Em Madri, a empresa Epalisticia SL está registrada sob o número HM 562552. Ela se dedica à compra, venda e aluguel de terrenos, imóveis e fazendas de qualquer tipo. A firma tem oito funcionários, contratados no último dia 26 de maio. Eles acabaram ganhando notoriedade não pela compra de propriedades, mas por terem adquirido o jornal venezuelano El Universal, tradicionalmente crítico ao governo.
Hoje o Universal já não pode publicar suas críticas com tanta frequência. Um novo manual de redação dita as regras, o que resultou na dispensa de 26 funcionários que não concordaram com as novas diretrizes. No período de um ano e meio, esse foi o terceiro órgão de mídia independente venezuelano vendido em circunstâncias nebulosas. O canal de televisão Globovisión e o grupo editorial Cadena Apriles também mudaram de mãos – e, de tabela, de orientação.
"O 'manual' é apenas uma distração para encobrir outra medida, que visa uma mudança fundamental na linha editorial. O objetivo é fazer uma imprensa menos crítica, onde os jornalistas critiquem menos o governo. Como resultado, há menos diversidade e debates na mídia", diz Carlos Correa, diretor da ONG venezuelana Espacio Público.
Mais poderes
Em 1992, a organização independente Freedom House qualificou a imprensa venezuelana como "livre". Desde então, o país vem caindo de avaliação e ocupa agora a 171ª posição, em um total de 197 no ranking de liberdade de imprensa mundial.
Em vez de impor a censura, o governo do presidente Nicolás Maduro trabalha com indivíduos simpáticos ao regime, que fazem com que as emissoras e os jornais se alinhem à situação, ainda que lucro e clientes (leitores) fiquem em segundo plano.
Na opinião do analista político Daniel Lansberg-Rodriguez, da Universidade do Texas, a estratégia é inteligente: "Se alguém tentar acusar o governo e seus apoiadores de praticar censura, eles podem se defender afirmando que grande parte da indústria de mídia venezuelana está em mãos independentes e privadas."
Há apenas meio ano, Maduro parecia estar com os dias contados. Devido à desastrosa situação de abastecimento de bens no país, o aumento da criminalidade e os violentos protestos, muitos observadores apontavam que era apenas uma questão de tempo para que o sucessor de Hugo Chávez deixasse o cargo. No entanto, Maduro provou que os críticos estavam equivocados e hoje em dia está mais firme do que nunca no poder.
Isso se deve a duas razões: o regime não apenas levou à prisão indesejados líderes oposicionistas – com base em argumentos suspeitos – mas também reprimiu os violentos protestos estudantis, que eventualmente acabaram se esvaziando. O governo vendeu esses episódios como uma vitória sobre uma conspiração liderada pelos Estados Unidos contra a Venezuela.
Até o antes dividido Partido Socialista Unido de Venezuela (PSUV) reforçou o apoio ao presidente. Na convenção no fim de julho, os deputados, em bloco e de forma surpreendente, elegeram Maduro como líder do partido.
Oposição fracassa
Em parte, Maduro se mantém no poder sem grandes abalos devido à fragilidade da fragmentada oposição. A aliança opositora Mesa da Unidade Democrática (MUD) não representa atualmente qualquer ameaça ao regime, sobretudo após a renúncia de seu secretário-geral, Ramón Guillermo Aveledo.
Há anos a oposição é incapaz de levar adiante suas estratégias. A tentativa de levar as massas a protestar nas ruas, para forçar uma mudança de governo, fracassou. Tampouco o plano do ex-candidato da oposição à presidência Henrique Capriles funcionou. "Deixamos a crise social e econômica fazer seu papel, uma vez que sabíamos que elas aconteceriam. Temos que transformá-las em uma crise política", disse certa vez o opositor.
A MUD fracassou ao tentar se dirigir às massas nos bairros pobres, que se sustentam através das subvenções do governo. Maduro, confiante em seu poder atual, divulgou sua mais recente iniciativa: o preço da gasolina, até então subsidiado, será convertido a valores realistas. Hoje em, o preço para abastecer por completo um automóvel Golf da Volkswagen, por exemplo, é 64 centavos de euro.
O último aumento no preço dos combustíveis, há 25 anos, resultou em uma revolta popular que causou quase 300 mortes. No entanto, Maduro não teme algo semelhante nos dias de hoje. Menos ainda, as críticas da imprensa.