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Heinz Dieterich: “Crise fará Exército derrubar Maduro”

Luiz Raatz

Eleito em 2013 após a morte de seu padrinho político, Hugo Chávez, o presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, enfrenta uma crise econômica agravada pela queda do preço do petróleo, uma popularidade em torno dos 20% e críticas dentro e fora da Venezuela pela prisão de políticos da oposição, a quem acusa de tentar derrubá-lo.

Para o sociólogo alemão Heinz Dieterich, ideólogo do socialismo do século 21 defendido por Hugo Chávez, o maior risco de golpe vem de dentro do próprio chavismo e não da oposição. ? “Se não tomar medidas drásticas e corretas para resolver os problemas econômicos e de segurança, ele perderá o apoio dos militares chavistas, que vão tirá-lo do poder”, disse ele aoEstado. A seguir, trechos da entrevista, concedida por e-mail.

Qual a avaliação do sr. sobre as recentes medidas econômicas de Maduro, especificamente sobre a criação de uma banda de câmbio flutuante (Simadi)?

Desde o ponto de vista da economia política, é uma medida completamente disfuncional e até idiota, porque joga gasolina no fogo. O volume do Simadi é tão pequeno que não cobre a demanda.

Em consequência, exerce uma pressão que eleva o preço do dólar. Isso é evidente no mercado paralelo, onde o preço do dólar subiu 60% em um dia. No aspecto político, é uma medida classista em favor dos estratos privilegiados que podem ter fundos e contas em dólares.

Por que a popularidade do governo caiu tanto?

Há duas razões. O governo Maduro não resolveu dois grandes problemas que afligem os cidadãos: a economia e a segurança. A inflação do ano passado superou 60%. A de janeiro chegou a 12% ao mês e é possível que em 2015 ocorra uma hiperinflação, o que quer dizer, na prática, o colapso do sistema financeiro e monetário. Um calote em parte da dívida externa até o fim do ano é possível.

E esse desastroso panorama se repete no setor de segurança. A segunda razão é que mais de dois terços da população já não acreditam na desculpa do governo, de que isso é resultado da ?guerra econômica? dos capitalistas e de Washington. Na prática, quase 80% já não acredita no discurso oficial de Maduro, como dizem as pesquisas sérias.

Como os coletivos chavistas e as pessoas mais pobres estão enfrentando a crise? Eles ainda têm confiança no chavismo?

O que foi quase o monolítico Bloco de Apoio Chavista (BAC) nos tempos do presidente Chávez, hoje está dividido. Os 20% de apoio que restam a Maduro nas últimas pesquisas são essencialmente dos mais pobres, que, com razão, temem perder as conquistas sociais que tiveram com Chávez. E eles ainda acreditam nas mentiras do governo porque é a única esperança e consolo que lhes restaram diante do futuro neoliberal.

Algo como o que os jesuítas diziam: ?credo quia absurdum est? (creio, apesar do absurdo que é). A classe média está muito decepcionada com o governo e com a oposição e busca o que chama de ?terceira via?. Os mais politizados do movimento chavista querem, de um lado, soluções impossíveis como a ?ditadura revolucionária? e, de outro, a reestruturação da troica governante. Um último setor, por fim, se despolitiza e se conforma que não se pode fazer nada.

O que Maduro ganha com a prisão de Antonio Ledezma?

Intimidar a direita golpista, que não acreditava que Maduro se atreveria a prendê-lo. Isso tem um efeito de curta duração. Ganhou dois ou três meses nos quais Washington e seus aliados golpistas venezuelanos terão de se readequar à nova situação e reconfigurar sua estratégia de desestabilização. Em suas fileiras, Maduro se lança como um marechal de campo que derrota o inimigo. Mas, novamente, é uma vitória de Pirro, porque o efeito é conjuntural.

Em artigo no site Aporrea, o senhor apostou que Maduro fica no poder no máximo até 2016, seja por referendo revogatório, renúncia ou intervenção militar. Qual cenário é mais provável?

Se não tomar medidas drásticas e corretas para resolver os problemas econômicos e de segurança, ele perderá o apoio dos militares chavistas, que vão tirá-lo do poder. Há diferentes maneiras de fazê-lo e isso pode ocorrer antes de dezembro. Se não ocorrer, ele sai em 2016, no referendo revogatório ou em eleições antecipadas.

Que motivos teriam as Forças Armadas para intervir?

A perda do projeto chavista original, com seus fortes componentes nacionalista, anti-imperialista, bolivariano e social. Chávez deu aos militares uma razão de ser e uma missão secular. Se a perderem, vem o caos e a anarquia. E nada é mais terrível para um militar que a ideia de anarquia. Evidentemente, os oficiais de alta patente perdem também seus enormes privilégios econômicos e políticos atuais, já que formam a classe dominante.

O que está por trás politicamente da decisão de tirar Rafael Ramírez do Ministério do Petróleo e enviá-lo para a ONU?

Ramírez e Diosdado Cabello sempre foram inimigos porque Cabello é um anticomunista até a morte, enquanto Ramírez é um sobrevivente do socialismo do século 20, o que é inaceitável para um burocrata fazedor de intrigas e autoritário como Cabello. Dado que é Cabello quem manda na Venezuela, uma vez que Maduro nada mais é do que a face pública da facção chavista dominante, era só uma questão de tempo até eliminar qualquer vestígio de esquerda no gabinete. A Venezuela está na fase do Termidor. Acabou a fase revolucionária dos jacobinos latino-americanos.

Heinz Dieterich, sociólogo alemão residente no México. Teórico do socialismo contemporâneo defendido pelos chavistas.

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