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O que o Brasil compra – e o que vende – da isolada Coreia do Norte

Luis Barrucho


Se, ao leste, do outro lado do Pacífico, está seu arqui-inimigo, os Estados Unidos, ao sudeste, o líder norte-coreano, Kim Jong-un, tem um aliado, pelo menos do ponto de vista comercial.

Único nas Américas a manter embaixadas nas duas Coreias, o Brasil foi, no ano passado, o 8º país que mais comprou produtos vindos da Coreia do Norte, indicam dados compilados pela ONU.

Durante o período, o comércio bilateral totalizou US$ 10,75 milhões (cerca de R$ 36 milhões em valores atuais).

Apesar de significativo para a isolada Coreia do Norte, contra a qual pesam sanções econômicas devido à manutenção de seu programa nuclear e de seus testes balísticos, o volume negociado entre os dois países é o menor desde 2000.

Também está bem abaixo do recorde de 2008, quando o intercâmbio comercial (soma das importações e exportações) foi quase 40 vezes maior do que o do ano passado (US$ 375,2 milhões).

A BBC Brasil apurou que essa redução se deu, principalmente, pelo medo de exportadores brasileiros serem retaliados por potências ocidentais e seus aliados ao negociarem com a Coreia do Norte.

Essas empresas temem que, ao venderem produtos para o isolado país, possam perder contratos importantes – e financeiramente mais vantajosos – com Estados Unidos e Japão, por exemplo.

Sanções impostas pela ONU proíbem a exportação de armas, minerais e bens de luxo para a Coreia do Norte. Estados Unidos, Coreia do Sul, Japão e União Europeia impuseram sanções próprias semelhantes.

'Potência nuclear'

Na última terça-feira, no dia da Independência dos Estados Unidos, o governo norte-coreano anunciou que havia lançado com sucesso seu primeiro míssil balístico intercontinental.

Segundo especialistas, o projétil poderia atingir o Estado americano do Alasca.

A televisão estatal norte-coreana divulgou imagens do teste, chamado de "presente aos Estados Unidos", e anunciou que o feito põe o país no patamar de "potência nuclear", agora capaz de "atingir qualquer parte do mundo".

No dia seguinte, os Estados Unidos e um de seus aliados asiáticos, a Coreia do Sul, conduziram, em retaliação, um teste de mísseis no território do sul-coreano.

Autoridades dos dois países emitiram, então, um comunicado destacando que a moderação "é tudo o que separa a trégua da guerra".

Na sequência, os americanos convocaram uma reunião de emergência no Conselho de Segurança da ONU, em Nova York, onde anunciaram que pretendem apresentar um conjunto de sanções ao país asiático e elevaram o tom do discurso.

"Podemos usar (nossas forças militares) se precisarmos", alertou a embaixadora dos Estados Unidos na ONU, Nikki Haley.

A relação conflituosa entre a Coreia do Norte e os Estados Unidos e seus aliados asiáticos não é recente, mas o lançamento bem-sucedido de um míssil que poderia chegar à fronteira americana aumenta a preocupação quanto a um potencial confronto armado.

Produtos

No ano passado, o Brasil exportou à Coreia do Norte US$ 2 milhões em produtos, segundo dados do Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços (Mdic).

O café torrado (47% do total) foi o principal item vendido, seguido por fumo, couros e peles, além de carne bovina desossada e congelada.

Do lado das importações, o país comprou cerca de US$ 8,7 milhões dos norte-coreanos, em sua maioria peças de computador, como placas de memória digital (41% do total).

A BBC Brasil entrou em contato com algumas empresas brasileiras listadas como exportadoras de produtos à Coreia do Norte. Duas delas afirmaram que nunca venderam ao país e não sabem como apareceram nas planilhas de comércio divulgadas pelo Mdic.

Questionado pela reportagem, o ministério afirmou, em nota, que "devem ter ocorrido erros no preenchimento no sistema".

"Provavelmente, devido à semelhança do nome do país com 'Coreia do Sul' e a proximidade dos dois códigos, devem ter ocorridos erros no preenchimento de dados no sistema. Destacamos, mais uma vez, que o registro efetuado é de reponsabilidade dos operadores, exportadores e importadores e são informações de caráter declaratório", alegou o Mdic.

A China continua sendo a principal aliada econômica da Coreia do Norte, sendo responsável por mais de 80% tanto das importações quanto das exportações do país.

Outros produtos norte-coreanos têm como destino Índia, Filipinas e Paquistão.

Na outra ponta, depois da China, a Coreia do Norte compra da Índia, Rússia e Filipinas.

Relações diplomáticas

Brasil e Coreia do Norte estabeleceram relações diplomáticas em 2001, durante o governo do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso.

Em 2005, o governo norte-coreano inaugurou sua embaixada em Brasília.

Quatro anos depois, foi a vez de o Brasil fazer o mesmo na capital norte-coreana, Pyongyang.

Desde julho do ano passado, contudo, a representação diplomática brasileira não tem um embaixador e é chefiada por um diplomata que exerce a função de encarregado de negócios.

Ele é único membro do corpo diplomático no posto, com exceção de oficiais de chancelaria enviados periodicamente em caráter temporário.

Além disso, diferentemente do que acontece no exterior, a embaixada do Brasil em Pyongyang não tem, entre as suas atribuições, a promoção comercial, limitando-se à "observação política in loco".

Ajuda humanitária e cooperação técnica

Isolada do resto do mundo e prejudicada pelas sanções econômicas, a Coreia do Norte é particularmente afeita a desastres naturais e fenômenos climáticos extremos, como secas e enchentes, ocasionando a quebra de colheitas.

Por causa disso, o Brasil realizou "três iniciativas de ajuda humanitária ao país – todas por meio do Programa Mundial de Alimentos da ONU: em abril de 2010, doação pecuniária, no valor de US$ 200 mil; em dezembro de 2011, doação de 16,5 mil toneladas de milho; e, entre abril e maio de 2012, doação de 4.600 toneladas de feijão", informou o Itamaraty.

Os dois países também já conduziram projetos de cooperação técnica.

A última missão de técnicos brasileiros à Coreia do Norte foi realizada em 2010, seguida, em 2011, por uma missão norte-coreana integrada por quatro técnicos, que receberam treinamento sobre plantio de soja na Embrapa em Piracicaba e Londrina.

De acordo com o Itamaraty, recentemente, o governo norte-coreano solicitou um novo projeto de cooperação técnica com o Brasil na área de capacitação de técnicos para manutenção de maquinário agrícola.

"A referida iniciativa tem sua viabilidade sendo considerada pelo Itamaraty e pela Agência Brasileira de Cooperação (ABC), haja vista seu propósito humanitário de contribuir para a segurança alimentar do país", acrescentou o órgão.

 

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