"Venezuela não é uma ameaça" é o título da carta aberta aos Estados Unidos, publicada pelo governo Nicolás Maduro no jornal The New York Times, como artigo de página inteira.
Há muito tempo o relacionamento entre os dois países vai mal. Assim, o presidente venezuelano não poupa palavras drásticas, acusando os EUA de comportamento tirânico e exigindo que seu governo suspenda imediatamente "todas as medidas hostis" contra a Venezuela. "Nunca antes, na história de nossas nações, um presidente dos Estados Unidos tentou governar venezuelanos por decreto", diz a carta.
Trata-se de uma reação às sanções impostas pelo presidente Barack Obama há algumas semanas contra uma advogada de Caracas, assim como contra oficiais do Exército, da Guarda Nacional e do serviço secreto. Os funcionários são acusados de violação dos direitos humanos e de corrupção, na repressão dos protestos de nível nacional em fevereiro e março de 2014, em que 40 pessoas morreram e milhares de oposicionistas foram presos.
Além disso, os implicados teriam desempenhado papel central no endurecimento da repressão aos opositores políticos no país. Nesse contexto, Obama classificou a Venezuela como "um perigo excepcional e inusitado para a segurança nacional dos EUA".
Novo capítulo de uma relação difícil
As novas sanções seriam um golpe "agressivo, injusto e danoso" contra seu país, declara Nicolás Maduro. Em represália, ele impõe, entre outras medidas, a proibição da entrada na Venezuela de políticos americanos importantes, e anuncia uma redução significativa do pessoal da embaixada dos EUA em Caracas.
Por um lado, declarações críticas e até ofensivas como essas fazem parte da história dos conflitos diplomáticos entre os dois países, já sendo praxe na época do antecessor de Maduro, Hugo Chávez: morto em 2013 – ambos, os autodenominados fundadores do "socialismo do século 21" na Venezuela. Por outro lado, há indicações de que os EUA apoiem partidos oposicionistas no país sul-americano.
Mas será a Venezuela, de fato, um "perigo para a segurança nacional" dos EUA? De acordo com Carl Meacham, especialista em assuntos latino-americanos do think tank Centro de Estudos Internacionais e Estratégicos (CSIS), em Washington, "um agravamento da situação de direitos humanos na Venezuela poderia certamente se tornar um fator de instabilidade para toda a região".
Além disso, há indícios de ligações entre membros do governo venezuelano, organizações terroristas internacionais e cartéis do narcotráfico, aponta Meacham. A alusão a um "perigo", entretanto, seria antes de tudo uma justificativa formal: sem essa pré-condição, não seria possível a imposição de sanções.
Momento inoportuno – mas não tanto
Mais interessante parece ser a pergunta: por que essas sanções estão sendo impostas justamente agora, quando as relações diplomáticas entre os Estados Unidos e a socialista Cuba estão em processo de normalização?
Havana é vista como aliada política de Caracas e, juntamente com outras nações latino-americanas, condenou as medidas punitivas de Washington. A três semanas do encontro entre Obama e o chefe de Estado cubano, Raúl Castro, na 7ª Cúpula das Américas, de 10 e 11 de abril no Panamá, o momento escolhido parece especialmente inoportuno.
Para Harold Trinkunas, diretor do departamento latino-americano do think tank Brookings Institution, as sanções também poderiam servir a interesses americanos na política interna.
"Os republicanos se aproveitaram das tentativas de Obama, de negociações sobre o programa nuclear do Irã e de aproximação com Cuba, como pretexto para criticar a suposta fraqueza do presidente. As sanções – que não se dirigem à Venezuela, mas sim contra membros específicos do governo – poderiam servir para Obama mostrar que não é só fraco."
Trinkunas considera improvável que as medidas de Washington venham a prejudicar o processo de aproximação entre Cuba e os EUA. "Cuba quer finalmente ser retirada da lista americana dos países que apoiam o terrorismo. E, através da normalização, o governo também tenta reaquecer a economia da ilha."
Além disso, as sanções poderiam ser igualmente úteis para o governo venezuelano. O presidente Maduro se encontra sob considerável pressão interna, pois o país atravessa séria crise econômica apesar de ser rico em petróleo. Harold Trinkunas crê que, graças às sanções dos EUA, Maduro poderá "por um lado, distrair o povo venezuelano de problemas maiores; por outro, seguir tachando a oposição de antipatriótica, pelo fato de não se distanciar dos Estados Unidos."