Os talibãs lançaram, nesta quarta-feira (7), sua primeira ofensiva contra uma capital provincial do Afeganistão, Qala-i-Naw, desde o início, em maio, de sua campanha contra as forças afegãs deflagrada com a retirada das tropas americanas do país.
Horas depois de o Exército americano anunciar que "mais de 90%" de sua retirada do Afeganistão estava completa, os talibãs entraram esta manhã em Qala-i-Naw, capital da província de Badghis (noroeste).
Desde maio, os talibãs já tomaram grandes áreas rurais do país e se aproximaram de várias cidades importantes.
"É preciso admitir que a guerra está sendo travada, e estamos em uma situação militar muito delicada", disse o ministro afegão da Defesa, Bismillah Mohammadi, em um comunicado divulgado pouco depois.
"Mas esta não é a primeira vez que o Afeganistão passa por momentos difíceis" e "quero tranquilizar todos, nossas forças nacionais (…) usarão todo seu poder e recursos para defender nossa pátria e nosso povo", acrescentou.
Com fuzil no ombro e o peito coberto com carregadores, o governador de Badghis, Hessamuddin Shams, garantiu, em um vídeo postado no Facebook, que "todas as forças de segurança (…) estão defendendo a cidade" e que "o inimigo sofreu baixas e foi derrotado", enquanto um tiroteio ecoava.
Na parte da tarde, em uma mensagem de áudio à AFP, ele afirmou que os talibãs estavam "se retirando" de Qala-i-Naw.
O chefe do conselho provincial de Badghis, Abdul Aziz Bek, disse à AFP que, "na noite passada, autoridades do serviço de segurança da província se renderam aos talibãs, que entraram na cidade na manhã de quarta-feira".
Membro do conselho provincial, Zia Gul Habibi, afirmou à AFP esta tarde que "a situação se estabilizou, já que a cidade não caiu" nas mãos dos talibãs.
"Mas os talibãs ainda estão dentro da cidade, e aviões e helicópteros estão atingindo as posições" dos insurgentes na cidade, acrescentou.
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Soldados do Exército afegão na base aérea de Bagram, após a retirada das tropas americanas e da OTAN, em Cabul, 2 jul. 2021 |
"Efeito psicológico"
"Todos ficaram apavorados pela manhã, quando souberam que os talibãs tinham entrado na cidade (…) Rapidamente ouvimos tiros e explosões", contou à AFP Aziz Tawakoli, morador de Qala-i-Naw.
"As explosões são audíveis à distância, helicópteros e aviões sobrevoam a cidade e, às vezes, atingem partes da cidade", acrescentou.
Enquanto isso, nesta quarta-feira, delegações do governo afegão e dos talibãs se reuniram em Teerã, segundo o Ministério das Relações Exteriores do Irã, após meses de negociações paralisadas no Catar.
"Hoje, o povo e os dirigentes do Afeganistão devem tomar difíceis decisões para o futuro do país", comentou o chefe da diplomacia iraniana, Mohammad Javad Zarif, na abertura das discussões, ao saudar a saída americana do território de seu vizinho.
O porta-voz do Talibã, Zabihullah Mujahid, confirmou que uma "delegação de alto nível" visitou o Irã "a convite oficial" de Teerã para se reunir com "personalidades afegãs" e discutir "a situação atual e encontrar soluções por meio de conversas".
Iniciada em maio, a retirada das tropas americanas tem-se dado de forma acelerada, apesar do avanço inexorável dos talibãs e do recuo das forças afegãs, agora privadas do apoio aéreo americano crucial.
Na semana passada, as forças dos Estados Unidos e da Otan deixaram a base aérea de Bagram, ao norte de Cabul, a maior instalação militar da coalizão no Afeganistão. Este foi o centro nevrálgico de suas operações desde a entrada das tropas americanas no país, após os ataques de 11 de setembro de 2001.
A retirada total dos militares americanos será concluída até o final de agosto, de acordo com a Casa Branca. Isso encerrará 20 anos de intervenção americana no país, a guerra mais longa já travada pelos Estados Unidos em sua história.
Em junho, os talibãs lançaram um rápido ataque a Kunduz, capital da província de mesmo nome no norte do país. Agora, a entrada dos insurgentes em Qala-i-Naw certamente vai desferir mais um golpe no moral – já consideravelmente enfraquecido – das forças afegãs, de acordo com analistas.
A captura de Qala-i-Naw seria "um sucesso estratégico, porque teria um efeito psicológico nas forças afegãs que estão perdendo terreno rapidamente", explicou Nishank Motwani, pesquisador especializado em Afeganistão.