Depois de mais de mil voos com biocombustível, a companhia aérea alemã Lufthansa volta a abastecer suas aeronaves com querosene comum. O problema: não existe bioquerosene suficiente para atender a demanda.
O voo do Boeing 747 de Frankfurt para Washington nesta sexta-feira (13/01) terá sido o último de uma série de voos experimentais da Lufthansa com bioquerosene. Desde julho de 2011, as aeronaves da maior companhia aérea alemã voaram exatamente 1187 vezes com biocombustível entre Frankfurt e Hamburgo.
Com isso, a Lufthansa evitou a emissão de 1,5 mil toneladas de dióxido de carbono (CO2), segundo dados da própria companhia. Só no voo para Washington serão economizadas 38 toneladas de gases causadores do efeito estufa em comparação com o querosene fóssil.
A busca da Lufthansa e de outras companhias aéreas por alternativas não tem apenas razões econômicas. Desde o início de 2012, a União Europeia obriga todas as companhias aéreas a comprovarem direitos de emissão de CO2 através de créditos de carbono para voos com origem ou destino na Europa. Em outras palavras: quanto mais CO2 o voo emitir, mais caro ficará para a companhia.
Biocombustível insuficiente
O teste foi considerado bem-sucedido pela Lufthansa. "O biocombustível mostrou-se adequado para o uso diário", disse Joachim Buse, responsável da empresa pelo projeto. Mesmo assim, a Lufthansa vai voltar a abastecer suas aeronaves com querosene fóssil, simplesmente porque não existe bioquerosene suficiente no mercado.
Para produzir biocombustível, precisa-se de biomassa, que no caso da Lufthansa são óleos vegetais, e também de gordura animal. No entanto, faltam usinas para produzir bioquerosene, diz Arne Roth, da empresa Bauhaus Luftfahrt, referência na indústria da aviação com sede em Munique. "Elas são diferentes das unidades para produzir biodiesel", explica Roth.
Somente quando houver refinarias suficientes em operação, "em um futuro próximo", o bioquerosene poderá ser introduzido na aviação "em determinada quantidade". Quanto exatamente, vai depender também do preço. "É preciso naturalmente cobrir os custos", diz o pesquisador.
Alimentos ou combustível?
Organizações ambientalistas, no entanto, criticam a utilização de bioquerosene na aviação. "As terras cultiváveis em todo o mundo são escassas", diz Gesche Jürgens, do Greenpeace. Segundo ele, o mundo precisa escolher se vai cultivar alimentos ou combustíveis. "Se nos decidirmos pelos alimentos, precisaremos de novas terras para os combustíveis. E para isso normalmente florestas são derrubadas ou terras são cultivadas às custas da natureza", diz Jürgens.
Para evitar os danos ao meio ambiente, a Lufthansa pretende utilizar apenas biocombustíveis cuja sustentabilidade seja garantida. "Nós só começaremos a utilizar bioquerosene se pudermos assegurar o abastecimento de matérias primas certificadas na quantidade exigida", assegura Joachim Buse.
Contudo, nem todos os certificados são confiáveis, diz o especialista do Greenpeace. "É preciso olhar com cuidado e perguntar: esses sistemas de certificação têm realmente serventia ou são apenas uma farsa? E este geralmente é o caso das certificações atuais, infelizmente."
"Combustíveis comuns são melhores para o meio ambiente"
Ainda mais fundamentada é a critica de Jürgen Schmid, diretor do Instituto Fraunhofer para Engenharia de Energia, em Kassel. Ele considera "ilusão" o argumento de que os biocombustíveis poupam o meio ambiente.
A biomassa pode servir para o aquecimento de edifícios, mas não como combustível para veículos e aeronaves, diz. "Quando se fabricam combustíveis a partir de biomassa, no fim do processo se tem apenas 50% da energia contida na biomassa original. O resto se perde no dispendioso processo de refinamento."
A Lufthansa enfatiza que o bioquerosene poupa cerca de 50% de CO2 em comparação aos combustíveis fósseis. No entanto, são necessárias quantidades imensas de biomassa para encher um tanque de avião com querosene.
Considerando a escassez mundial de terras cultiváveis, observa Schmid, os biocombustíveis mais prejudicam do que ajudam o meio ambiente. "Uma pessoa colabora mais com a natureza ao consumir combustíveis tradicionais." Muito mais promissores, segundo ele, seriam novos processos para converter a energia eólica em gás combustível.
Seja como for, a Lufthansa parece não querer apressar as coisas. Os próximos dois anos serão dedicados apenas à avaliação dos resultados obtidos com o bioquerosene nos últimos meses.
Autores: Andreas Becker / Insa Wrede (ff)
Revisão: Roselaine Wandscheer