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EUA consideraram ciberataque em ofensiva contra a Líbia

Pouco antes do início dos ataques liderados pelos Estados Unidos contra a Líbia, em março, o governo Obama debateu intensamente a possibilidade de abrir a missão com um novo tipo de guerra: uma ofensiva cibernética que buscaria perturbar e até mesmo desabilitar o sistema de defesa aérea do governo de Muamar Kadafi, que ameaçava aviões aliados.

Embora as técnicas exatas permaneçam confidenciais, seu objetivo teria sido o de romper os firewalls das redes de computadores do governo líbio para cortar as comunicações militares e evitar que os radares do país obtivessem informações que seriam então passadas para baterias de mísseis direcionadas a aviões de guerra da Otan.

Mas autoridades do governo e até mesmo alguns oficiais militares recusaram a proposta, temendo que ela poderia estabelecer um precedente para que outras nações, principalmente Rússia e China. Eles também não conseguiram definir se era possível realizar tal ataque em um prazo tão curto e se o presidente tinha o poder de proceder com esse tipo de ataque sem informar o Congresso.

No final, as autoridades americanas rejeitaram a guerra cibernética e usaram aeronaves convencionais, mísseis e aviões não tripulados para atacar os mísseis de defesa aérea e radares usados pelo governo de Muamar Kadafi.

O debate, que aconteceu em um pequeno círculo de conselheiros do presidente, demonstra que as ofensivas cibernéticas são cada vez mais uma forma de guerra. A questão que os Estados Unidos enfrentam é se e quando realmente implementar os ciberataques.

No ano passado, um vírus de computador conhecido como Stuxnet aparentemente exterminou uma parte das centrífugas nucleares do Irã e atrasou sua capacidade de produzir combustível nuclear. Apesar de nenhuma entidade ter admitido ser a fonte do código, algumas evidências sugerem que o vírus tenha sido um projeto coordenado entre Estados Unidos e Israel. Além disso, o Pentágono e empreiteiros militares regularmente repelem ataques a suas redes de computadores – muitos deles provenientes da China e da Rússia.

O governo Obama está acelerando as capacidades digitais do país, enquanto enfatiza publicamente apenas os seus esforços para defender as redes vitais do governo, dos militares e de infra-estrutura pública.

"Nós não queremos ser os primeiros a usar este novo tipo de guerra", disse James Andrew Lewis, membro sênior do Centro para Estudos Estratégicos e Internacionais, onde se especializou em tecnologia e segurança nacional.

Essa relutância teve seu auge durante o planejamento para a primeira ofensiva contra a Líbia e foi repetida em menor escala algumas semanas depois, quando estrategistas militares sugeriram um ataque cibernético muito menor para evitar que os radares paquistaneses percebessem a presença dos helicópteros que transportavam a equipe Seal que atacou e matou Osama bin Laden em 2 de maio.

Mais uma vez, as autoridades decidiram contra essa abordagem. Em vez disso, helicópteros Black Hawk especialmente modificados para evitar radares foram usados para transportar a equipe e um avião não tripulado foi usado para vigilância.

"Essas capacidades cibernéticas ainda são como a Ferrari que você mantém na garagem e só tira para a grande corrida, e não para uma volta pela cidade, a menos que nada mais possa levá-lo aonde quer chegar", disse um oficial do governo Obama informado sobre as discussões.

O debate sobre o potencial de um ataque cibernético contra a Líbia foi descrito por várias autoridades, que falaram sob condição de anonimato por não estarem autorizadas a discutir o assunto.

Nos dias anteriores aos ataques aéreos americanos que visavam derrubar o sistema de defesa aérea da Líbia, um debate mais sério considerou a eficácia militar – e potenciais complicações legais – de se usar ataques cibernéticos para cegar os radares e mísseis do país.

"Eles foram seriamente considerados porque poderiam prejudicar a defesa aérea da Líbia e diminuir o risco para os pilotos, mas simplesmente não deram certo", disse um oficial do Departamento de Defesa. Após uma discussão séria, as propostas foram rejeitadas antes de chegarem ao nível político sênior da Casa Branca.

O General Carter F. Ham, chefe militar do Comando Africano, que liderou a campanha de ataques americanos de duas semanas até que a Otan assumisse o controle total da operação em 31 de março, não quis comentar sobre qualquer proposta de ciberataques. Em uma entrevista, ele disse apenas que "nenhuma capacidade que solicitei me foi negada”.

Oficiais de alto escalão disseram que uma das razões centrais pelas quais a ofensiva cibernética foi rejeitada para a Líbia foi que ela poderia não estar pronta a tempo, já que a cidade rebelde de Benghazi estava prestes a ser invadida por forças do governo.

Embora a ficção popular e os filmes retratem os ciberataques como algo fácil de se implementar – com apenas um computador e algumas teclas – na realidade é preciso espionagem digital no sentido de identificar potenciais pontos de entrada em uma rede de sistemas de comunicação, radares e mísseis como aquela operada pelo governo líbio, apenas depois disso é que é possível escrever e inserir os códigos adequados para o ataque.

"É o equivalente a tatear no escuro até encontrar a maçaneta da porta", disse Lewis. "Leva tempo para encontrar as vulnerabilidades de um sistema. Onde está a coisa que eu possa explorar para afetar a rede?"

Caso o ataque tivesse sido implementado, autoridades do governo americano estavam confiantes de que ele poderia ter sido confinado à rede líbia e que oferecia a promessa de prejudicar o sistema de defesa aérea integrado do regime de Kadafi.

Uma das preocupações não solucionadas foi a possibilidade de um ataque cibernético contra a Líbia criar restrições legais domésticas sobre as guerras pelo Poder Executivo sem a permissão do Congresso. Uma das perguntas era se a Resolução dos Poderes de Guerra – que exige que o executivo emita um relatório formal aos legisladores quando introduz forças em "hostilidades" e estabelece um limite de 60 dias para tais implantações caso o Congresso não autorize a sua continuidade – seria necessária para um ataque realizado no ciberespaço.

A Resolução dos Poderes de Guerra, uma lei da era do Vietnã promulgada sobre o veto do presidente Richard M. Nixon, não define "hostilidades". Ao descrever suas ações ao Congresso e ao povo dos Estados Unidos, a Casa Branca argumentou que o uso de forças convencionais na intervenção realizada na Líbia ficou aquém do nível de hostilidade que requer permissão do Congresso, quer sob a Constituição ou sob essa resolução, citando a falta de forças terrestres e o papel de apoio representado pelos Estados Unidos em um esforço multilateral para cumprir uma resolução da ONU. Algumas autoridades também expressaram preocupação quanto a revelar capacidades tecnológicas americanas aos inimigos em potencial no que parecia ser uma ameaça pequena à segurança dos Estados Unidos.

No final, a rede de defesa aérea da Líbia era perigosa, mas não excepcionalmente robusta. A vigilância dos Estados Unidos identificou suas posições e ela foi destruída em ataques convencionais.

Por Eric Schmitt e Thom Shanker

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