Eric Pfanner
Num prédio onde trabalharam os projetistas do caça Zero, no período pré Segunda Guerra Mundial, engenheiros estão hoje desenvolvendo um novo projeto: o primeiro avião comercial japonês em meio século.
A Mitsubishi Aircraft Corp. deve exibir a nova aeronave pela primeira vez no sábado, após uma série de atrasos. A empresa convidou ministros e parceiros comerciais para o lançamento, em Nagoya, do Mitsubishi Regional Jet, num sinal do status quase nacional do projeto no Japão.
“Muita gente tem perguntado: ‘Quando seu avião vai ficar pronto?’”, disse o presidente da empresa, Teruaki Kawai, numa entrevista ao The Wall Street Journal ontem. “Agora o avião já está quase pronto para voar.”
O primeiro teste de voo do avião, que será oferecido inicialmente em versões com 76 ou 88 assentos, está previsto para o segundo trimestre de 2015, com as entregas começando em 2017. Mas o projeto, que gerou modestas 375 encomendas e opções de compra, enfrenta uma concorrência internacional crescente antes mesmo de ser concluído.
Kawai diz que a empresa, que é controlada pela Mitsubishi Heavy Industries Ltd. , pretende, nos próximos 20 anos, obter uma participação de 50% do mercado global de jatos regionais — que são usados para voos de curta distância e transportam normalmente de 70 a 100 passageiros. A empresa prevê que vai vender mais de 5 mil desses aviões no mundo todo durante o período.
Rob Morris, que dirige a consultoria Ascend Flightglobal Consultancy, em Londres, estima que, apesar do início lento, a Mitsubishi vai responder por 22%, ou US$ 28 bilhões, dos quase 4.000 jatos regionais que devem ser vendidos no mundo até 2033. Isso colocaria a Mitsubishi em segundo lugar no mercado, atrás apenas da Embraer SA, com 61%, segundo as previsões da Ascend.
O setor de aviões regionais há muito é dominado pela Embraer e pela canadense Bombardier Inc., a exemplo do duopólio no mercado de aviões maiores, dividido pela Boeing Co. e pelo Airbus Group NV. A Bombardier vem perdendo terreno no segmento regional ao investir no desenvolvimento de um novo avião de maior porte para concorrer com o Boeing 737 e o Airbus A319.
O jato da Mitsubishi não é o único estreante no setor. A russa Sukhoi Co. fabrica um avião regional e a Commercial Aircraft Corp., da China, está desenvolvendo um. Mas o Super Jet 100, da Sukhoi, sofreu um revés quando um voo de demonstração caiu na Indonésia, há dois anos, enquanto o ARJ21 chinês ainda tem que ser certificado pelas autoridades aeronáuticas da China, apesar de ter realizado um voo inaugural em 2008.
A Mitsubishi está promovendo seu avião como menos poluente e mais silencioso e confortável que os jatos regionais existentes, graças em parte aos novos motores da Pratt & Whitney, unidade da United Technologies Corp. , que são 20% mais econômicos que aviões similares, segundo a Mitsubishi. A fabricante afirma ainda que seu design, que coloca o compartimento de bagagem na traseira da fuselagem, em vez de embaixo dos assentos, permitirá maior espaço interno que outros aviões regionais, que obrigam os passageiros mais altos a abaixar a cabeça.
Morris diz que o espaço extra e a eficiência de combustível, combinado com o novo design do avião, dará competitividade à Mitsubishi. “Existe uma oportunidade real de mercado aqui.”
A Embraer e a Bombardier estão contando com a modernização de seus aviões regionais existentes, que também, segundo elas, reduzirão o consumo de combustível e os custos operacionais. A Embraer planeja usar os mesmos motores da Pratt & Whitney em novas versões de sua linha de jatos E-Jet.
“Nesse segmento, tudo é uma questão de economia — junto, claro, com confiabilidade e serviço”, diz Andy Solem, diretor de vendas para China e Ásia-Oceania da divisão de aviões comerciais da Bombardier. A Embraer afirmou, num comunicado, que sua longa experiência com aviões regionais dará a ela uma vantagem sobre o novato japonês. A brasileira citou ainda sua “força no suporte ao cliente”.
Os aviões da Mitsubishi custam entre US$ 40 milhões e US$ 50 milhões, comparáveis aos concorrentes, dizem analistas. Entre os clientes que fizeram um compromisso firme com a Mitsubishi estão a japonesa All Nippon Airways e a americana SkyWest, assim como a Air Mandalay Ltd., de Mianmar. A recuperada Eastern Air Lines Group Inc., dos EUA, também fez pedidos e, em agosto, a Japan Airlines Co. (JAL) assinou uma carta de intenções para comprar até 32 jatos.
“Esperamos apoiar o nascimento de um avião de passageiros japonês que consiga se impor no mundo”, diz Jian Yang, porta-voz da JAL.
No mesmo dia de agosto, contudo, a JAL também informou que encomendaria mais aviões regionais da Embraer. A Embraer afirma que já possui 590 pedidos para a próxima geração de seus aviões regionais, ainda que eles só devam entrar em operação em 2018 ou depois.
A demora nos pedidos “é normal”, diz Kawai, “porque nosso avião ainda nem voou”.
O último avião comercial japonês foi o YS-11, movido a hélice, que voou pela primeira vez em 1962. A Honda Motor Co. está desenvolvendo um jato executivo de quatro a seis passageiros para ser vendido em 2015.
A Mitsubishi Aircraft investiu quase US$ 1,8 bilhão para desenvolver o novo avião. Os acionistas incluem a Toyota Motor Corp. e o Banco de Desenvolvimento do Japão. O governo ajudou nas pesquisas e testes, mas não financeiramente, diz Kawai.
“Acreditamos que o sucesso da empreitada tem um grande significado para a industrialização japonesa”, afirmou a Toyota num comunicado.
Kawai concorda. “Por muito tempo, o Japão vem tendo sucesso em setores como o de automóveis”, diz. “Isso deve durar, mas precisamos encontrar novos setores. A produção de aviões pode ser um deles.”