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Depois de Bin Laden

Na semana passada, o coordenador de contraterrorismo do Departamento de Estado americano, Daniel Benjamin, fez uma conferência sobre a Al-Qaeda. O seu texto continha 4 mil palavras. Nenhuma delas era Osama. A ausência clamorosa do nome antecipou o que especialistas em todo o mundo passaram a dizer em uníssono desde o anúncio da morte de Bin Laden. O fundador, mentor e inconfundível fisionomia do movimento terrorista islâmico – que matou muito mais muçulmanos do que fiéis de qualquer outra religião – há anos perdera os meios de comandar efetivamente as ações de seus seguidores. Já ao seu lugar-tenente, o médico egípcio Ayman al Zawahiri, faltariam autoridade e experiência.

A organização, por sua vez, como já se sabia de longa data, havia se fragmentado em unidades com alto grau de autonomia – "franquias", na expressão corrente – espalhadas pelo Norte da África, Península Arábica, notadamente no Iêmen, e na Somália, na margem ocidental do Golfo de Aden, sob a liderança de Osamas regionais. Os mais conhecidos são Nasser al-Wuhayshi, o ex-secretário de Bin Laden que fugiu do Afeganistão e integrou os jihadistas da Arábia Saudita e Iêmen, e o seu aliado Anwar al-Awlaki, o clérigo radical nascido nos Estados Unidos e acusado de ser um importante recrutador de quadros suicidas (entre eles o nigeriano que, no Natal de 2009, tentou explodir o avião em que viajava de Amsterdã para Detroit).

A dispersão da Al-Qaeda é um complicador para os serviços de segurança. "É cada vez mais difícil saber dos planos dos militantes dessas células menores", reconheceu uma autoridade do setor citada pelo Wall Street Journal. A dificuldade imediata é estimar de onde poderá vir a tentativa de vingança pela morte de Bin Laden que Washington dá como certa. Especula-se que, graças às ligações da matriz terrorista com setores do governo paquistanês – o que o domicílio de Osama numa militarizada cidade do país, a uma centena de quilômetros da capital Islamabad, deixou escancarado -, talvez ela disponha de meios inacessíveis às filiais independentes na África e na Arábia para provocar uma tragédia em um país do Ocidente.

Em maio passado, aliás, por pouco um paquistanês naturalizado americano, que se converteu ao fundamentalismo e foi treinado na sua terra natal, não conseguiu explodir um carro-bomba em plena Times Square. Como no caso do nigeriano, a tragédia só não se consumou por falha do perpetrador, não por ter sido ele impedido, demonstrando pela enésima vez que é humanamente impossível "erradicar" o terrorismo, na bazófia do então presidente George Bush ao declarar guerra ao terror em seguida ao 11 de Setembro. O que se procura, em qualquer parte do mundo, é reduzir ao mínimo as possibilidades de ocorrência de atentados, mediante ações coordenadas de inteligência, vigilância em torno de alvos prováveis – e transformações sociais nos países vulneráveis à pregação homicida.

Ainda que os jihadistas consigam dar o seu troco, ou que um culto a Bin Laden revigore o ânimo dos fanáticos, continuará sendo um erro monumental adotar o conceito de "guerra" no combate ao extremismo islâmico. A esta altura, a invasão do Iraque – para a qual esse foi um dos pretextos – já deveria ter ensinado algo a figuras como a secretária de Estado Hillary Clinton, que voltou a usar a infausta expressão ao falar do fim de Osama. E, se o Iraque não bastasse, há o atoleiro de 10 anos em que imergiram os aliados ocidentais no Afeganistão, seguindo a miragem de construir ali um Estado funcional que acabe com a ameaça (local) do Taleban. Enquanto isso, no vizinho Paquistão, a Al-Qaeda matou 30 mil civis e 5 mil soldados e policiais.

Não foi a guerra ao terror que reduziu as simpatias por Bin Laden no país de 46% em 2003 a 18% no ano passado. Ou de 56% a 13% na Jordânia, no mesmo período. Ou de 19% para 1% no Líbano. E tampouco foi a guerra ao terror que apartou por completo da Al-Qaeda e congêneres os movimentos pela democracia que transfiguram o mundo árabe. A política americana para a região não pode se pautar pelo contraterrorismo.

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