A política externa do presidente americano, Donald Trump, ameaça mexer com o balanço de poder global. Em entrevista à DW, o cientista político e historiador Siebo Janssen diz que o isolamento para onde se encaminha os EUA fará com que a União Europeia tenha que reagir.
"Os europeus se encontram agora num momento decisivo", afirma o professor do Instituto de História Anglo-Americana na Universidade de Colônia. "Trump vai mudar a posição da Alemanha no mundo, mas ninguém quer aceitar isso no momento."
DW: O presidente americano, Donald Trump, dá sinais de uma política externa isolacionista. Ele advertiu outros países da Otan de que prestem a sua contribuição à aliança militar. Esse retrocesso dá a outros Estados, como a Alemanha, a possibilidade de exercer um papel mais importante na comunidade internacional?
Siebo Janssen: A Alemanha, primeiro somente a Alemanha Ocidental e agora o país unificado, sempre foi protegida pelos EUA contra a ameaça soviética ou russa. Os EUA sempre salientaram que cuidariam dessa aliança com a Alemanha, por precisarem de Berlim como um fator de estabilidade na Europa e também na UE.
Com Trump, agora, temos algo que se pode caracterizar realmente como uma "posição isolacionista brutal". O novo presidente diz coisas como: "Eu não me interesso por aquilo que acontece no resto do mundo. Eu só me interesso pelo desmantelamento do chamado 'Estado Islâmico' e pelo que ocorre nos EUA."
Para a Alemanha, o desafio está agora no fato de o país assumir um papel completamente novo – ele vai se tornar mais independente, mas também assumir uma posição de liderança dentro da União Europeia e no mundo livre.
A Alemanha pode desempenhar um papel de maior liderança?
Nesse ponto, sou cético. Não estou certo se a Alemanha é capaz de lidar com essa nova posição de poder – nós nunca aprendemos isso e nunca quisemos, e mesmo assim estamos diante de dois grandes desafios políticos. O primeiro diz respeito à UE – a Alemanha é o principal ator dentro da União Europeia, já que a França está política e economicamente em declínio.
Os alemães desempenham também um papel cada vez mais importante dentro da comunidade internacional. Mas, por aqui, ninguém queria isso, tropeçou-se simplesmente nesse papel. Todo mundo sabe que Trump vai mudar a posição da Alemanha no mundo, mas ninguém quer aceitar isso no momento, para tal não há exemplos anteriores.
Como Berlim deveria então reagir?
Acredito que uma União Europeia sob a liderança alemã – e mais tarde talvez sob a francesa – terá que edificar uma política própria de defesa e externa. Essa base deverá ser montada sobre dois pilares: a diplomacia, onde a Alemanha já é bastante forte, e também será preciso reforçar o poder militar da União Europeia como um todo, não somente na Alemanha ou França.
Se a Europa começar a perseguir a sua própria política externa, isso não levaria a confrontos diplomáticos com os EUA?
Isso já se pode ver – na União Europeia, por exemplo, não há nenhum interesse na desestabilização do Leste e Sudeste Europeu, o que a Rússia tenta fazer agora. Se os EUA se isolarem cada vez mais, temo que a UE e a Alemanha tenham que cuidar mais fortemente de sua vizinhança. Não podendo mais pedir aos EUA que assumam essa responsabilidade, a Europa terá de fazê-la por contra própria, pois Trump já disse que não vai deixar que o conflito com a Rússia avance.
Se a Rússia tentar, por exemplo, ampliar a sua posição na Ucrânia, no Sudeste Europeu e na Geórgia, então será preciso reagir nos Estados bálticos. A UE terá que responder, se os EUA não quiserem mais fazê-lo.
Além da expansão militar e do incentivo à diplomacia, que outras reformas seriam necessárias como reação a Trump e à nova política americana?
A totalidade da UE precisa de um assento no Conselho de Segurança das Nações Unidas. Seria um sinal claro para o resto do mundo – para Rússia, EUA e China –, de que a União Europeia se une em prol de sua política externa e não por seus interesses nacionais. Mas o problema é que, pelo outro lado, vê-se este declínio do bloco europeu. Ele se torna cada vez mais fraco. São muitos os problemas externos e internos, basta olhar para a Polônia, Hungria, República Tcheca, Eslováquia e para o Brexit.
Os europeus se encontram agora num momento decisivo: podem ir mais em direção à UE, reforçando-a em termos de política externa e de segurança. Ou podem perder influência no mundo.