Evandro Éboli
BRASÍLIA . Sob duro ataque de senadores de oposição e de alguns da base do governo, o ministro das Relações Exteriores, Antonio Patriota, defendeu ontem a posição do governo brasileiro sobre a suspensão temporária do Paraguai do Mercosul e a entrada da Venezuela no bloco. Os parlamentares questionaram o fato de o chanceler fazer críticas a Assunção e defender o governo de Hugo Chávez, apontado pela oposição como um presidente que cerceia liberdades.
Em audiência pública na Comissão de Relações Exteriores do Senado, que é presidida pelo senador Fernando Collor (PTB-AL), Patriota disse que "nenhuma democracia é perfeita", mas que o ocorrido no Paraguai jamais aconteceu na Venezuela.
– Democracias são aprimoráveis. Nunca foi necessário retirar embaixador da Venezuela, como 11 países da América do Sul fizeram com o Paraguai. Tem governos mais à direita, mais à esquerda, ao centro, mas são regimes que valorizam a democracia, a inclusão social e a distribuição de renda. Jamais ocorreu com a Venezuela o que ocorreu com o Paraguai. Observadores internacionais acompanharam eleições na Venezuela e a consideraram democrática – afirmou.
Militares paraguaios negam ingerência venezuelana
Patriota rebateu também as críticas de que os países do Mercosul estariam aproveitando a ausência temporária do Paraguai no bloco para aprovar o ingresso da Venezuela. O Paraguai tem restrições à entrada da Venezuela, e seus congressistas eram os únicos do bloco que ainda não haviam aprovado a adesão do país.
Para o ministro brasileiro, não se pode relacionar uma coisa à outra já que, em sua palavras, há anos já se discute o tema no continente:
– A presença da Venezuela é discutida há muito tempo, desde meados da década passada. Em Montevidéu (Uruguai), em 2011, foi discutida essa demora excessiva. Patriota voltou a expor os argumentos de que o ex-presidente paraguaio Fernando Lugo não teve direito à ampla defesa e de que a decisão dos congressistas de afastá-lo significou uma violação da democracia.
– Houve uma ruptura da ordem democrática. O Paraguai vivia momento de crescimento econômico, de combate à corrupção e de melhoria de vida da população. O procedimento não assegurou o amplo direito de defesa (de Lugo). E o que houve foi uma reação dos países da região e uma mobilização pela gravidade do problema – disse Patriota. – Foi um sinal inequívoco de que não há espaço para aventura antidemocrática.
O senador Francisco Dornelles (PP-RJ) foi duro nas críticas a Patriota e disse que o governo rasgou sua Constituição ao apoiar sanções ao Paraguai. Ele defendeu a decisão dos paraguaios de afastar Lugo e disse que o chanceler brasileiro pode entrar para a História como o ministro que acabou com o Mercosul.
– Foi um dos mais tristes episódios da diplomacia brasileira. Saiu a diplomacia de Estado e entrou a de governo – disse Dornelles.
Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP) disse que Patriota fazia pouco da inteligência dos senadores com os argumentos de sua defesa do Paraguai. E o líder do PSDB, Álvaro Dias (PR), também criticou.
– Precisamos respeitar a autodeterminação dos povos. Agora, mais rápida que a decisão do Paraguai em afastar seu presidente foi a do ingresso da Venezuela no Mercosul – disse Dias.
Alguns senadores defenderam a decisão do governo brasileiro, como Eduardo Suplicy (PT-SP), Cristovam Buarque (PDT-DF) e Roberto Requião (PMDB-PR).
– Fiquei extremamente orgulhoso da posição brasileira. Agimos muito bem, com a suspensão do Paraguai, mas sem sanções ao povo paraguaio. O Paraguai voltará ao Mercosul, quando estiver restaurada sua democracia – disse Requião.
O impeachment de Lugo desatou uma crise regional. O governo Federico Franco reduziu ao mínimo as relações com a Venezuela após acusar emissários de Chávez de tentar interferir junto a militares para evitar o impeachment. Ontem, no entanto, o Ministério Público paraguaio, após ouvir o alto comando das Forças Armadas, considerou que não houve ingerência.
Os militares confirmaram terem se reunido com o chanceler venezuelano, Nicolás Maduro, e outros diplomatas na sede do governo em Assunção no dia do impeachment, mas negaram terem ouvido qualquer proposta para interferir na crise. O ministro, explicaram, apenas alertou que a destituição de Lugo desencadearia sanções dos países vizinhos.
"Eles ficaram bastante surpresos com a visita, que durou entre cinco e dez minutos, pois a presença (de Maduro) não foi anunciada", disse em nota o Ministério Público.
Ontem, a Suprema Corte paraguaia aceitou julgar o segundo recurso de Lugo contra o impeachment. Nele, o ex-presidente denuncia a inconstitucionalidade do processo. Os juízes terão 18 dias para se pronunciar.