Ainda é cedo para vaticinar se os esforços da diplomacia brasileira obterão o sucesso desejável, mas parece certo que as gestões do governo Dilma Rousseff realizadas após a morte do ex-presidente venezuelano Hugo Chávez, no início de março, convergem com as necessidades das empresas nacionais que atuam no país vizinho.
Num momento em que a Venezuela enfrenta incertezas econômicas e políticas, o Brasil estende a mão para o presidente interino Nicolás Maduro, ex-vice e provável sucessor de Hugo Chávez. A eleição presidencial no país vizinho está agendada para o dia 14 de abril. Em paralelo, o Palácio do Planalto e o Itamaraty trabalham para dar segurança jurídica ao comércio bilateral e aos investimentos brasileiros em território venezuelano.
É algo que se faz necessário: os interesses do Brasil na Venezuela não são nada desprezíveis. O país garante à balança comercial brasileira seu terceiro maior superávit. Na prática, apressam-se em dizer autoridades do governo Dilma, trata-se do segundo melhor resultado para o comércio exterior brasileiro, depois apenas da China.
Isso porque a Holanda serve de porta de entrada para produtos destinados a diversos países europeus. Em 2012, o superávit comercial foi de US$ 4,05 bilhões em favor do Brasil, resultado de US$ 5,06 bilhões em exportações e US$ 996,8 milhões em importações. Há que se ressaltar ainda a presença de construtoras brasileiras e os interesses da Petrobras na Venezuela.
Como noticiou o Valor nos últimos dias, o Brasil trabalha para evitar atrasos na efetivação da adesão da Venezuela ao Mercosul. Na avaliação do governo Dilma, o bloco garante a segurança institucional necessária às empresas brasileiras que mantêm negócios na Venezuela. Apesar do anúncio feito no ano passado da entrada do país no Mercosul, diplomatas de Brasil, Argentina, Uruguai e Venezuela ainda acertam detalhes para que o país de Nicolás Maduro adote as normas e nomenclaturas comuns, a Tarifa Externa Comum (TEC) e passe a fazer contribuições financeiras às instituições do Mercosul.
Por outro lado, em sua efêmera passagem pela Venezuela durante as homenagens ao ex-presidente Hugo Chávez, Dilma propôs ao governo venezuelano ajuda em ações contra o desabastecimento e a violência e na atração de investimentos. As parcerias seguiriam um caminho de cooperação já aberto, por exemplo, pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), pela Caixa Econômica Federal e a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa). Essas instituições mantêm escritórios na Venezuela.
Mas o aceno demonstra a ciência, por parte do governo brasileiro, dos problemas a serem enfrentados pelo próximo governo na Venezuela. O próprio Nicolás Maduro já reconheceu em seus mais recentes discursos que é preciso combater a insegurança pública e a corrupção, além de melhorar o sistema de saúde do país. Em Caracas, sobram também relatos de que, embora não seja generalizado, o desabastecimento de alguns produtos perdura.
Não bastasse, o país vizinho é considerado um dos piores locais do mundo para fazer negócios. Segundo o Banco Mundial, lá os investidores encontram dificuldades para lidar com a burocracia, obter energia elétrica e crédito e manter negócios com outros mercados a partir do solo venezuelano. A conclusão não surpreende quando se fala de um país onde o Estado exerce um rígido controle sobre o câmbio, a inflação pode chegar a 30% em 2013 e há histórico de desapropriações de ativos privados.
Nas relações bilaterais entre o Brasil de Luiz Inácio Lula da Silva e a Venezuela de Hugo Chávez, os dois países partilhavam o sonho de intensificar a integração regional e decidiram levar adiante empreendimentos em comum – sempre de forma personalista e muitas vezes fruto de acertos verbais entre os dois presidentes. Uma prova do risco de tal modo de operação é verificada nas dificuldades enfrentadas pelo Brasil com a Refinaria Abreu e Lima.
Longe de renegar o que herdou de seu antecessor, a presidente Dilma Rousseff está disposta a dar prosseguimento a essas iniciativas. Mas quer que a estabilidade da relação seja fruto de acertos com "papel passado", o que tende a beneficiar também os filhotes desse relacionamento na iniciativa privada.