Foi publicada no Diário Oficial da União desta terça-feira (26) a Lei 13.319/2016, que promove diversas mudanças na aviação brasileira. Com origem na Medida Provisória (MPV) 714/2016, a norma foi publicada com cinco vetos. Um deles é sobre o trecho que ampliava em até 100% a possibilidade de participação de capital estrangeiro nas empresas aéreas brasileiras.
A MP original, editada pela presidente afastada Dilma Rousseff, previa aumento de 20% para 49% no limite máximo de capital estrangeiro, com direito a voto, nas empresas aéreas. A possibilidade de abertura total do setor foi inserida durante votação da matéria na Câmara dos Deputados, em 21 de junho, por meio de emenda do PMDB, aprovada por 199 votos a 71.
No Senado a mudança não foi bem recebida. O texto foi aprovado de forma simbólica em 29 de junho no Plenário, mas só depois de acordo para que fosse vetada essa mudança feita pela Câmara. Antes do fim da votação, o líder do governo no Senado, Aloysio Nunes (PSDB-SP), garantiu que o presidente interino Michel Temer tinha se comprometido a vetar a abertura total ao capital estrangeiro. Segundo Aloysio Nunes, a discussão sobre o tema acontecerá agora ou por projeto de lei a ser enviado pelo Executivo ou dentro da comissão especial de reforma do Código Brasileiro de Aeronáutica (CBA).
Os senadores alegaram que a questão é muito complexa, exigindo, por isso, debate mais aprofundado. A relatora da matéria foi a senadora Ângela Portela (PT-RR).
De acordo com a justificativa do veto apresentada por Temer, a proposta inicial de aumento do capital estrangeiro para 49% era “meritória”. Entretanto, afirma-se ainda, a elevação dessa participação para até 100% não é adequada ao interesse público.
Adicional de Tarifa Aeroportuária
Entre as medidas trazidas pela Lei 13.319/2016 e mantidas pela Presidência da República, estão o perdão de débitos da Infraero com a União e a criação de subsidiárias da estatal, além da extinção do Adicional de Tarifa Aeroportuária e sua incorporação na composição das próprias tarifas.
O texto extingue, a partir de 1º de janeiro de 2017, o Adicional de Tarifa Aeroportuária (Ataero), devido pelas companhias às empresas de administração aeroportuária. O tributo incide no valor de 35,9% sobre as tarifas pagas pelos passageiros (embarque) e pelas companhias aéreas (pouso, permanência de aeronave, armazenagem e de conexão). O Ataero foi criado pela Lei 7.920/1989. Os recursos arrecadados (R$ 679,7 milhões em 2015) são enviados para o Fundo Nacional de Aviação Civil (Fnac), que financia o setor de aviação civil e a infraestrutura aeroportuária.
De acordo com a MP, o valor do Ataero será incorporado às tarifas a partir de 2017, sem redução tarifária para passageiros e companhias. A partir da incorporação do adicional à tarifa, a Anac terá 180 dias para concluir processos de recomposição do equilíbrio econômico-financeiro dos contratos das concessionárias de aeroportos concedidos à iniciativa privada.
Nesse período, a diferença entre as tarifas revistas e as previstas no contrato continuará a ir para o Fnac, a título de contrapartida pela União em razão da outorga do serviço. Depois da revisão dos contratos, as concessionárias ficarão com o montante gerado pelo adicional incorporado.
Devido à incorporação do adicional à tarifa, o Senado manteve emenda da Câmara para deixar claro que o novo valor não entrará na base de cálculo usada para aplicar multas aos concessionários de aeroportos ou para o repasse de montante recolhido a título de contribuição variável ao poder público.
A Infraero opera 60 aeroportos no país, a maioria com prejuízo. Antes da privatização de aeroportos rentáveis, como os de Guarulhos e de Brasília, o órgão usava a sobra de caixa desses para custear outros de menor rentabilidade.
Perdão à Infraero
O texto prevê ainda o perdão dos débitos da Infraero com a União quanto aos repasses pendentes de parte do adicional relativos a 1º de dezembro de 2013 a 31 de dezembro de 2016.
Outra novidade é a proibição de contingenciamento dos recursos capitalizados do Fnac ou de transferência ao Tesouro.
Contratação direta
Quanto à forma de a Infraero atuar no setor, a MP estabelece a criação de subsidiárias ou participação em outras sociedades públicas ou privadas, que poderá ocorrer por meio de ato administrativo ou contratação direta.
Segundo previsão divulgada pelo governo à época da edição da MP, em março de 2016, a empresa se dividirá em Infraero Serviços, para prestar serviços aos aeroportos regionais; a Infraero Participações, que ficará com as ações da estatal nas sociedades formadas para explorar os aeroportos que foram privatizados (49% de Guarulhos, Brasília, Viracopos, Galeão e Confins); e a Infraero Navegação Aérea. O texto permite à Infraero transferir a empresa de navegação aérea ao Comando da Aeronáutica. Já as outras duas empresas poderão atuar também no exterior.
Linhas regionais
O texto também cria as chamadas linhas pioneiras, que poderão ser exploradas de forma exclusiva pelas companhias aéreas por um prazo de dez anos por operadoras regionais. A ideia é servir rotas de baixa densidade de tráfego e que não estejam sendo operadas comercialmente na data de publicação da MP. Elas não poderão, entretanto, receber subsídios federais.
As companhias aéreas terão de abrir uma subsidiária para operar essas linhas, destinadas a alimentar linhas comerciais por meio de acordo de cooperação (code share) ou de contrato de prestação de serviços e terão características, regulação e custos diferentes das atuais linhas.
Aviação regional
A medida estabelece ainda que as companhias aéreas deverão reservar até 20% de seus voos para aeroportos regionais, quando da autorização de voos regulares de transporte de passageiros pela Agência Nacional de Aviação Civil (Anac). Estabelece ainda o acesso controlado às pistas de taxiamento, de pouso e de decolagem para áreas privadas adjacentes aos aeroportos. O acesso será por meio de convênio com a administradora do aeroporto.
Intercâmbio de aeronave
Para disciplinar prática prevista no Registro Aeronáutico Brasileiro (RAB), o texto disciplina o intercâmbio de aeronave ou de motores entre companhias aéreas. A intercambiadora cede o direito de uso à empresa de transporte aéreo de outra nacionalidade, beneficiária do intercâmbio, por tempo determinado, para sua operação em troca de remuneração.
No caso das aeronaves estrangeiras intercambiadas com empresas brasileiras de transporte aéreo, o projeto exige que elas passem por vistoria técnica e sejam inscritas no registro aeronáutico. A aeronave em intercâmbio deverá manter as suas marcas de nacionalidade e de matrícula de origem, possuindo apenas um certificado brasileiro de aeronavegabilidade.
A beneficiária será integralmente responsável por quaisquer danos causados em decorrência do uso da aeronave no período em que a mesma estiver sob sua titularidade. As empresas beneficiárias do intercâmbio deverão empregar tripulantes brasileiros com contrato de trabalho no Brasil.
Durante o período em que a aeronave estiver sujeita ao intercâmbio, a beneficiária poderá operá-la livremente em qualquer rota no Brasil, sobrevoar o território do país de origem da intercambiadora, pousar nele para fins comerciais, embarcar e desembarcar passageiros, bagagens, carga e mala postal. Esse tipo de intercâmbio deve observar ainda as regras e recomendações previstas em tratados, convenções ou acordos internacionais celebrados pelo Brasil.
Aeronaves abandonadas
Para evitar que restrinjam a operação do aeroporto, dificultem a ampliação de sua capacidade ou seu regular funcionamento, novo artigo incluído no Código Brasileiro de Aeronáutica (CBA) pela MP permite que o operador aeroportuário remova aeronaves, equipamentos e outros bens deixados nas áreas aeroportuárias. A iniciativa leva em conta riscos sanitários ou ambientais, e abrange principalmente aeronaves e bens integrantes de massa falida de companhias como a Vasp e a Transbrasil.
Outros vetos
Além de barrar a participação em 100% do capital estrangeiro, Temer vetou a possibilidade de autorização a associações civis para executar serviços aéreos especializados de ensino, adestramento, investigação, experimentação científica e fomento ou proteção ao solo, meio ambiente e similares. Outro veto foi ao inciso que obrigava a operação nos voos internacionais por tripulação brasileira com contrato no país. De acordo com as razões dos vetos, tais medidas poderiam trazer mais custos aos voos, e também dificultar a operação deles, sobretudo aos que têm escala no país.
Também houve veto ao uso de recursos do Fundo Nacional de Aviação Civil (Fnac) para o financiamento a equipamentos para aeroclubes e a formação de pilotos e outros profissionais de aviação. Tal dispositivo não tem pertinência ao tema inicial da MP, de acordo com a justificativa para o veto.