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Sem consenso e sob críticas, OEA volta a discutir Paraguai

Pablo Uchoa

Sem consenso interno e criticada por não ter conseguido prever a crise paraguaia, a Organização dos Estados Americanos (OEA) volta a se reunir nesta semana para discutir o balanço da visita do seu secretário-geral, José Miguel Insulza, a Assunção. Nesta terça-feira, Insulza informará aos 34 países da entidade sobre as suas conclusões após ter se reunido, na semana passada, com as principais lideranças do governo e da oposição paraguaias.

Para especialistas, entretanto, uma ação conjunta da OEA em retaliação ao impeachment do ex-presidente Fernando Lugo, no último dia 22 de junho, é cada vez "menos" provável, dadas as divergências entre seus integrantes. Além disso, muitos países ainda estão reticentes em seguir a liderança dos países do Mercosul no tema, principalmente após a entrada da Venezuela no bloco sul-americano.

Junto com Insulza, viajaram representantes dos EUA, Canadá, México, Honduras e Haiti – países que até o momento não se mostraram dispostos a condenar a deposição de Lugo, em um rito sumário porém conduzido pelo Congresso de acordo com o procedimento estabelecido pela Constituição. Os EUA têm permanecido em silêncio sobre o assunto, mas o Canadá já expressou apoio ao governo do sucessor, Fernando Franco.

O representante brasileiro na OEA, Breno Dias da Costa, disse à BBC Brasil que a sua postura será a de "ouvir", "avaliar" e reportar a Brasília o relatório do secretário Insulza. Se o documento confirmar as inclinações iniciais da missão, pode desagradar aos países sul-americanos, que desde o início usaram a linguagem da "ruptura da ordem democrática" para tratar do ocorrido no país vizinho.

Críticas ao Mercosul
O Brasil não esconde que prefere que a OEA seja guiada pela avaliação dos blocos regionais, o Mercosul e a Unasul – mais próximos do centro do problema e também mais suscetíveis ao controle de Brasília. Entretanto, diplomatas e acadêmicos em Washington acreditam que o Mercosul agiu de forma incoerente com o Paraguai, e que a sua credibilidade como intermediário da crise foi prejudicada pelo ingresso da Venezuela no bloco, possibilitada apenas pela suspensão do Paraguai.

A insistência na opinião de que houve "ruptura" no Paraguai esbarra no fato de que Lugo saiu depois de ter perdido apoio crucial no Congresso, sem o qual a própria governabilidade do país ficara comprometida. "Não há dúvida de que houve pressa no impeachment de Lugo, mas é possível imaginá-lo continuando só com o apoio de um ou dois deputados e quatro senadores?", questionou o ex-embaixador americano para o Paraguai entre 2003 e 2005, John F. Keane.

Para uma plateia de diplomatas e representantes de governos em Washington, Keane comparou: "Não é melhor que os legisladores utilizem os seus poderes de elaborar um juízo político, assim como no Parlamentarismo há o mecanismo do voto não-confiança?". O ex-assessor do presidente Barack Obama para a região Arturo Valenzuela, que também aconselhou a Casa Branca durante episódios de turbulência no Paraguai no governo Bill Clinton, é outro que defende a legalidade da deposição de Lugo.

Para Valenzuela, "alguns países estão confundindo um golpe de Estado com o que foi um julgamento político constitucional". "O Mercosul adotou uma posição pela qual corre o risco de deixar o Paraguai ainda mais isolado. E deixou a bola cair no âmbito de como manter interações políticas com o Paraguai, e não apenas com Lugo", avaliou.

"Governos responsáveis"
Liderado pela Venezuela, o "eixo bolivariano" da OEA – que inclui ainda Nicarágua e Equador, por exemplo – qualifica a deposição de Lugo de golpe e pede a volta do ex-presidente ao poder. Mas as críticas à atuação da Venezuela na crise paraguaia têm sido reforçadas pela divulgação de um vídeo que revela um encontro entre o chanceler venezuelano, Nicolás Maduro, e militares paraguaios.

Maduro é acusado de ter tentado instar as forças paraguaias a resistir ao impeachment de Lugo, o que configuraria interferência na política doméstica de outra nação soberana. Breno Dias da Costa lamenta que a discussão sobre as sanções do Mercosul ao Paraguai tenham sido contaminadas pela entrada da Venezuela no bloco – mas reconhece a dificuldade de convencer os seus interlocutores de que sejam coisas separadas. "O problema é que sempre vai haver críticas a partir do momento em que você toma a decisão de agir de uma maneira ou de outra", rebateu. "Se o Mercosul não tivesse atuado, hoje estaria ouvindo críticas de que foi omisso na crise paraguaia."

Acompanhamento
As divergentes reações à crise paraguaia levaram os especialistas a relembrar que os órgãos multilaterais ainda carecem de mecanismos de acompanhamento político dos países da região, a fim de prever potenciais crises políticas e embasar a ação nesses casos. Ex-assessor de política externa do governo de George W. Bush, o consultor José Cardenas acha que um órgão de acompanhamento nem precisaria fazer parte da OEA.

"Pode ser um dos novos blocos regionais, ou outro órgão que não envolva os EUA. O importante é que os governos responsáveis da região atuem antes de que ocorram crises. Eles não podem gritar depois da crise e não fazer nada antes", opinou. Lembrando a reacomodação de forças geopolíticas na região, Arturo Valenzuela reconheceu que hoje em dia os EUA não podem mais atribuir para si essa tarefa de monitoramento. Mas lembrou que um tal órgão precisaria "reconhecer questões de soberania" em crises como a do Paraguai.

"Nesta crise, temos a sensação de que os países da América do Sul estão dizendo para os EUA, 'não se metam, fiquem de fora que isso é nossa responsabilidade e nosso problema'. Mas se os países vizinhos quiserem continuar a ter uma influência no Paraguai, precisam abordar a questão de outra maneira", opinou. "Os EUA não precisam estar presentes em toda a crise, mas se outros países não estiverem dispostos a assumir as suas responsabilidades, os EUA precisam ter essa responsabilidade de atuar."

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