Conflito entre as Coreias do Norte e do Sul durou três anos. Misto de guerra civil e ideológica custou milhões de vidas e envolveu EUA, China e URSS, decisivos para determinar o decorrer e a duração dos combates.
Na guerra entre as duas Coreias, o triunfo final não coube nem às forças de combate da ONU, lideradas pelos Estados Unidos, nem às tropas norte-coreanas, com seus aliados chineses e amplo apoio armamentista soviético.
Os sul-coreanos conquistaram alguns territórios acima do Paralelo 38, e os norte-coreanos estenderam para o sul a antiga linha de demarcação. De resto, tudo continuou como antes: a ditadura comunista do Norte, apoiada pela União Soviética e a China vermelha, seguiu confrontando o regime anticomunista da Coreia do Sul, apoiado pelos Estados Unidos e seus aliados.
Numa tentativa para colocar todo o país sob controle comunista e de comum acordo com Josef Stalin e Mao Tsé-tung, em 25 de junho de 1950 o ditador Kim Il-sung fez as tropas da Coreia do Norte marcharem sobre o 38º paralelo norte, a fim de atacarem o país irmão.
Três dias mais tarde, a capital Seul era tomada. E, poucas semanas depois, as Forças Armadas sul-coreanas, insuficientemente preparadas e com fraco auxílio norte-americano, estavam confinadas a uma pequena área em torno da cidade portuária de Busan. Além disso, algumas tropas dos EUA ficaram cercadas pelos norte-coreanos entre Seul e Busan.
ONU intervém
Em reação, o Conselho de Segurança das Nações Unidas decidiu, em 30 de julho de 1950, interferir no conflito – à revelia da União Soviética, membro com direito a veto – e autorizou a intervenção militar por unidades da ONU, sob liderança norte-americana. Antes, o Conselho já havia condenado a "ruptura da paz" pela Coreia do Norte.
Os soldados da ONU conseguiram reverter a situação, dando fim à série de vitórias norte-coreanas. Após atravessar a linha de demarcação do Paralelo 38, chegaram a ser tomadas a capital Pyongyang e amplas regiões do país ao norte.
No entanto a China contra-atacou, com centenas de milhares de assim chamados "voluntários", e as forças militares sul-coreanas e da ONU tiveram que recuar até a fronteira. Seguiu-se uma dispendiosa guerra de exaustão, durante a qual o mundo por vezes esteve à beira do conflito atômico.
Interesses de Stalin
Em 10 de julho de 1951 foram iniciadas negociações de armistício, porém as armas só silenciariam dois anos mais tarde, em 27 de julho de 1953.
Segundo o historiador Rolf Steininger, da Universidade de Innsbruck, está provado que o líder soviético Stalin foi responsável pelo prolongamento das lutas, que custaram mais de 1 milhão de vidas. "Há muito Kim e Mao Tsé-tung queriam encerrar a guerra, mas Stalin disse 'não'. Hoje sabemos disso." A máxima do ditador teria sido: "Só estamos perdendo gente, e isso nós temos que chega".
"A estratégia de Stalin era deixar os americanos se exaurirem na Coreia", aponta o especialista, que já dedicou diversas publicações ao conflito das duas Coreias. A consciência de que não seria possível vencer a guerra por meios militares e o esgotamento bélico crescente dos EUA prepararam o caminho para o armistício. Porém este só se tornaria possível com a morte de Stalin, em 5 de março de 1953.
Veteranos dos EUA contra "Guerra Esquecida"
Nos Estados Unidos, foram necessários 40 anos para a Guerra da Coreia retornar à consciência nacional. O catalisador foi a inauguração, em 1982, do Memorial dos Veteranos do Vietnã, erguido na capital Washington por iniciativa privada.
"Depois disso, alguns atores e, mais tarde, também astronautas americanos se reuniram, e em 1995 era inaugurado o Memorial dos Veteranos da Coreia em Washington. Essa era a única guerra a que, até então, não se havia dedicado nenhum monumento."
O website dos veteranos da Guerra da Coreia expressa o quanto eles sofreram, durante décadas, por ver recalcada a memória do conflito que custou a vida de 37 mil soldados dos EUA. No site se lê: "No longer The Forgotten War" (O fim da Guerra Esquecida).
Tábula rasa na Coreia
Para os coreanos, em contrapartida, a guerra está longe de ser esquecida – até hoje. Han-Kyung Lee, de 75 anos, vive desde 1965 na Alemanha. Quando o conflito começou, em 1950, ele era um garoto de 12 anos numa aldeia próxima ao 38º paralelo norte, na atual zona desmilitarizada. "'Guerra esquecida' significaria que ela acabou. Mas a Coreia ainda está em estado de guerra, ela não passou. Por isso, esse nome não serve."
Lee se lembra, acima de tudo, das pesadas ofensivas aérea dos americanos. "Foi terrível, mais do que terrível, eu senti no próprio corpo e alma. De início, nós não sabíamos o que estava acontecendo, quando os bombardeiros B29 nos sobrevoaram e atiraram bombas. Nós, crianças, pensávamos que eram provisões de auxílio ou panfletos."
Civis, mulheres e crianças foram as principais vítimas dos bombardeios em larga escala dos EUA. As cidades maiores, como Pyongyang e Seul, ficaram totalmente arrasadas. Steininger confirma a extensão dos estragos: "Já no fim de 1951 os pilotos americanos se queixavam de que não havia mais alvos na Coreia do Norte, de tão destruído que o país estava".
Paralelo coreano-alemão
O historiador da Universidade de Innsbruck aponta também as significativas consequências da guerra na península asiática para a República Federal da Alemanha. "A decisão dos aliados ocidentais de voltar a armar a Alemanha Ocidental, em dezembro de 1950, nunca teria ocorrido sem a Guerra da Coreia, sem o desastre militar dos americanos, do qual [o então chanceler federal alemão Konrad] Adenauer soube espertamente se aproveitar."
Além disso, a recém fundada república também lucrou economicamente, ressalta Steininger, uma vez que, no contexto da Guerra da Coreia, caíram as últimas restrições impostas à economia alemã.
Após a reunificação das Alemanhas, em 1990, também na Coreia do Sul se discutiu o eventual fim da divisão da nação asiática. Porém, nesse meio tempo, muitos cidadãos sul-coreanos colocaram a ideia de lado. Com boas razões, comenta Steininger. "Caso o sistema norte-coreano entre em colapso, recai sobre a Coreia do Sul uma tarefa gigantesca, incomparavelmente mais pesada da que vivenciamos na Alemanha."