Em entrevista exclusiva ao Terra, a deputada cassada Maria Corina Machado, principal voz da oposição na Venezuela, neste momento, fez um apelo para que a comunidade internacional pressione o regime do presidente Nicolás Maduro para o fim da repressão violenta aos manifestantes.
Até agora, pelo menos 41 pessoas morreram nas manifestações.
Corina Machado voltou a criticar a política externa dos vizinhos sul-americanos, como o Brasil. Perguntada especificamente sobre o papel da presidente Dilma Rousseff na atual crise, a opositora afirmou: “A indiferença se transformou em cumplicidade”.
A opositora discursou na comissão de assuntos exteriores do Parlamento Europeu, em Estrasburgo (França). A entrevista foi concedida quando ela chegava ao Parlamento, acompanhada da deputada ítalo-brasileira Renata Bueno.
A seguir os principais trechos da entrevista:
Terra – Seu mandato foi cassado após a senhora discursar na OEA (Organização dos Estados Americanos) denunciando a situação dos direitos humanos na Venezuela. A senhora ainda se sente deputada?
Corina Machado – A Constituição venezuelana é muito clara. Um deputado só perde o mandato se morrer, renunciar, for condenado em sentença ou passar a exercer outro cargo. Nenhuma dessas circunstâncias se deu, no meu caso. [O presidente da Assembleia Nacional, Diosdado] Cabello decidiu ignorar os votos que me elegeram, como fazem as ditaduras que excluem deputados que consideram incômodos.
Terra – O que vai dizer ao Parlamento Europeu?
Corina – A verdade. O que está sentindo o povo venezuelano hoje, que está vivendo sob um regime profundamente repressivo. O movimento social surgiu com os estudantes e foi apoiado por trabalhadores, jornalistas, donas de casas porque a qualidade de vida é cada vez pior.
A economia é um horror. Temos escassez [de gêneros de consumo e uma inflação de mais de 60%. A violência provoca um assassinato a cada 20 minutos e a impunidade é absoluta. Temos o governo mais corrupto da história da Venezuela no momento em que nosso país vive seu melhor momento nos preços do petróleo. Temos presos, torturados, feridos e mortos pela repressão aos protestos. Isso se tornou uma política de Estado, executada tanto pelas forças de segurança quanto por grupos paramilitares. Diante dessa violação de direitos humanos, o mundo não pode ficar indiferente.
Terra – O que a senhora espera dos europeus?
Corina – O Parlamento Europeu se comprometeu a enviar uma comissão ad hoc para avaliar a situação da Venezuela. Isso é fundamental porque a Unasul acordou medidas que não foram cumpridas, como enviar uma comissão para avaliar a violência durante o processo eleitoral. Até hoje estamos esperando. As declarações dadas pelos chanceleres dos países da Unasul são inaceitáveis pois não são neutras nem objetivas. Queremos responsabilidade e solidariedade em matéria de direitos humanos e de defesa da democracia.
Terra – Quando a senhora esteve no Brasil, na semana passada, a senhora criticou a postura distante dos governos da região que se recusam a condenar o governo Maduro.
Corina – O que pedi aos governos democráticos da América Latina, em especial ao Brasil, é uma posição firme e coerente em defesa de direitos humanos. Na Venezuela e no mundo, sabem quem é o responsável pela violência, quem a promove e quem a executa com grupos paramilitares e agentes do Estado. Foi apenas isso que pedimos, muito particularmente à presidente Dilma por causa da sua condição e da sua história. Ela sofreu na própria carne o horror de uma ditadura que prende, tortura e mata estudantes.
Terra – A senhora está frustrada com o papel da presidente Dilma na crise?
Corina – Digamos que temos esperança de que ela mude essa posição. A violência é clara e o mundo não pode ignorar. O regime cruzou a linha vermelha nestas últimas oito semanas. A indiferença, hoje, é cumplicidade.
Terra – É possível que o diálogo triunfe sobre a violência no seu país?
Corina – Vamos fazer uma transição para a democracia pacificamente. Na Venezuela, não há uma guerra civil, mas, sim, uma guerra contra os civis. Temos um regime que quer dividir o povo, jogando o povo contra o povo. Nós vamos avançar rumo a um processo de transição. Não vamos deixar as ruas até que a democracia volte à Venezuela.