Lucien Chauvin
A cooperação militar na América do Sul pode aumentar significativamente no ano que vem se uma série de projetos funcionarem como planejado.
O Conselho de Defesa Sul-Americano (CDS), estabelecido em 2008 pela União de Nações Sul-Americanas (UNASUL), com sede em Quito, visa ampliar a coordenação entre os 12 países-membros da organização.
“O CDS é um modelo para outros conselhos da UNASUL”, garante José Huerta, um general peruano da reserva que chefiou a delegação do CDS de seu país até meados de 2012. “Nós tomamos decisões concretas que vão além das meras declarações verbais que tendem a ser proferidas em encontros regionais.”
Andrés Acosta, outro general da reserva do Peru, disse que teve dúvidas sobre o CDS quando foi convidado a participar como diretor-executivo da entidade.
“Eu estava cético, mas fiquei surpreso com a determinação dos países-membros de fazer esse trabalho. Meu ceticismo transformou-se em otimismo”, declarou após um encontro com ministros da Defesa durante a reunião de cúpula anual da UNASUL, ocorrida em 29 e 30 de novembro em Lima. Um dos principais objetivos do conselho para 2013, afirmou, é criar uma fórmula padronizada para avaliar os gastos com defesa. Os países-membros da UNASUL concordaram em informar suas despesas militares mas, até agora, cada um tem seguido sua própria metodologia, com diferentes graus de transparência.
“Uma coisa é um relatório sobre quanto estamos gastando, outra é fornecer detalhes sobre quais são exatamente esses gastos”, disse Acosta. “É nessa direção que estamos seguindo.”
Esse projeto será complementado com o lançamento de um novo Registro de Inventários Militares Sul-Americanos marcado para o início de 2013, com o sistema entrando em operação em 2014, informou.
CEED: Promoção da transparência da ‘informação’
Um componente fundamental para a transparência das despesas e inventários militares é o Centro de Estudos Estratégicos em Defesa (CEED), criado pelo CDS, sediado na Argentina e composto por representantes das forças armadas dos 12 países-membros da UNASUL.
Os presidentes que compareceram à reunião de cúpula aprovaram o estatuto operacional do CEED. Huerta informou que o centro, que estará completamente operacional em janeiro, não tem a função de “estabelecer uma doutrina militar para a região, mas de promover a transparência de informação e analisar ameaças e problemas envolvendo o setor de defesa que afetam os países-membros”.
Entretanto, nem todos os países concordam em patrocinar o CEED. A Argentina forneceu o centro de operações e cada país paga o salário de seus representantes, mas Acosta disse que os membros devem desenvolver um sistema de pagamento.
No momento, o plano estabelece que cada país proveja o CEED com uma quantia similar à que contribuiu para o Haiti após o terremoto de 2010. A UNASUL doou US$ 100 milhões (R$ 208 milhões) para as ações de ajuda e mediou um empréstimo de US$ 200 milhões (R$ 416 milhões) do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) em favor do país caribenho.
Protocolo visa reduzir burocracia no caso de desastres naturais
Enquanto isso, o Peru está preparando o protocolo para a unificação da resposta humanitária do CDS em caso de futuros desastres naturais. Uma questão controversa envolve a necessidade dos militares garantirem permissão para entrar no espaço aéreo de outro país; o protocolo iria eliminar esse problema. Autoridades da UNASUL dizem que o protocolo inspira-se vagamente em um acordo entre o Peru e o Equador para remover minas terrestres ao longo de sua fronteira comum. Com o protocolo ora em vigor, militares peruanos podem entrar no espaço aéreo equatoriano sem necessidade de autorização prévia caso a equipe de desativação de minas venha a ter uma emergência.
A UNASUL está prestes a criar um décimo conselho, direcionado para segurança pública, justiça e luta contra crimes transnacionais, assim como um Colégio Sul-Americano de Defesa. Essa ideia foi proposta pelo ministro da Defesa do Brasil, Celso Amorim, enquanto o país chefia um grupo de trabalho dentro do CDS – um dos 12 que pertencem ao conselho.
No encontro em Lima, Amorim disse que o colégio não seria físico, um campus erguido com tijolos e cimento, mas um sistema de cursos oferecidos por toda a região.
“Os brasileiros estão organizando um fórum perene para refletir as questões da defesa na América do Sul”, disse Acosta, embora ele e Huerta tenham descartado a noção de que o CDS poderia substituir a Junta Interamericana de Defesa, que reúne os países do hemisfério.
Acosta disse que grupos regionais como o CDS podem ajudar a “revitalizar a Junta, que está carecendo de uma direção clara nesse momento. Acredito que o CDS é um bom complemento para a Junta”.
Huerta acrescentou que o CDS não seria uma instituição como a OTAN, porque o conselho é voltado para seus próprios interesses – direcionado para questões relacionadas à América do Sul e sobre como as forças armadas de cada país devem lidar com elas individualmente ou em conjunto. Ele afirmou que consolidou um relacionamento “de primeira geração” de confiança mútua e deve, agora, seguir em direção à próxima etapa.
“Precisamos de um relacionamento de segunda geração, similar à coordenação entre as forças armadas da União Europeia, que identifica ameaças em comum e trabalha para lidar com elas ao mesmo tempo em que respeita a soberania dos Estados-membros”, ressaltou.