriss nunca pôs os pés em um avião, mas em breve ela estará ajudando a montar a fiação dos jatos mais avançados do mundo.

A estudante de uma escola técnica, de 22 anos, está participando de um dos mais ambiciosos projetos de desenvolvimento econômico do Norte da África: iniciar uma indústria aeroespacial.

Em todo o Marrocos, milhões de pessoas não têm trabalho, acesso à educação básica ou até mesmo à água ou saneamento. O setor manufatureiro continua sendo uma pequena parte da economia em comparação com a agricultura e o turismo. A indústria têxtil, que não exige mão de obra qualificada, é um dos maiores setores.

No entanto, nos últimos dez anos, a americana Boeing Co., a francesa Safran SA e outras companhias líderes da industrial mundial da aviação vêm construído fábricas cada vez mais sofisticadas neste reino. Enquanto revoluções varriam os países vizinhos no ano passado, as gigantes aeroespaciais United Technologies Corp. e Bombardier Inc. anunciavam investimentos de mais de US$ 200 milhões em novas fábricas marroquinas. Para garantir que o país tenha mão de obra qualificada, o governo e um grupo setorial abriu em maio o Instituto Aeroespacial Marroquino, ou IAM, a escola técnica que Boukhriss frequenta.

O resultado é que a indústria da aviação emprega hoje quase 10.000 marroquinos que ganham uns 15% a mais que o salário médio do país, de cerca de US$ 320. As autoridades marroquinas estão apostando que, com a entrada em setores manufatureiros mais avançados como o aeroespacial e eletrônico, o país também pode atrair indústrias mais básicas.

"Quando você tem sucesso na indústria aeroespacial, pode ter sucesso em outras indústrias", disse Hamid El-Benbrahim Andaloussi, presidente da entidade que representa o setor aeroespacial de Marrocos, a Gimas.

Isso ainda não aconteceu. A participação do setor manufatureiro na economia de Marrocos na verdade diminuiu nos últimos dez anos. O desemprego do país chega a cerca de 30% tanto entre jovens quanto pessoas com alta educação – os mesmos grupos que ajudaram a liderar as revoltas no Egito e na Tunísia.

As revoluções da Primavera Árabe puseram nova urgência em provar que a aposta de Marrocos no setor aeroespacial pode dar resultados. O rei Mohammed VI conseguiu em março passado neutralizar protestos, oferecendo uma constituição mais democrática e novas eleições, que ocorreram de forma pacífica, em novembro. Mas, para manter a paz em Marrocos, dizem os analistas, deve criar emprego.

"A taxa de desemprego está no coração do que está ocorrendo na região", diz Karim Belayachi, especialista em desenvolvimento do setor privado do Banco Mundial.

Os esforços de Marrocos para incentivar a aeronáutica comercial são bastante raros entre economias em desenvolvimento. Brasil, Indonésia e África do Sul desenvolveram, no século passado, empresas aeroespaciais militares, mas apenas a Empresa Brasileira de Aeronáutica SA, a Embraer, agora privatizada, teve sucesso ao mudar-se para a fabricação de aviões de passageiros. Hoje, ela é uma das principais empresas do país. O México recentemente atraiu fabricantes de componentes aeroespaciais, mas eles continuam a ser uma pequena parte da economia local.

Muito mais países se expandiram com investimentos em tecnologia e no setor automobilístico, como Marrocos também está tentando. Taiwan, Coreia do Sul e Eslováquia, por exemplo, contaram com investimentos estrangeiros ou patrocinados pelo Estado, mesclados ao empreendedorismo local, para o crescimento econômico. Mas esses países promoveram climas regulatórios mais amigáveis a empresas novatas que o existente em Marrocos e contavam com mão de obra qualificada. A educação em Marrocos é inferior a de seus pares econômicos, de acordo com o Banco Mundial.

O desenvolvimento aeroespacial de Marrocos começou em 1999 com um empurrão de Benbrahim, da Gimas, que era então um alto executivo da Royal Air Maroc, uma cliente da Boeing de longa data. Ele e outros funcionários da companhia aérea nacional pediram à gigante americana que investisse em Marrocos como um sinal de boa fé.

"Houve uma oposição interna na Boeing", de executivos que consideravam o investimento desnecessário, lembra Seddik Belyamani, um marroquino que na época era um dos principais vendedores de aviões da Boeing.

Mas a conexão marroquina e um desejo de ganhar vantagem sobre a rival Airbus prevaleceram. A Boeing, a companhia aérea, e a fabricante francesa de fiação elétrica Labinal SA abriram em 2001 uma pequena empresa para preparar fios para os jatos Boeing 737, chamada Matis. A equipe cuidadosamente preparava feixes de fios elétricos e os enviava para as fábricas da Boeing nos EUA para instalação.

O trabalho de mão de obra intensiva não exigia nenhum conhecimento técnico, ainda assim os gerentes da Boeing inicialmente não esperavam alcançar eficiência de apenas 30% das normas do setor. Para sua surpresa, a equipe alcançou 70% de eficiência dentro de dois anos, lembra Belyamani, que se aposentou da Boeing em 2002 e recentemente foi nomeado presidente da Matis.

Os resultados impressionaram os executivos da Labinal, que em 2000 havia sido adquirida pelo grupo aeroespacial francês que hoje se chama Safran. Os gerentes viram que, à medida que a Matis crescia, vagas de emprego atraíam candidatos altamente qualificados. Mais de 80% são mulheres, que têm oportunidades limitadas de emprego nas indústrias tradicionais.

O único estrangeiro entre os 700 funcionários da Matis hoje é o gerente geral francês, Sébastien Jaulerry, que anteriormente trabalhou para a Labinal nos EUA e na França. Andando pela impecável fábrica recentemente, ele disse que os funcionários alcançaram "exatamente o mesmo padrão" de qualidade que suas fábricas anteriores.

A equipe da Matis prepara fios não só para a Boeing, mas também para motores da General Electric Co., para jatos executivos da Dassault Aviation SA e até aviões Airbus. Incentivada pelos resultados da Matis, a Safran expandiu-se em mais de manufatura avançada,

Hoje, o governo marroquino destaca o setor aeroespacial como um sucesso dentro do projeto mais amplo de modernização econômica do país.

Os executivos de empresas que investem no país veem um sinal de esperança na criação da IAM, a escola técnica, que vai formar centenas de estudantes anualmente. O centro é uma parceria entre o governo, que contribuiu com infraestrutura, e do grupo setorial, o Gimas. Seus membros organizam e patrocinam o treinamento, que segue as normas francesas, para suas novas contratações.

"É uma grande oportunidade porque aprendemos habilidades altamente técnicas em eletrônica", disse Boukhriss, a aluna de 22 anos.

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