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Íntegra da apresentação do Diretor do IISS sobre o Livro: Os Documentos das FARC

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The FARC Files – Remarks by Nigel Inkster
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OS DOCUMENTOS DAS FARC:
Venezuela, Equador e o Arquivo Secreto de ‘Raúl Reyes
Versão em Espanhol

 
Nigel Inkster
Diretor para Ameaças Transnacionais e Risco Político
Instituto Internacional para Estudos Estratégicos, Londres
10 de Maio de 2011
 
 
É raro que os registros de um grupo rebelde caiam no domínio público enquanto o movimento armado ainda está ativo. Mas é exatamente isso o que aconteceu na Colômbia, proporcionando a matéria prima para o último Dossiê  Estratégico IISS Os Documentos Das FARC: Venezuela, Equador e o Arquivo Secreto de “Raúl Reyes” (The FARC Files: Venezuela, Ecuador and the Secret Archive of “Raúl Reyes”).
 
O dossiê é resultado de uma pesquisa que durou dois anos, baseada nas informações apreendidas pelas Forças Armadas Colombianas durante uma incursão, no dia 1 de Maio de 2008, em uma base guerrilheira no lado equatoriano da fronteira com a Colômbia. O campo era ocupado por integrantes das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia – Exército do Povo, o maior de vários grupos que desafiam a autoridade do Estado colombiano desde os anos 60. A incursão resultou na morte de Luis Edgar Devía Silva, conhecido pelo apelido Raúl Reyes. Reyes era um dos sete integrantes da liderança das FARC, o Secretariado. Desde a metade dos anos 90, ele também chefiava a rede internacional de representantes e simpatizantes, conhecida como o Comitê Internacional, ou COMINTER. Reyes mantinha um arquivo descriptografado dos seus e-mails, na maioria recebidos e enviados usando criptografia PGP por transmissão de rádio desde o ano 2000, contrariando os procedimentos de segurança em vigor nas FARC, dos quais ele mesmo tinha lembrado os colegas e colaboradores. Os arquivos também contêm um acervo de documentos estratégicos dos últimos 30 anos, incluindo registros de conferências periódicas e outros encontros que foram marcos na evolução das FARC.
 
Depois de obter o arquivo, mantido em oito dispositivos de armazenamento em uma pasta de metal, as autoridades colombianas entregaram as informações para a INTERPOL, que conduziu uma perícia técnica para validar sua integridade.
 
O material também submetido a uma triagem, em busca de informações que levassem a operações de inteligência. Em seguida, o governo colombiano entregou o arquivo para o Instituto Internacional para Estudos Estratégicos (IISS), para que fosse realizada uma análise mais detalhada e sistemática – o que representou um grande desafio, levando muito mais tempo do que o previsto. Se tivéssemos entendido a enormidade da tarefa, nós talvez tivéssemos pensado duas vezes antes de aceitá-la. Milhares de mensagens, contendo milhões de palavras, tiveram que ser lidas e organizadas em um formato sequencial e que pudesse ser pesquisado. (O CD-ROM que acompanha o dossiê apresenta apenas uma porção dos arquivos e mesmo assim contém 1,6 milhão de palavras) O material depois teve que ser comparado a outras informações relevantes no domínio público antes que a redação do dossiê pudesse começar. Desde o começo, o governo colombiano concordou em não tentar influenciar a direção da nossa pesquisa, nem nossas conclusões analíticas. Como consequência, as opiniões no dossiê são apenas do IISS.

Análises estratégicas

 O arquivo de Reyes permite uma análise sem precedentes sobre as origens, evolução e funcionamento diário de um dos maiores e mais influentes grupos rebeldes no mundo, durante um período que vai quase até os dias atuais. Enquanto as políticas e o comportamento do governo colombiano em relação ao longo movimento armado das FARC já foram publicadas e analisadas em detalhe, informações especificamente sobre as FARC, uma organização secreta, eram raras até este momento. Por esse motivo, o arquivo preenche uma importante lacuna no nosso entendimento da história recente da região Andina e também aumenta nosso entendimento das dinâmicas políticas e culturais do movimento armado. O arquivo mostra como as FARC, que começaram com um repertório tático limitado e em uma área estratégica confinada às remotas regiões rurais colombianas, desenvolveram um ambicioso plano para chegar ao poder.
 
O grupo tentou espalhar guerrilha pelo país; manipulou tensões sociais e políticas nas cidades; explorou o desejo de outros atores no conflito em negociar a paz enquanto se
mantinha determinado a conseguir uma vitória militar; e tentou conseguir apoio político e material além das fronteiras da Colômbia. O impacto militar das FARC atingiu o ápice  em 1998, quando a Colômbia começou a ser considerada um Estado fracassado. Enquanto Bogotá começava a recuperar a iniciativa militar, as FARC tentaram compensar voltando suas atenções às dimensões internacionais e políticas da campanha – uma área na qual o governo colombiano tinha dificuldade em impor sua própria narrativa.
 
Durante todo o período coberto pelo dossiê, os objetivos principais da estratégia internacional das FARC permaneceram constantes. Eles eram:
 

 • Assegurar apoio financeiro e militar. Nesse ponto o grupo basicamente fracassou. Esforços constantes durante a reta final da Guerra Fria para integrar regimes supostamente compatíveis em termos de ideologia, como China, União Soviética e Coreia do Norte, para que proporcionassem patrocínio fracassaram e foram abandonados. As FARC vigorosamente perseguiram uma variedade de opções alternativas com o objetivo de adquirir sistemas de defesa aérea portáteis (MANPADS) para desafiar a supremacia aérea colombiana, mas não há evidência no arquivo ou em outras fontes que indique qualquer sucesso nesse plano.
 
• Adquirir apoio e legitimação internacional. Aqui as FARC foram consideravelmente mais bem-sucedidas. No fim dos anos 90, o COMINTER realizava atividades políticas em 27 países latino-americanos e europeus, e começava a receber atenção de políticos e formadores de opinião que foram receptivos à narrativa das FARC sobre uma luta dos desfavorecidos contra uma oligarquia repressiva e irresponsável. Até quando o apoio não era obtido, o grupo foi capaz de avançar no igualmente importante objetivo de gerar oposição ao governo colombiano. Depois de as FARC terem sido definidas como organização terrorista no período seguinte ao 11 de Setembro, algumas das representações do grupo, que tinham assumido um caráter quase diplomático, tiveram que ser fechadas. Mas foram substituídas por organizações locais nativas, que se provaram muito eficientes em conseguir apoio para as FARC.
 
• Prejudicar os esforços do governo colombiano em desenvolver segurança internacional e cooperação transfronteiriça. As FARC se empenharam para explorar as tensões entre a Colômbia e os países vizinhos e convencê-los a, no mínimo, adotar uma posição de neutralidade no conflito ou até a promover o objetivo das FARC de serem reconhecidas como grupo beligerante. Esses esforços nem sempre foram bem-sucedidos e às vezes se mostraram contraproducentes, mas ao longo do tempo a relação entre a Colômbia e os vizinhos na região Andina sofreu uma deterioração progressiva, graças, em parte, aos esforços das FARC.
 
• Estabelecer e manter santuários em Estados vizinhos. Esses santuários serviram as clássicas funções militares de proporcionar abrigo, descanso e recreação, treinamento, reabastecimento e preparação para o combate, e se tornaram ainda mais importantes quando as forças se segurança da Colômbia desenvolveram maior mobilidade com o uso de poder aéreo, tornando mais difícil para as FARC manter posições fixas dentro da Colômbia. O arquivo também mostra como as FARC exploraram esses enclaves para se encontrarem com uma variedade de outros atores fora do alcance do governo colombiano. Esses incluíam simpatizantes políticos, traficantes de drogas, integrantes de grupos armados estrangeiros (como o ETA), que receberam treinamento das FARC, e comerciantes de armas – um dos quais alegou representar o Estado chinês.
 

Farc e Venezuela

 
Desde o início do movimento, as FARC tentaram desenvolver um relacionamento com sucessivos governos venezuelanos e tiveram relações pragmáticas com forças de segurança venezuelanas. Os venezuelanos tinham pouca opção senão se adaptarem para a chegada de grupos violentos e potencialmente perigosos que eles não tinham a capacidade de expulsar pela força. Mas foi apenas depois da chegada ao poder do Tenente-coronel Hugo Chávez, em 1999, que as atividades das FARC na Venezuela se aceleraram. A atração genuína que Chávez tinha pelas FARC foi inicialmente moderada pela falta de uma ligação ideológica sólida entre eles (a ortodoxia Marxista das FARC era constantemente frustrada pelo que a liderança do grupo via como falta de uma definição ideológica clara de Chávez); pela necessidade da Venezuela de manter bons laços econômicos com a Colômbia; e pelo risco político que o laço com as FARC representava para um regime que, no começo, tinha bases políticas fracas. Apesar disso, desde o começo Chávez, enquanto publicamente defendendo a neutralidade e se oferecendo como mediador honesto em negociações com o governo colombiano, permitiu que as FARC usassem território venezuelano como refúgio e como base para operações transfronteiriças e atividades políticas. Chávez também designou um papel para o grupo na sociedade civil venezuelana. O governo venezuelano financiou o escritório das FARC em Caracas e, através do serviço de inteligência DISIP, proporcionou documentação e outras formas de assistência para integrantes das FARC.
 
O grupo também pôde estabelecer sua própria organização de fachada, o Comitê Continental Bolivariano (CCB). Em um encontro com Reyes pouco depois de chegar à presidência,
 
Chávez também ofereceu apoio material às FARC, com o objetivo de mudar o equilíbrio militar na Colômbia, apesar de esse esforço não ter se concretizado – causando frustração entre os líderes das FARC.
 
Após o golpe de 2002, que tirou Chávez do poder por um breve período, as FARC conseguiram explorar um clima de medo e paranóia para proporcionar treinamento em guerrilha e combate urbano para vários grupos armados, organizados para defender a Revolução Bolivariana contra um segundo golpe ou até uma invasão americana. As FARC também responderam aos pedidos da DISIP para proporcionar treinamento em terrorismo urbano envolvendo assassinatos direcionados e uso de explosivos. Além disso, o arquivo oferece sugestões perturbadoras mas sem confirmação de que as FARC podem ter assassinado inimigos políticos de Chávez em nome do Estado venezuelano. Ainda assim, Chávez continuou a manter a organização a uma certa distância e não cumpriu todas as promessas de assistência financeira e material. Descrito por aqueles que o cercam como um pensador estratégico genuíno,
 
Chávez jogou durante um bom tempo com sua relação com os guerrilheiros, calculando que eles precisavam dele mais do que ele precisava dos guerrilheiros; e Chávez tampouco hesitou em agir contra os interesses das FARC quando julgou ser vantajoso. Em 2004, dois incidentes de grandes proporções envolvendo as FARC, que respectivamente enfureceram e envergonharam Chávez, levaram a uma quebra total com a organização durante 18 meses.
 
Já nos anos 2006-2007, Chávez, com maior poder por causa dos altos preços do petróleo e o progresso em alcançar os objetivos domésticos e internacionais, iniciou uma reaproximação com as FARC, mudando radicalmente a natureza do relacionamento. Nas palavras de Ramón Rodríguez Chacín, um ex-ministro do interior venezuelano e antigo intermediário das FARC, Chávez passou a ver o grupo como um aliado estratégico em caso de uma agressão pelo império [os Estados Unidos] mas ao mesmo tempo… como aliados estratégicos para a criação de um bloco revolucionário no continente. Vários encontros aconteceram com altos integrantes da liderança das FARC. Chávez se comprometeu a ajudar o grupo a conseguir legitimidade política, reafirmou formalmente o direito das FARC de usar o território venezuelano perto da fronteira colombiana e, especialmente importante, ofereceu US$300 milhões, sendo que US$50 milhões seriam disponibilizados imediatamente. Também foram exploradas várias opções para o fornecimento de armas, incluindo MANPADS, que mudariam o equilíbrio estratégico na Colômbia. Uma dessas opções, discutidas um mês antes da morte de Reyes, envolvia um negócio trilateral com o presidente da Bielorússia, Alexander Lukashenko. Mas nenhum negócio foi concluído e nenhum dinheiro pago até a morte de Reyes.
 
A reaproximação com as FARC coincidiu com uma dramática deterioração das relações da Venezuela com a Colômbia, enquanto o presidente colombiano Álvaro Uribe se irritava com os esforços de Chávez para conseguir vantagens políticas e estratégicas com o envolvimento na libertação de reféns das FARC no que o grupo chamou de troca humanitária. Chávez não foi o único ator externo envolvido nessas libertações, e o arquivo mostra que as FARC exploraram essa situação cinicamente: o principal objetivo do grupo era conseguir visibilidade política e prejudicar a imagem do governo colombiano, procurando impor condições que o grupo sabia que eram inaceitáveis. O envolvimento de atores externos nessas trocas foi, na maioria, para ganhos políticos de curto prazo com pouca atenção para conseqüências estratégicas mais amplas. Poucos conseguiram emergir com crédito do processo, encerrado em 2008, quando o governo colombiano enganou as FARC e libertou a maioria dos reféns mais importantes.

FARC e Equador

Assim como no caso da Venezuela, nos anos 90 as FARC estabeleceram uma presença nas áreas fronteiriças do Equador. Essas áreas são especialmente importantes porque estão conectadas com os departamentos colombianos de Putumayo e Caquetá. Esses serviam como bases importantes para as FARC e produziam grande parte da cocaína com que as FARC contavam para se financiarem. Mas as FARC levaram muito mais tempo para ganhar tração política no Equador do que na Venezuela, e a fronteira equatoriana era uma região incerta e até mesmo hostil para o grupo. As forças de segurança equatorianas não reagiam contra a forte presença da Colômbia e dos serviços de inteligência americanos na região, e às vezes proporcionavam colaboração. Os guerrilheiros nunca conseguiram apoio do Estado equatoriano similar ao que eles tinham na Venezuela, e o contato deles com sucessivos regimes era intermitente. Mas quando a política interna equatoriana começou a inclinar gradualmente para a esquerda a partir da virada do milênio, as FARC conseguiram construir  laços com uma variedade de atores com crescente influência sobre as decisões do governo, incluindo Lucio Gutiérrez antes de ser eleito presidente. O grupo tinha, pelo menos, algum contato com sucessivos regimes e foi bem sucedido ao fomentar discórdia entre Equador e Colômbia. O próprio Reyes estava baseado mais ou menos permanentemente na região de fronteira de 2003 até sua morte. Lá ele se encontrou com vários visitantes estrangeiros e administrou os assuntos do COMINTER em relativa segurança.
 
Quando Rafael Correa declarou a candidatura presidencial em 2006, as FARC inicialmente não se impressionaram com as credenciais esquerdistas dele. Mas quando a popularidade de Correa cresceu, e o potencial radical ficou mais evidente, as FARC contribuíram com aproximadamente US$400 mil para a campanha dele (US$100 mil aparentemente vieram diretamente das FARC e US$300 mil adicionais vieram dos aliados do grupo) em uma etapa crítica. Correa quase certamente aprovou o uso desses fundos em sua campanha, mas isso não se traduziu em um uma política de apoio estatal para os insurgentes durante o curto período entre a posse de Correa e a morte de Reyes. O arquivo mostra que o que Correa mais queria das FARC era desempenhar um papel nas trocas humanitárias como Chávez fazia. Apesar de Reyes ter feito campanha entre os colegas do Secretariado para dar a Correa esse papel, eles permaneceram indiferentes. A morte de Reyes provocou uma séria interrupção nas relações entre Colômbia e Equador – ironicamente um objetivo estratégico chave das FARC – mas também interrompeu a próspera relação das FARC com Quito. Não há evidência de que a relação tenha prosperado desde então.

FARC hoje

 Logo depois da morte de Reyes, a sorte das FARC entrou em declínio. A política de Segurança Democrática da Colômbia alcançou os objetivos de expulsar as FARC de grande parte das zonas rurais, estabelecer governança e instituições onde  nenhuma existia antes e empurrar os insurgentes para as margens do Estado. Melhorias na inteligência permitiram às forças de segurança da Colômbia começarem a decapitar a liderança das FARC, e os níveis de deserção aumentaram. Mas as FARC fizeram o que todo grupo insurgente precisa fazer: sobreviver para lutar um outro dia. Apesar das derrotas, o grupo não mudou a posição ferrenha quanto a negociar a paz. E apesar de a segurança na Colômbia ter melhorado dramaticamente nos últimos anos, os avanços que o governo teve nesse campo permanecem frágeis e potencialmente reversíveis. O governo colombiano encara sérios desafios ligados ao legado do conflito, como milhões de pessoas deslocadas internamente, difíceis questões de posse de terra, a reintegração na sociedade de um grande número de exparamilitares e oito milhões de pessoas que vivem na pobreza absoluta. O governo tenta redirecionar esforços e gastos para o desenvolvimento econômico e reforma social. Mas, apesar de a agenda ter passado para uma fase pós-conflito, a guerra não acabou: as forças de segurança da Colômbia continuam a enfrentar as FARC, e a sofrer baixas, quase diariamente. Enquanto as FARC continuarem a receber apoio e santuário de país

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