Julie Johnsson
John Rothery se despediu, entregou o crachá e foi embora da Boeing. Ele trabalhou em quase todos os modelos de avião comercial durante quatro décadas, de um 707 equipado com radar militar no final da década de 1970 até o elegante 787 Dreamliner atual.
A data, 3 de outubro, estava marcada no calendário de Rothery há mais de um ano. Era a última vez em que a Boeing aumentaria as pensões para os operários da área de Seattle (EUA) antes de congelar o plano no fim do mês, condição ditada por uma prorrogação de contrato muito impopular realizada em 2014. Para Rothery, foi a gota d'água.
"Vou fazer 64 anos em novembro. Depois de 37 anos, isso é suficiente", disse Rothery, fabricante de ferramentas e moldes. "Eu trabalhava só para acumular uma pensão. A partir de 31 de outubro, não tem mais pensão. Para que ficar?"
A mudança nos benefícios pode acelerar uma mudança de geração à medida que os baby boomers da Boeing se aposentarem, tendência também iminente para outros fabricantes americanos. Os trabalhadores mais experientes da fabricante de aviões estão guardando as ferramentas durante atualizações fundamentais das duas maiores fontes de lucro da empresa: os aviões 737 e 777. Cerca de 10 mil mecânicos estão aptos a se aposentar só na base de fabricação da empresa em Puget Sound, e ninguém sabe quantos irão embora.
Escassez de trabalhadores
Enquanto Donald Trump e Hillary Clinton discutem sobre o impacto do comércio internacional nos empregos fabris, os fabricantes americanos estão lutando contra uma escassez iminente de trabalhadores especializados. Cerca de 3,5 milhões de vagas em fabricação terão que ser preenchidas nos próximos dez anos à medida que os baby boomers se aposentarem, e 2 milhões delas poderiam continuar abertas porque a geração Y está cada vez menos interessada no setor fabril, segundo um estudo realizado em 2015 pela Deloitte e pelo Manufacturing Institute.
O dilema pode ser especialmente grave para a Boeing, onde cerca de 35 por cento dos 29.645 operários de máquinas no centro industrial da companhia em Seattle têm 55 anos ou mais. Em contraste, apenas 23 por cento dos 15,3 milhões de americanos empregados na indústria pertencem a essa faixa etária, segundo o Escritório de Estatísticas de Trabalho dos EUA.
Para o futuro, a empresa está investindo em capacitação — de orientação vocacional a programas no ensino médio — a fim de fazer com que a fabricação se torne "legal" para uma geração que nunca foi a uma aula em uma oficina, disse Joelle Denney, vice-presidente de recursos humanos da divisão de aviões comerciais da Boeing. No curto prazo, a companhia intensificará os programas de treinamento e orientação dentro de suas fábricas, disse ela.
Rothery, o fabricante de ferramentas e moldes recém-aposentado, está satisfeito por ter treinado seu sucessor para que o trabalho continue sem interrupções, mas receia que sua transição poderia ser uma exceção.
"Uma enorme quantidade de experiência está indo embora", disse Rothery. "Eles darão um jeito nisso. Eles cumprirão a tarefa mesmo assim. A que custo, é difícil dizer."