O pequeno número de falantes de línguas estratégicas na comunidade de inteligência dos EUA constitui um dos principais desafios que se impõem às forças de segurança dos EUA. As agências tentam reverter o quadro, mas, segundo especialistas e ex-agentes ouvidos pelo iG, ainda estão longe de resolver o problema.
“O treinamento de idiomas e habilidades linguísticas são um tema central para os esforços dos EUA”, afirma Bruce Riedel, ex-agente da CIA (Agência de Inteligência dos EUA) e pesquisador de relações internacionais do Instituto Brookings, em Washington. “Não somos um país que tem facilidade com línguas.”
À época do 11 de Setembro, o FBI possuía apenas oito agentes com domínio de árabe, de acordo com o livro “O Vulto das Torres: A Al-Qaeda e o Caminho até o 11/9”, que rendeu ao jornalista americano Lawrence Wright o Prêmio Pulitzer de não-ficção em 2007. Procurado pela reportagem do iG, o órgão não quis comentar a situação atual.
Robert Baer, ex-agente da CIA e autor de livros como “See no Evil” (“Não Veja Nenhum Mal”, em tradução livre), afirma que o número de agentes fluentes nas línguas necessárias “não chega nem perto do suficiente”. Para ilustrar a situação, Baer cita a comunicação de americanos com afegãos, feita sempre por meio de tradutores. “Essa é uma razão pela qual sempre seremos vistos como ocupantes (no Afeganistão).”
No país asiático, invadido por uma coalizão liderada pelos EUA em outubro de 2001 em retaliação aos ataques do 11 de Setembro, falam-se cerca de 40 idiomas e dialetos, sendo o farsi e o pashtu os mais usados. Essas duas línguas estão entre as nove consideradas críticas pelo FBI para suas investigações. A lista inclui também árabe, chinês, coreano, punjabi, espanhol, urdu e vietnamita.
No site do Escritório do Diretor de Inteligência Nacional (ODNI, na sigla em inglês), que comanda a integração da comunidade de inteligência dos EUA, há uma opção no menu principal intitulada “Educação de Línguas” – em uma mostra da intenção de Washington de conseguir mais profissionais fluentes em línguas estratégicas.
O botão leva a informações sobre instituições de ensino e sobre cinco bolsas de estudo de línguas, com uma delas exigindo como contrapartida a “obrigação de trabalhar para o governo dos EUA por ao menos um ano”.
Apenas cidadãos americanos podem atuar nas agências de inteligência dos EUA. Uma vez naturalizado, um estrangeiro poderá fazer parte desses órgãos. Ele, porém, terá mais dificuldade em conseguir acesso a documentos secretos do que um funcionário nascido nos EUA. Segundo James Robbins, pesquisador sênior de segurança nacional do American Foreign Policy Council (Conselho de Política Externa Americana, em tradução livre), em Washington, essa limitação é o que torna a questão da língua “muito desafiadora”.
Especialista em terrorismo e diretor do Centro de Pesquisas sobre Políticas de Inteligência da Rand Corporation, John Parachini aponta três soluções para o problema. A primeira é aproveitar o potencial da própria população americana, composta por descentes de imigrantes do mundo todo.
“Devemos tentar arregimentar ao máximo essas comunidades para as seções do governo que conduzem operações internacionais – sejam militares, diplomáticas, de inteligência ou de assistência ao desenvolvimento.”
Em segundo está a formação de agentes, que o governo dos EUA vem adotando. A terceira solução é mais estratégica e tem como base a construção de alianças com outros países. “Não devemos achar que precisamos ter cobertura global todo o tempo em todos os lugares, mas, por meio de alianças efetivas, devemos ser capazes de superar alguns dos déficits em conhecimentos de línguas que possamos ter.”
Muçulmanos
Desde o 11 de Setembro, o recrutamento de mais agentes muçulmanos também tem sido uma prioridade para o governo dos EUA, mas “ainda há espaço para melhorar”, diz Riedel.
Segundo Robbins, os muçulmanos contam com oportunidades especiais e são uma classe protegida. “Uma razão para o atirador da Base de Fort Hood, no Texas, Nidal Malik Hasan não ter sido parado antes de cometer seu ato de terrorismo foi porque as autoridades eram cautelosas ao lidar com ele, pois era muçulmano, ainda que claramente instável mentalmente.”
Em novembro de 2009, o major do Exército americano deixou 13 mortos e 29 feridos antes de ser atingido por um tiro na maior base militar dos EUA. Hassan ficou paraplégico e, preso, aguarda julgamento.