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Há dois meses sem Chávez, incerteza e ‘vazio’ prevalecem na Venezuela

Claudia Jardim

A prolongada ausência do presidente da Venezuela Hugo Chávez – internado há dois meses em Cuba – aumenta o clima de incerteza no e impõe maior pressão ao governo, que batalha por preencher o "vazio" deixado pelo líder.

Desde que Chávez viajou à Havana, o Executivo realiza um evidente esforço para mostrar que o governo continua funcionando no mesmo ritmo, sem riscos à governabilidade.

Diariamente, ministros de diferentes áreas se alternam nas transmissões realizadas pelo canal estatal, nas quais são vistos em lançamento de obras de infraestrutura, na entrega de apartamentos para a população de baixa renda ou liderando encontros políticos que pretendem reforçar o ideário chavista.

No entanto, há um "vazio simbólico" no país, que somente pode ser preenchido por Chávez, na opinião do cientista político John Magdaleno."O presidente conseguiu estabelecer um nível de contato e persuasão com a população muito importante", afirmou.

Sem Chávez, governo e oposição continuam gravitando em torno de sua liderança. Não há debate, por mais polêmico, capaz de superar a incógnita sobre o real estado de saúde de Chávez e seu retorno ao país.

"A característica que marcou a população nesses dois meses foi a incerteza e o temor sobre o futuro", afirmou à BBC Brasil o analista político Oscar Schemel, da consultoria Hinterlaces.

Entre os simpatizantes do governo há uma discussão aberta sobre o futuro da "revolução" e do chavismo sem Chávez, acompanhada da expectativa de seu retorno.

"Temos esperança que voltará curado para continuar liderando nossa revolução. Se a saúde não lhe permitir ficar na Presidência, será como um guia que continuará conduzindo o processo", afirmou à BBC Brasil a enfermeira Mirna Gutiérrez, no centro da capital.

Sucessão

Dia 8 de dezembro, Chávez admitiu que a reincidência de seu câncer poderia afastá-lo da vida política e apontou como sucessor político o vice-presidente, Nicolás Maduro.

Desde então, Chávez não é visto ou ouvido em público. Membros de seu gabinete, no entanto, afirmam que ele continua à frente da Presidência e que está dando ordens.

A assinatura de Chávez em documentos – mostrada às câmeras de TV cada vez que uma nova decisão de governo tem de ser tomada – converteu-se numa espécie de "prova de vida" dada pelo governo, em resposta à frequentes críticas da oposição que colocam em dúvida a veracidade das informações sobre sua saúde.

"Afortunadamente nós estamos funcionando. Temos um presidente mandando e assinando (documentos). Com ele (Chávez), somos uma revolução no poder político", afirmou o vice-presidente Nicolás Maduro, minutos antes de mostrar a assinatura de Chávez em uma carta enviada à população que celebrava em Caracas, no dia 4 de fevereiro, um novo aniversário de sua fracassada tentativa de golpe de Estado em 1992.

Na manifestação, Maduro apareceu pela primeira vez com a jaqueta esportiva que leva os símbolos da bandeira venezuelana – vestimenta que se tornou um dos "uniformes" de Chávez.

"Maduro está tentando comunicar que é um herdeiro suficientemente legítimo, mas se observa limitações, como o hiper-radicalismo, recurso que era moderado taticamente por Chávez", afirmou Magdaleno.

Ausência prolongada

Quanto mais prolongada for a ausência do presidente, mais dificuldades o governo enfrentará para projetar um eventual sucessor, caso novas eleições tenham que ser convocadas.

O obstáculo legal foi superado no início do ano, quando o Tribunal Supremo de Justiça decidiu adiar indefinidamente a data da posse do novo mandato para o qual Chávez foi reeleito em outubro passado, à espera de sua recuperação.

"Quanto mais o tempo passar, maior serão as pressões para que a condição de saúde do presidente seja esclarecida", afirmou Magdaleno.

A seu ver, esse cenário poderia contribuir para "esfriar" o clima favorável ao governo e prejudicar a imagem de Maduro como eventual sucessor.

De acordo com uma pesquisa realizada pela consultoria GIS XXI, 54% dos venezuelanos afirmam que preferem esperar a recuperação de Chávez à "forçar" outro tipo de saída. Outros 38% dizem que o líder venezuelano deve renunciar ao cargo e convocar novas eleições. O restante aposta na intervenção de uma junta médica para avaliar as condições de saúde do mandatário.

Ajuste econômico

Na opinião de especialistas, a ausência de Chávez teria levado o governo a "atrasar" um ajuste fiscal considerado por economistas como "iminente" para reestruturar as finanças do país. A principal medida no campo econômico seria a desvalorização da moeda, o bolívar, com taxa de câmbio controlada há quase dois anos (4,3 bolívares por dólar).

O cálculo estaria orientado na possibilidade de que novas eleições presidenciais tenham de ser convocadas – medida que poderia ser pouco popular para o governo no caso de novas eleições.

No entanto, o Executivo – que reiteradamente nega a possibilidade de ajustar o tipo de cambio – tem tomado medidas para aumentar a liquidez dos cofres públicos e amenizar o impacto da crise econômica.

Na semana passada, o governo decidiu modificar o esquema de arrecadação do excedente do lucro petroleiro, para aumentar o ingresso de divisas e amenizar o déficit da moeda estrangeira nos cofres públicos. Com a nova medida, a estatal PDVSA e suas empresas mistas devem pagar impostos de até 95% sobre o excedente do preço do petróleo ajustado a US$ 55 no orçamento deste ano.

Com a medida, o governo espera injetar US$ 2,5 bilhões às reservas do Banco Central da Venezuela. Por outro lado, o Fundo de Desenvolvimento Nacional (Fonden) – responsável pelo financiamento de boa parte dos programas sociais e de grandes obras de infraestrutura – sofrerá cortes de pelo menos US$ 3 bilhões.

Aliado a esta decisão, foi anunciado o incremento da Unidade Tributária, que serve de cálculo para a arrecadação da Receita Federal. Essas medidas são vistas como um primeiro passo para "sanear" as contas públicas.

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