O avião, um Avro RJ85, caiu na noite do dia 28 de novembro, em uma região montanhosa de difícil acesso quando se preparava para pousar no aeroporto José María Córdova, em Medellín.
O Departamento de Aviação Civil da Colômbia afirmour que a aeronave não tinha combustível no momento do impacto.
Já as autoridades da Bolívia suspenderam a licença de voo da Lamia e afastaram do cargo os chefes da Direção Geral de Aeronáutica Civil (DGAC) e da Administração de Aeroportos e Serviços Auxiliares de Navegação Aérea (Aasana), como parte de uma investigação.
Nesta quarta-feira, representantes da Bolívia, Colômbia e Brasil – países envolvidos no acidente – vão se reunir na cidade boliviana de Santa Cruz de la Sierra, de onde decolou o avião, para analisar os mecanismos, procedimentos e controles aplicados em seus territórios e estabelecer o que cada autoridade de aviação civil vai investigar.
As investigações precisam responder a quatro perguntas sobre a tragédia do voo da Lamia.
1. Por que o avião decolou se haviam sido encontrados erros no plano de voo?
Para responder a essa pergunta, a Administração de Aeroportos e Serviços Auxiliares de Navegação Aérea (Aasana) da Bolívia apresentou notícia-crime contra a funciona Celia Castedo, que revisou e autorizou o plano de voo da Lamia.
A decisão das autoridades foi tomada depois que a imprensa boliviana divulgou, quatro dias após a tragédia, que Castedo tinha constatado erros na documentação apresentada pela companhia aérea para o voo.
As autoridades da Aasana querem que a funcionária seja investigada por não cumprimento de deveres e atentado à segurança dos transportes.
O caso ainda não foi analisado pela justiça boliviana, de acordo com o juiz do Distrito de Santa Cruz, Gomer Padila.
Mas se o processo for aberto, Celia Castedo pode receber uma pena de um a quatro anos de prisão.
Acompanhada de um advogado, ela esteve nesta segunda-feira à noite em Corumbá, no Mato Grosso do Sul, para pedir asilo ao Brasil, de acordo com o delegado da Polícia Federal Sérgio Macedo.
O relatório que Castedo fez tem cinco observações sobre o plano de voo da Lamia, entre elas a de que o cálculo de autonomia de voo não estava correto e que faltava um plano alternativo de pouso caso houvesse uma emergência.
Castedo – funcionária com mais de 20 anos de experiência em navegação aérea – observou que o avião tinha combustível para voar durante 4 horas e 22 minutos, duração exata da rota prevista. Mas não tinha combustível necessário para voar por mais 30 minutos em caso de emergência, assim como não tinha os cinco por cento a mais exigidos pela legislação boliviana por se tratar de um voo internacional.
Além disso, Castedo engavetou o relatório da conversa que teve com o despachante da Lamia, Álex Quispe, que entregou o plano de voo e acabou morrendo no acidente.
Segundo a imprensa boliviana Quispe teria diro a Castedo que ecebera as informações do comandante do voo, Miguel Quiroga e que fariam o percurso no tempo previsto. A funcionária da Aasana teria incluído em seu relatório a resposta de Quispe a suas observações: "Não, senhora Celia, essa autonomia me foi passada. É suficiente para nós. Fazemos em menos tempo. Não se preocupe. É isso mesmo. Fique tranquila. Está tudo bem. Deixa comigo".
Agora resta saber por que, apesar das suas objeções e da resposta do despachante, Castedo deixou o voo CP-2933 decolar.
2. Por que foi dada autorização para a Lamia – que tinha apenas um avião operando – funcionar na Bolívia?
A pequena companhia Lamia (Linha Aérea Mérida Internacional de Aviación) está no centro das atenções.
O ministro das Obras Públicas da Bolívia – pasta responsável pelo transporte aéreo -, Milton Claros, informou no domingo que o governo apresentou queixa contra a empresa.
Em entrevista à rádio boliviana Pátria Nueva, o ministro disse que encontrou "indícios de possível violação de deveres, desrespeito ao controle interno, tráfico de influência e omissão de denúncia".
As suspeitas de tráfico de influência se baseiam no fato de que havia relação de parentesco entre um ex-diretor da Direção Geral de Aeronáutica Civil (DGAC) e o diretor-geral da Lamia, Gustavo Vargas Villegas, e Gustavo Vargas Gamboa – pai e filho, respectivamente.
Vargas Villegas, que foi afastado do cargo, era responsável pelas licenças de voo das empresas.
"Chama atenção a relação entre servidores e empresa", disse o ministro.
Antes de começar a operar na Bolívia, há dois anos, a Lamia funcionava apenas no estado de Mérida, no noroeste da Venezuela.
O próprio governador de Mérida, Marcos Díaz Orellana, fez o anúncio do negócio, em agosto de 2010, como uma iniciativa que injetaria US$ 170 milhões (R$ 582 milhões) na economia local, geraria 717 empregos e, por meio de um convênio com o governo chinês, resultaria na compra de 12 aviões modernos.
Mas o deputado federal Joaquín Aguilar disse à imprensa que a Lamia operava de "maneira informal" na Venezuela e "não estava registrada" no Instituto Nacional de Aeronáutica Civil do país.
3. Qual a influência do fato de o piloto também ser dono da empresa?
O boliviano Miguel Alejandro Quiroga Murakami era o piloto do voo CP-2933.
E também era um dos donos da Lamia, juntamente com o sócio Marco Rocha Venegas.
Essa dupla função teria sido decisiva no acidente.
Ao perceber que o avião não tinha combustível, quando se aproximava do aeroporto de Medellín, Quiroga optou por não declarar logo que enfrentava uma emergência e pediu apenas prioridade de pouso. Uma das teorias é de que ele temia levar pesada multa ou até sofrer a cassação de sua licença de voo.
"É muito doloroso que ele não tenha declarado a emergência por causa dos problemas pessoais que iria enfrentar depois", disse Alfredo Bocanegra, diretor de Aeronáutcia Civil da Colômbia.
De acordo com essa tese, o CP-2933 já estava com o combustível abaixo do mínimo permitido sobrevoou a região central da Colômbia, e por isso teria que pagar uma multa se tivesse feito uma parada de abastecimento em, por exemplo, Bogotá.
4. A Conmebol recomendou o voo da Lamia à Chapecoense?
Segundo Marco Rocha Venegas, sócio da companhia com o piloto Miguel Quiroga, a Lamia havia se especializado há alguns meses em voos fretados para equipes esportivas.
Mas, na busca por responsáveis pela tragédia, surgiu o nome da Confederação Sul-americana de Futebol, a Conmebol.
Tudo por causa de declarações do piloto argentino Jorge Polanco:
"A Conmebol era conivente com a Lamia. Eles cobravam mais barato dos times. Era um negócio. A Conmebol recomenda, faz uma sugestão aos clubes".
Na quinta-feira passada, dois dias depois do acidente, a Chapecoense negou qualquer tipo de pressão da Conmebol na contratação da empresa boliviana e afirmou que critérios técnicos tinham determinado a escolha.
"Que fique claro, a contratação seguiu critérios técnicos, porque a Lamia reunia todos os requisitos que a Chapecoense buscava nas suas viagens internacionais", disse o diretor de comunicação do clube.
Copetti comentou que um dos critérios foi a "qualidade da aeronave", que já havia sido usada "pela família real britânica".
"É um avião com todas as condições de fazer viagens de média distância, com todas as condições de segurança necesária", acrescentou.
A reação da Conmebol foi rápida.
"Entre as atividades de organização logística que a Confederação gere para realizar os torneios não está incluída a coordenação de nenhum tipo de transporte, assim como a recomendação de fornecedores de nenhum tipo", afirmou a entidade esportiva em comunicado também confirmado pela Lamia.
"A Conmebol não tem nada a ver com os voos dos clubes", disse o assessor de imprensa da Lamia, Miguel Ortiz.
O avião que caiu na Colômbia transportou a Seleção da Argentina para o jogo com a seleção brasileira, no início de novembro, em Belo Horizonte, bem como na volta para Buenos Aires.
Além disso, a Lamia também firmara um acordo com o Atlético Nacional, a equipe colombiana que enfrentaria a Chapecoense nos dois jogos da final da Copa Sul-americana.
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