Abraham Zamorano
Enquanto Hugo Chávez se prepara para voltar à sala de cirurgia por causa do câncer contra o qual luta há um ano e meio, a indicação do vice-presidente Nicolás Maduro como seu sucessor abriu um novo desafio para os aliados do presidente venezuelano: Como garantir a coesão de um "chavismo sem Chávez"?
Nos últimos meses, apesar de ter se submetido a diversos tratamentos, incluindo quatro cirurgias, sessões de quimioterapia e radioterapia, Chávez ainda não havia falado abertamente sobre a possibilidade de a revolução bolivariana ter de seguir adiante sem ele.
Maduro, escolhido pelo próprio presidente para tomar a liderança da revolução em sua ausência, é moderado e pragmático, distante da linha dura do partido chavista – o Partido Socialista Unido da Venezuela (PSUV).
Na batalha pela sucessão de Chávez, seu grande rival era o ex-militar Diosdado Cabello, presidente da Assembleia Nacional e número dois no partido.
Aparentemente, todo o PSUV, incluindo Cabello, parece ter fechado um consenso em torno de Maduro, o que reduz bastante a possibilidade de uma crise política no partido de Chávez no curto prazo.
Mas as diferenças existentes entre os aliados do presidente venezuelano fazem com que seja impossível garantir que não haverá instabilidade no chavismo no médio prazo.
Unidade
Durante o discurso em que apontou Maduro como seu sucessor, neste sábado (dia 8), Chávez fez um apelo ao patriotismo dos venezuelanos, e, acima de tudo, conclamou seus aliados a se manterem unidos nos momentos difíceis que estão por vir.
O presidente, que tinha passado 11 dias em Cuba, retornou à Venezuela para anunciar que precisava fazer uma nova cirurgia em Havana.
Chávez não disse diretamente que o prognóstico dos médicos é que ele será incapaz de superar a doença, mas afirmou esperar um "milagre" e pela primeira vez falou abertamente sobre sua sucessão.
"Ele não veio a Caracas para anunciar que ainda está doente – isso poderia fazer de Havana, como da última vez – veio para apoiar seu substituto: não só entre a população, mas em meio ao chavismo", disse à BBC Luis Vicente León, cientista político e presidente do instituto de pesquisas Datanálisis.
"(Chávez está tentando) exorcizar os demônios internos do chavismo", completa León. "Ele veio dizer: 'Estou nomeando meu sucessor, que será esse (Maduro) – se alguém o desafiar, a oposição pode vencer e para nós será pior'."
A historiadora Margarita Lopez Maya também não vê o risco de uma crise política iminente no chavismo.
"Durante as primeiras semanas e meses (em uma transição política), haveria solidariedade com o presidente e seu estado de fraqueza e vulnerabilidade. Isso uniria as bases (chavistas) nesse momento", diz Maya.
"Além disso, como a Constituição estabelece a convocação de novas eleições presidenciais no caso de ausência absoluta (do presidente eleito), isso favoreceria a união do chavismo no curto prazo."
Segundo a historiadora porém, no médio prazo poderia haver turbulências no movimento, porque Chávez sempre foi um líder muito personalista e o chavismo, formado por grupos heterogêneos.
Facções
Para Maya, algumas tensões poderiam crescer em função da diferença existente entre alguns dos homens fortes do chavismo. "Maduro é um homem de esquerda, que vem da Liga Socialista, um civil. E tem apoio dos cubanos – perfil que pode gerar ressentimento no Exército", diz ela.
Segundo a historiadora, o vice-presidente tem uma boa imagem internacional e a simpatia de Havana, mas tem pouco apoio interno. Já Cabello controla o partido e a Assembleia Nacional, tem o apoio dos militares e a confiança de Chávez, mas nunca foi a Cuba.
Nenhum deles, porém, parece ter a capacidade de Chávez de controlar o partido e as bases chavistas.
Segundo especialistas, essa expectativa de uma possível saída de Chávez da cena política venezuelana poderia impulsionar o chavismo nas eleições regionais de 16 de dezembro, mas também poderia ajudar a oposição.
Como explica Maya, sem Chávez, a oposição pode ter uma "janela de oportunidade política" para animar seus simpatizantes a votar. Mas o chavismo também pode ganhar com a solidariedade ao presidente.
León concorda que, no curto prazo, os dois lados aumentam suas chances de mobilizar seus eleitores, mas ele diz que, no médio e longo prazo, "quem realmente perde é o governo."
"Quem está perdendo seu líder é o chavismo. Quem teria de ser submetido a uma nova eleição presidencial, depois de ter ganhado a última votação, é o chavismo. E quem tem de resolver suas divisões internas é chavismo", afirma o analista.