O primeiro-ministro britânico, David Cameron, que está deixando o cargo, marcou para 18 de julho uma votação no Parlamento para decidir sobre a renovação do potencial nuclear dissuasivo do Reino Unido, em uma medida surpresa aparentemente voltada a destacar o comprometimento de Londres com a segurança europeia durante uma cúpula da OTAN.
As divisões políticas sobre a substituição ou não de submarinos Trident, apoiada a princípio pelo Parlamento em 2007, têm despertado dúvidas sobre a afirmação do Reino Unido como potência militar, amplificadas recentemente pela escolha britânica de deixar a União Europeia.
Durante uma cúpula da OTAN, Cameron disse ser tempo de colocar “para além da dúvida” a decisão sobre a renovação da frota defasada de quatro submarinos carregados com armas nucleares.
“Hoje posso anunciar que vamos realizar uma votação parlamentar em 18 de julho para confirmar o apoio dos membros do Parlamento para a renovação de uma frota completa de submarinos capazes de proporcionar uma defesa contínua”, disse Cameron em uma entrevista coletiva.
Cameron, que entregará o cargo de primeiro-ministro em setembro, também defendeu sua decisão de não deixar para um novo líder britânico a convocação da votação, que deve aprovar a renovação da frota devido ao grande apoio do partido Conservador.
O Partido Trabalhista, de centro-esquerda, tem apoiado a renovação, mas seu novo líder, o parlamentar veterano de extrema-esquerda Jeremy Corbyn, um ativista antiguerra, se opõe aos planos. O Partido Nacionalista Escocês quer que os submarinos Trident, que ficam baseados na Escócia, sejam aposentados.
“União” ante a Rússia¹
Os 28 líderes da OTAN reafirmaram neste sábado a “unidade” ante a Rússia por causa da situação na Ucrânia, ao mesmo tempo que se declararam dispostos a um diálogo firme com Moscou, após o anúncio do maior reforço militar na Europa desde o fim da Guerra Fria.
“A mensagem principal é que a Aliança está unida, que nos mantemos unidos”, disse o secretário-geral da OTAN, Jens Stoltenberg, no segundo dia da reunião de cúpula em Varsóvia.
Stoltenberg afirmou que não vê uma ameaça iminente contra nenhum país da OTAN, mas destacou que a Rússia “não é um sócio estratégico”.
A Aliança não está mais “na associação estratégica com a Rússia que tentamos desenvolver depois da Guerra Fria”, completou.
Os líderes da Aliança decidiram na sexta-feira aprovar o plano da OTAN de reforçar o lado leste, uma ideia adotada após a intervenção russa na Ucrânia e a anexação da Crimeia em 2014.
Isto representa triplicar a força de reação rápida da Aliança para alcançar 40.000 homens e criar uma força expedicionária de 4.000 membros, com capacidade de deslocamento em um prazo muito curto para qualquer foco de crise.
Os 28 países, que realizaram a maior reforma da defesa coletiva na Europa desde o fim da Guerra Fria, também decidiram deslocar quatro batalhões para Polônia, Estônia, Lituânia e Letônia, com o objetivo de acalmar estes países, inquietos com as ações da Rússia.
Para Moscou, o deslocamento ameaça sua segurança no que já foi sua esfera de influência.
A Rússia foi o tema de discussão do jantar de sexta-feira dos 28 líderes. Stoltenberg afirmou que esta foi a oportunidade para que os governantes discutissem de maneira “verdadeiramente franca e aberta”.
Mas a “unidade” que a OTAN pretende demonstrar pareceu abalada na reunião. Na sexta-feira, o presidente francês, François Hollande, afirmou que a Rússia não era uma ameaça e que estava mais para sócia.
Firmeza e diálogo
Por sua intervenção na Ucrânia e anexação da Crimeia, as potências ocidentais adotaram sanções econômicas contra a Rússia. A UE as renovou recentemente, até o fim de janeiro.
Mas a medida tem um alto custo econômico para a França, assim como para a Itália e até mesmo para a Alemanha. A Assembleia Nacional francesa votou recentemente uma declaração para suspender as sanções.
Paris, que havia negociado dois navios militares à Rússia, se viu obrigada, pelo conflito na Ucrânia, a suspender a venda. Roma viu cancelado o projeto de gasoduto com a Rússia, ‘South Stream’. A Alemanha é um importante sócio comercial de Moscou.
A chanceler alemã, Angela Merkel, insistiu na necessidade de diálogo com “as regiões vizinhas”.
Neste sábado, Stoltenberg tentou reduzir a tensão com a Rússia ao afirmar que “não se está em uma situação de Guerra Fria”.
O primeiro-ministro britânico, David Cameron, que sempre adotou uma linha dura com Moscou pela crise na Ucrânia, afirmou que é necessário “avançar em um diálogo firme com a Rússia”.
“Não buscamos aumentar a tensão. Mantemos a transparência e desejamos dialogar com a Rússia. Mas a Rússia deve mudar seu comportamento”, afirmou à imprensa o general americano Curtis Scaparrotti, comandante supremo das forças aliadas na Europa.
O Kremlin reserva, no momento, as maiores advertências ao escudo antimísseis desenvolvido pelos Estados Unidos na Europa para proteger seu território e o de seus aliados de eventuais ataques com mísseis balísticos do Irã e da Coreia do Norte.
Ucrânia e Afeganistão
Os 28 líderes da OTAN também se reuniram com o presidente ucraniano, Petro Poroshenko.
Poroshenko e Stoltenberg concordaram que a Ucrânia fez progressos para se aproximar dos parâmetros europeus, mas que integrar a OTAN ainda não está na agenda.
A situação precária de segurança no Afeganistão, onde os talibãs desestabilizam o governo de Cabul, também foi abordada na reunião de cúpula da Varsóvia.
Os países decidiram manter as tropas neste país, onde as forças afegãs assumiram o controle da segurança em 2015. Também pretendem manter o financiamento das forças locais até 2020.
Defesa de Polônia e países bálticos contra a Rússia
Os líderes da OTAN concordaram nesta sexta-feira com o envio de forças militares para os países bálticos e para o leste da Polônia pela primeira vez e com o aumento das patrulhas aéreas e marítimas para tranquilizar aliados que já foram parte do bloco soviético, depois da tomada da Crimeia da Ucrânia pela Rússia.
A aliança ocidental de defesa que conta com 28 países decidiu mover quatro batalhões, totalizando de 3.000 a 4.000 homens, para o nordeste da Europa num sistema de rodízio para mostrar a sua prontidão para defender os membros do leste contra qualquer agressão russa.
Contudo, eles também destacaram a disposição de buscar um diálogo com Moscou e retomar as medidas para fortalecer as relações de confiança que a Rússia tem rejeitado desde a anexação da Crimeia em 2014 e o seu apoio para os rebeldes de língua russa no leste da Ucrânia.
"Esses batalhões vão ser robustos e serão multinacionais. Eles deixam claro que um ataque a um aliado será considerado um ataque a toda a aliança”, disse o secretário-geral da OTAN, Jens Stoltenberg, à imprensa, após a primeira sessão de trabalho da reunião de cúpula em Varsóvia, capital da Polônia.
O presidente norte-americano, Barack Obama, afirmou que os Estados Unidos vão enviar cerca de mil soldados para a Polônia, de acordo com o plano, “para reforçar a nossa presença avançada na Europa central e do leste”. A Alemanha vai liderar o batalhão na Lituânia. O Reino Unido, na Estônia, e o Canadá, na Letônia. Outros países como a França vão fornecer tropas.
Mais cedo, Obama declarou que a decisão do referendo britânico favorável a deixar a União Europeia, um resultado que ele buscou evitar, não deve enfraquecer a aliança ocidental, mas levantou “questões significativas” sobre o futuro da integração europeia. A “relação especial” dos EUA com o Reino Unido sobreviveria, segundo o presidente.
Sede do evento, a Polônia deu o tom de desconfiança em relação às intenções russas. O ministro do Exterior, Witold Waszczykowski, disse durante um fórum anterior à cúpula: “Nós rejeitamos qualquer tipo de ilusão sobre uma cooperação pragmática com a Rússia enquanto ela continuar a invadir os seus vizinhos”.
Obama foi mais diplomático, fazendo um chamado ao diálogo com a Rússia, mas insistiu que os aliados mantivessem as sanções contra Moscou em vigor até que fosse seguido plenamente o acordo de cessar-fogo na Ucrânia.
A Ucrânia não integra a OTAN, mas o presidente do país, Petro Poroshenko, vai se encontrar com os líderes aliados no sábado, quando ele talvez enfrente pressões para cumprir com a parte de Kiev no acordo, aceitando uma maior descentralização e eleições locais na região de Donbass, no leste, controlada pelos rebeldes.
A chanceler alemã, Angela Merkel, declarou que, enquanto a OTAN estava aumentando a sua capacidade de defesa, a organização estaria sempre interessada no diálogo com Moscou.
¹com Agência AFP