Análise Especial para DefesaNet
Os próximos jogos olímpicos de inverno, sediados em PyeongChang, serão disputados em fevereiro de 2018 na Coreia do Sul, país que se encontra tecnicamente em guerra com a Coreia do Norte desde que foi invadido em 25 de junho de 1950. Depois de um conflito sangrento, que envolveu os Estados Unidos e a República Popular da China, a paz na península chegou por meio de um armistício, uma espécie de trégua, firmado em 27 de julho de 1953.
A situação, que era instável, agravou-se pelo projeto do líder norte-coreano, Kim Jong-Un, de equipar as forças armadas de seu país com mísseis balísticos armados com ogivas nucleares capazes, inclusive, de atingir território da América do Norte. Trata-se de uma ameaça que o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, não poderia ignorar. No momento, os dois trocam acusações e ameaças pelo noticiário e pelo Twitter.
Os países europeus levaram com seriedade a retórica agressiva e já se preparam planos de retirada de suas delegações no caso de início das hostilidades. A ministra de Esportes da França, Laura Flessel, esgrimista dona de cinco medalhas olímpicas (duas de ouro, uma de prata e duas de bronze), inclusive aventou a possibilidade de não enviar um time para os jogos de PyeongChang.
Experiência única
Com base neste quadro instável, surge uma oportunidade de o Itamaraty retomar o protagonismo que sempre lhe caracterizou e que foi perdido durante a passagem do senador José Serra pela chancelaria brasileira. Ao contrário de seu antecessor, o atual ministro, Aloysio Nunes, sempre mostrou interesse pela diplomacia e, antes de assumir a pasta, caracterizou-se como um dos integrantes mais ativos da Comissão de Relações Exteriores do Senado.
Desde que assumiu, ele executou uma agenda de resultados , que trouxe novos investimentos e abriu possibilidades de parcerias tecnológicas e comerciais (leia mais em http://www.defesanet.com.br/pr/noticia/27727/Governo-Temer—Conquistas-Diplomaticas/), mas sem pretensões de liderança do subcontinente e das nações do Terceiro Mundo na África e na Ásia. Como os Jogos Olímpicos de Inverno de PyeongChang poderiam servir como ponto de virada? Por meio de uma coordenação brasileira nos esforços de segurança sulamericanos.
A segurança foi um dos pontos positivos dos Jogos Olímpicos de Verão, realizados no Rio de Janeiro em 2016. O governo brasileiro, por meio dos ministérios da Defesa e da Justiça, desenvolveu uma tecnologia avançada de operações conjuntas, um trunfo que poderia ajudar na proteção e na retirada das delegações latino-americanas em caso de deflagração das hostilidades entre a Coreia do Norte e os Estados Unidos. Caberia ao Itamaraty capitalizar o bom trabalho estendendo a experiência aos países vizinhos.
Personalidades complexas
O risco de um conflito militar, se depender da retórica de Kim Jong-un, seria reduzido. Ele sempre ressaltou que não pretende disparar o primeiro tiro, mas a personalidade de seu adversário, Donald Trump, amplia os riscos de guerra. O chefe de Estado norte-americano não integra o status quo político. É um empresário que ampliou sua popularidade por meio de realities shows na TV aberta do seu país. Possui uma visão maniqueísta e sem sutilezas da área de relações internacionais. Em suas mensagens pelo Twitter deixa claro seu desejo de acabar, usando todos os meios possíveis, com o programa nuclear nortecoreano.
A decisão de Kim Jong-un, é lógica dentro de uma perspectiva de sobrevivência do regime, uma dinastia quase monárquica disfarçada de socialismo que chega à terceira geração. Nos últimos 20 anos, seguidas intervenções dos Estados Unidos e da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) trouxeram o caos ao Iraque, à Líbia e à Síria, países que abriram a mão de armas de destruição em massa em busca de uma relação mais intensa com o ocidente.
A execução do líder iraquiano, Saddam Hussein, e o linchamento de Muammar Al-Gaddafi na cidade de Sirte, além do não-cumprimento do acordo Átomos pela Paz firmado em 1994 com o então presidente norte-americano Bill Clinton (leia mais em http://www.defesanet.com.br/nuclear/noticia/26210/Leonam—Atomos-para-a-Paz-na-Coreia/), incentivaram o governo de Pyongyang a desenvolver seu arsenal nuclear. O regime aposta em uma solução à paquistanesa ou indiana, com o reconhecimento do país como potência atômica e a assinatura de um acordo de paz definitivo.
Para o Brasil, este quadro complexo pode ajudar o país a ocupar, mais uma vez, papel de destaque na diplomacia do subcontinente, muito acima dos eventuais ganhos de imagem que nossa pequena delegação, com pouca experiência em esportes de inverno, irá obter.