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Relatório Otálvora: América Latina em meio ao embate EUA-Rússia

 

EDGAR C. OTÁLVORA

Diario las Américas

19 Fevereiro 2022

@ecotalvora

 

Por exemplo. Em 18FEV2022, em Bogotá, um grupo de “progressistas” associados ao candidato presidencial Gustavo Petro, brandindo uma bandeira “estelar” dos secessionistas catalães, apedrejou as janelas do hotel onde se reunia um grupo de “libertários” da Ibero-América pelo grupo "Foro Madrid" ligado, entre outras organizações, ao partido espanhol Vox. Participaram do evento figuras como Hermann Tertsch, Álvaro Uribe Vélez, María Corina Machado, os brasileiros Eduardo Bolsonaro e Ernesto Araújo, o argentino Javier Milei, entre outros.

Anteriormente, em 07JAN2022, de JAN 07, Petro havia lançado sua campanha eleitoral em Barcelona,  Espanha, patrocinada por Oriol Junqueras, o presidente secessionista da “Esquerra Republicana de Catalunya”. Durante sua turnê espanhola, Petro foi escoltado de perto pelo agora onipresente Juan Carlos Monedero, o teórico do partido Podemos e conselheiro dos governos de Hugo Chávez, Nicolás Maduro, Rafael Correa, Evo Morales e o próximo governo do chileno Gabriel Boric.

Os “progressistas” se reúnem no Grupo Puebla, a organização VIP do Fórum de São Paulo. Os "libertários" tentam estruturar um núcleo de coordenação política internacional.

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Aliás, a fórmula inventada por Monedero e seu grupo (então Íñigo Errejón) para as reformas constitucionais na Bolívia e no Equador, promovidas por Morales e Correa e que declararam esses países como “plurinacionais”, foi aprovada em 18FEV2022 para ser assumida também pelo Chile conforme aprovado pela atual Convenção Constitucional daquele país.

 

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O principal operador de política externa de Bolsonaro é um militar: o Almirante-de-Esquadra Flávio Viana Rocha. Assim como Lula da Silva e Dilma Rousseff mantiveram Marco Aurélio García, no Palácio do Planalto como seu operador político no exterior, fora e às vezes contra a chancelaria do Itamaraty, agora Bolsonaro tem Viana Rocha como seu emissário direto perante governos estrangeiros.

Inicialmente, o aparato de política externa de Bolsonaro era composto por seu filho, o deputado Eduardo Bolsonaro, o jovem cientista político Felipe Martins nomeado assessor presidencial com gabinete no Palácio do Planalto, e Ernesto Araújo, diplomata de carreira recentemente promovido, em 2019, ao posto de embaixador quando foi nomeado Ministro das Relações Exteriores.

Faltava a Martins a longa experiência e os laços internacionais do operador de Lula, o falecido esquerdista Marco Aurélio Garcia. Por sua vez, Araújo, desde o início de seu mandato no Itamaraty, brigou com seus colegas até ser obrigado a renunciar em 29MAR2021. Martins e Araújo fizeram parte de uma diplomacia fortemente ideológica influenciada pelo “filósofo” Olavo de Carvalho confrontado com o pragmatismo habitual do Itamaraty e com a necessidade de Bolsonaro de ampliar sua base de apoio partidário no Congresso. Araujo foi substituído pelo diplomata Carlos Franco França que tem sido o encarregado de "normalizar" a gestão externa do governo Bolsonaro, inclusive abrindo canais na Washington do governo Biden.

 

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Para a diplomacia presidencial direta, Bolsonaro conta com a experiência internacional do Almirante Viana Rocha, que atua como secretário de Assuntos Estratégicos. Viana Rocha tem sido responsável por manter as pontes entre o governo de esquerda de Alberto Fernández e Bolsonaro. Ele também foi imbuído de se conectar com o governo russo. Viana Rocha viajou para Moscou em dezembro de 2021 numa viagem que foi acompanhada de perto pelos EUA. Oficialmente, o objetivo da viagem era rever questões de cooperação militar entre os dois países, embora também se tratasse de especificar aspectos de uma visita de Bolsonaro à Rússia, em resposta a um convite que Vladimir Putin havia feito a ele em 2019, quando o russo visitou o Brasil a propósito da cúpula dos chamados BRICS. A questão da visita de Bolsonaro a Moscou, em meio às tensões pré-guerra em torno da Ucrânia, chamou a atenção da diplomacia norte-americana empenhada em formar uma aliança internacional com a Rússia.

 

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Bolsonaro teve tratamento privilegiado na Casa Branca durante o governo Donald Trump, situação que mudou com a chegada de Joe Biden. Em Brasília, alguns adeptos da vida política brasileira calculam que dentro da família Bolsonaro sentiam rancor pela mudança em sua valorização e acesso à Casa Branca. Em viagens recorrentes aos EUA, Eduardo Bolsonaro costuma participar de reuniões com o ex-presidente Donald Trump e Steve Bannon, demonstrando que o clã Bolsonaro mantém seus laços especiais com aquele setor político norte-americano. Mesmo as recentes posições pró-Rússia, emitidas por conhecidos divulgadores do trumpismo, como o locutor Tucker Carson da rede Fox e o próprio Bannon, podem ser uma das explicações para Bolsonaro decidir viajar para a Rússia em um momento de alto confronto entre Washington e Moscou. A visita à Moscou, em 01FEV2022 de outro amigo de Trump e Bannon, o primeiro-ministro húngaro Viktor Orbán, e a posterior visita de Bolsonaro a Orbán, em 17FEV2022, deram corpo a essa linha de interpretação da viagem do brasileiro para tirar uma foto com Vladimir Putin.

Setores de esquerda do Partido Democrata norte-americano, influenciados por suas conexões com a esquerda brasileira, mantêm posições de repúdio a Bolsonaro por questões como Direitos Humanos e gestão da Amazônia. O governo Biden rebaixou suas conexões com Brasília e o secretário de Estado Antony Blinken não visitou o Brasil.

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O anúncio da visita de Bolsonaro a Moscou, negociado por Viana Rocha, desencadeou uma sucessão de comunicados de Washington à Brasília. Em 10FEV2022, o secretário de Estado Blinken comunicou com seu colega brasileiro Carlos França “sobre prioridades compartilhadas, incluindo a necessidade de uma resposta forte e unida contra novas agressões russas contra a Ucrânia”. Em 30JAN2022, houve uma nova ligação incomum de Blinken para França, na qual a questão da ameaça de uma invasão russa da Ucrânia foi levantada novamente. Os apelos foram justificados porque os EUA estavam promovendo uma sessão do Conselho de Segurança da ONU para tratar da questão da Ucrânia e o Brasil faz parte desse Conselho desde 01JAN2022. Para os EUA, era importante ter o apoio do Brasil, primeiro para garantir a convocação da sessão e, segundo, ter uma posição acordada com a Rússia.

A sessão do Conselho de Segurança aconteceu no dia 31JAN2022 e a posição do porta-voz brasileiro, embaixador Ronaldo Costa Filho, confirmou que o governo Bolsonaro não estava mais jogando um jogo fechado com os EUA. O Brasil apoiou a realização da sessão do Conselho, que foi contestada por Rússia e China, mas a posição expressa pelo embaixador brasileiro não acatou a tese norte-americana sobre a ofensiva russa contra a Ucrânia. “O Brasil ressalta a necessidade de, de boa fé, atender às legítimas preocupações de segurança de todas as partes, inclusive da Rússia e da Ucrânia”, assumindo assim a tese russa segundo a qual sua pressão militar sobre a Ucrânia responde às necessidades de segurança

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Diversas fontes em Brasília e Washington asseguram que o Departamento de Estado norte-americano teria tentado convencer o governo brasileiro sobre o momento inoportuno para a visita a Moscou. Outros asseguram que o Departamento de Estado teria transmitido a Bolsonaro o desejo de Washington de aproveitar sua conversa com Putin para ratificar sua posição a favor de desencorajar a ação armada contra a Ucrânia e retomar uma linha de negociação diplomática sobre questões de segurança europeias. Essa última ideia foi efetivamente expressa por Bolsonaro em um discurso preparado que ele leu na presença de Putin em 16FEV2022, mas o que transpirou internacionalmente foi a frase que o brasileiro expressou a Putin durante a primeira conversa que foi gravada e distribuída pelo governo russo. "Somos solidários com a Rússia", disse Bolsonaro claramente a Putin em uma reunião sem chanceleres, em uma frase que ficou aberta à interpretação por causa de sua natureza genérica. Com essa declaração e as respetivas fotos, Putin conseguiu mostrar que no meio do seu confronto com os EUA e a Europa tem amigos deste lado do Atlântico.

Por sua vez, Bolsonaro em seu discurso a Putin garantiu que "ambos compartilham valores comuns, como a crença em Deus e o respeito à família".

Conforme relatado pela correspondente da rede brasileira O Globo em Washington, Raquel Krähenbühl, a frase de solidariedade de Bolsonaro a Putin provocou grande desconforto no Departamento de Estado dos EUA. A declaração oficial dos EUA foi emitida pelo porta-voz da Casa Branca Jen Psaki em 18FEV22 que afirmou que o Brasil poderia estar neste momento “do outro lado da comunidade global”.

Em 19FEV2022, o Ministério das Relações Exteriores de Bolsonaro emitiu uma breve declaração afirmando que "não considera extrapolações sobre o discurso do presidente como construtivas ou úteis" como as expressas por Psaki, enquanto Bolsonaro negou que sua viagem à Rússia tenha sido para apoiar a posição de Putin.

A independência da política externa brasileira e o interesse geopolítico em projetar o soft power do Brasil foram alguns dos argumentos a favor da viagem de Bolsonaro à Rússia, expressos por analistas de questões militares brasileiras.

 

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Enquanto Bolsonaro viajava para a Rússia para aborrecimento dos EUA, um importante emissário russo visitava seus três principais aliados na América Latina. Yuri Ivanovich Borisov é um dos vice-primeiros-ministros do regime russo. Sua área de trabalho é o complexo militar russo e nos últimos anos ele se tornou um visitante regular dos aliados latino-americanos. Borisov visitou Caracas, Manágua e Havana entre 16FEV2022 e 19FEV2022 sendo recebido pessoalmente por Nicolás Maduro, Daniel Ortega. Borisov foi recebido, em 14OUT2021, por Raúl Castro.

Nas três visitas de Borisov, o tema discutido foi a cooperação militar e o apoio às ditaduras da Venezuela, Nicarágua e Cuba ao governo russo em seu confronto com os EUA. Os três países fazem parte dos potenciais locais de apoio logístico à Marinha e Aeronáutica Russas em território americano.

 

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