Recebido nesta quarta-feira (02/01) pelo novo ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, em Brasília, o secretário de Estado americano, Mike Pompeo, disse que os Estados Unidos pretendem trabalhar junto com o Brasil contra regimes autoritários.
"Conversamos sobre Cuba, Venezuela, Nicarágua. Esses são lugares onde as pessoas não têm a oportunidade de expressar seus pontos de vista, de falar o que pensam. Esses são o tipo de coisas sobre as quais nós pretendemos trabalhar juntos" disse Pompeo em coletiva de imprensa após o encontro.
"Tivemos a chance hoje também de falar sobre as ameaças que emanam da Venezuela, e sobre nosso profundo desejo de levar a democracia de volta ao povo venezuelano", completou o emissário de Donald Trump.
O novo governo brasileiro se junta a diversos países que consideram antidemocrático o governo Nicolás Maduro, motivo pelo qual o presidente venezuelano não foi convidado para a cerimônia de posse do presidente Jair Bolsonaro, assim como os líderes de Cuba e Nicarágua.
Pompeo disse que o Brasil e os EUA "compartilham valores como a democracia, e isso não acontece em muitos países". "Temos uma oportunidade de trabalhar lado a lado contra os regimes autoritários", afirmou, apesar de muitos observadores temerem ameaças à democracia no Brasil durante o governo Bolsonaro. O americano, porém, disse que, quando os valores são compartilhados, os governos trabalham melhor juntos.
Araújo, por sua vez, disse que ambos tiveram uma "excelente conversa sobre como construir uma parceria mais intensa e muito mais elevada com os Estados Unidos". "Trocamos ideias sobre nossa ideia de mundo, sobre trabalhar juntos pelo bem e por uma ordem internacional diferente, que corresponda aos valores dos nossos povos", ressaltou o ministro.
"Estamos apenas no começo de uma nova etapa que será muito produtiva", disse Araújo. Ele acredita que deverá haver uma cooperação econômica mais aprofundada em áreas como tecnologia, que devera trazer "elementos concretos para criar empregos, novas oportunidades de negócios e iniciativas inovadoras em todos os setores". "Nossa política externa está se realinhando com o povo brasileiro", afirmou.
Segundo o Planalto, Bolsonaro comunicou pessoalmente a Pompeo a intenção de revogar a adesão do Brasil ao pacto global de migrações. Assinado no ano passado por cerca de 160 países, o acordo pretende reforçar a cooperação internacional para uma migração "segura, ordenada e regular".
Desde que foi eleito, Bolsonaro e seu círculo mais próximo levam adiante uma aproximação maior com o governo Trump. Logo em novembro, dois acenos foram feitos: o deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), filho do presidente, esteve nos EUA para se encontrar com importantes figuras do Partido Republicano, como os senadores Marco Rubio e Ted Cruz. Também esteve com Steve Bannon, ideólogo da campanha de Trump, mas hoje afastado do governo.
Além disso, o parlamentar foi fotografado com um boné da campanha para a reeleição de Trump e reafirmou que o Brasil vai levar sua embaixada em Israel para Jerusalém, uma pauta defendida pela bancada evangélica e já executada pelos Estados Unidos.
Já o próprio Bolsonaro recebeu, no Rio de Janeiro, o assessor de segurança nacional da Casa Branca, John Bolton. Um dos artífices da invasão ao Iraque em 2003, Bolton foi recebido por um Bolsonaro empolgado, que prestou continência ao americano. Na pauta, temas importantes da política externa trumpista: Cuba, Venezuela, Israel e China.
Em si, a aproximação com os EUA não é exatamente uma novidade na política externa brasileira. O Brasil faz parte da esfera de influência dos Estados Unidos e, ao longo do tempo, a relação teve momentos de maior ou menor intensidade.
As gestões Vargas (1951-1954), Jânio Quadros (1961) e Lula (2003-2010) ficaram conhecidas por tentativas de independência. Os momentos de maior tensão ocorreram em 1977, quando Geisel (1974-1979) rompeu um acordo militar de 25 anos com Washington, e 1987, quando o Brasil governado por José Sarney (1985-1990) foi alvo de sanções por conta da Política Nacional de Informática. Por sua vez, os governos de Dutra (1946-1951) e Castelo Branco (1964-1967) se notabilizaram por grande proximidade com Washington.
Outros encontros
Além de se reunir com Pompeo, Bolsonaro recebeu outros três líderes internacionais no Palácio do Planalto nesta quarta-feira: Marcelo Rebelo de Sousa, presidente de Portugal, Viktor Orbán, primeiro-ministro da Hungria, e Ji Bingxuan, vice-presidente do Parlamento chinês.
Com o chefe de Estado português, o presidente discutiu temas como a cooperação entre os dois países na área militar, o fortalecimento da Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP) e as comunidades portuguesa no Brasil e brasileira em Portugual.
Rebelo de Sousa defendeu ainda a importância de que seja selado o acordo comercial entre a União Europeia e o Mercosul e afirmou que Portugal tem feito de tudo para facilitar o pacto. Ao comentar sobre o tema em nota, o Planalto disse que o governo de Bolsonaro dará ao bloco sul-americano "o valor que ele merece".
Orbán, por sua vez, defendeu que as relações comerciais entre Brasil e Hungria podem ser muito benéficas para ambas as nações. Bolsonaro falou ainda sobre a "intenção" de assinar um tratado de extradição bilateral com a Hungria e disse ter aceitado o convite do premiê para visitar o país europeu. A data da viagem, contudo, ainda não foi definida.
O último encontro do dia foi com Ji Bingxuan, que elogiou os discursos do presidente brasileiro e da primeira-dama, Michelle, durante a cerimônia de posse na véspera. Durante a reunião, Bolsonaro expressou interesse em ampliar o relacionamento bilateral com Pequim, "independentemente da mudança no contexto político do Brasil e do cenário econômico mundial". A China, liderada por um partido comunista, é o principal parceiro comercial do Brasil.
Secretário de Estado dos EUA discute situação da Venezuela com Bolsonaro¹
O secretário de Estado norte-americano, Mike Pompeo, discutiu a situação da Venezuela com o presidente Jair Bolsonaro e com o novo chanceler brasileiro, Ernesto Araújo, nesta quarta-feira, no contexto do que descreveu como uma frente unificada contra regimes autoritários na América Latina.
Em entrevista a repórteres após se reunir com o chanceler no Itamaraty, Pompeo citou Venezuela, Cuba e Nicarágua como países que não cumprem valores democráticos.
“Temos a oportunidade de trabalharmos juntos um com o outro contra regimes autoritários”, disse o secretário de Estado sobre as relações entre Estados Unidos e Brasil, um dia após a cerimônia de posse do presidente Jair Bolsonaro, com quem Pompeo também se reuniu.
De acordo com informações divulgadas pelo Palácio do Planalto, Bolsonaro reiterou no encontro com Pompeo preocupação com a situação venezuelana e reafirmou o compromisso do Brasil com a estabilidade regional da América do Sul e com a grave situação da Venezuela.
O presidente também comunicou a intenção de revogar a adesão do Brasil ao Pacto Global Sobre Migrações, reafirmando a importância dos Estados Unidos para a inserção internacional do Brasil e sua intenção de trabalhar para que a relação entre os dois países possam se tornar ainda mais benéficas para ambas as partes.
O vice-porta-voz do Departamento de Estado norte-americano, Robert Palladino, disse que Pompeo e o chanceler brasileiro discutiram formas de apoiar os povos de Cuba, Venezuela e Nicarágua para “restaurarem sua governança democrática e os direitos humanos”.
O Ministério das Relações Exteriores da Venezuela respondeu às declarações de Pompeo, e disse em comunicado que “rejeita categoricamente” a “atitude intervencionista” do secretário de Estado norte-americano, acusando-o de buscar arregimentar apoio entre países latino-americanos para forçar uma “mudança de regime” da Venezuela.
Mais de três milhões de venezuelanos deixaram o país da Opep que enfrenta hiperinflação e escassez de alimentos e remédios, a maioria a partir de 2015, de acordo com dados da Organização das Nações Unidas (ONU). Países vizinhos como Brasil e Colômbia têm recebido a maioria dos imigrantes.
Os Estados Unidos impuseram sanções financeiras contra a Venezuela e algumas autoridades do governo socialista do presidente Nicolás Maduro, que Washington acusa de corrupção e violações dos direitos humanos. Maduro frequentemente culpa uma “guerra econômica” liderada pelos EUA pelos problemas do país.
¹com Reuters