O Brasil é o maior devedor da Convenção da ONU para Armas Biológicas e Tóxicas, que proíbe o uso desses armamentos e tenta dissuadir governos a recorrer a ataques químicos ou biológicos. Dados obtidos pelo Estado revelam que o Brasil devia US$ 298,4 mil ao organismo. O governo brasileiro também é o maior devedor para todas as iniciativas de desarmamento da ONU, com uma dívida de US$ 550 mil.
Há duas semanas, quando um ataque químico foi registrado na Síria, o Itamaraty apressou-se em condená-lo. “O Brasil reitera sua veemente condenação ao uso de armas químicas, sob quaisquer circunstâncias”, indicou o comunicado da chancelaria.
Nos bastidores, a situação é outra. Em 21 de março, os governos do Reino Unido, Rússia e EUA enviaram uma carta aos demais países alertando que a Convenção de Armas Biológicas e Tóxicas vivia uma situação urgente. “Fomos informados que diante da situação financeira, os funcionários terão seus contratos mantidos até o final de abril de 2017. Pedimos, portanto, a todos os países que paguem suas contribuições”, alertaram.
“Sem uma solução, as estruturas e decisões tomadas estarão ameaçadas”, disse. A falta de dinheiro pode ainda afetar a próxima reunião, marcada para dezembro de 2017. Os governos não excluem a possibilidade de um cancelamento.
No total, o déficit registrado pela Convenção era de US$ 379 mil, de um orçamento previsto para US$ 1,1 milhão em 2017. Do total desse buraco, o Brasil representa 78% da dívida, quatro vezes mais que o segundo colocado, o Japão.
A crise forçou alguns países a pagar mais que o acordo estabelecido para garantir que o mecanismo continuasse funcionando. No caso dos EUA, a contribuição acima de sua obrigação foi de US$ 249 mil, 77% acima do exigido. O mesmo foi feito pela Arábia Saudita.
Mas o calote brasileiro não se limita a uma das convenções. No total, o País deve mais de US$ 550 mil para todas as iniciativas de desarmamento da ONU.
Ao todo, a dívida do Brasil chegou a ser de mais de US$ 3 bilhões com as entidades internacionais ao final do governo de Dilma Rousseff. José Serra, então chanceler do governo Michel Temer, prometeu resolver a crise. Mas isso tampouco ocorreu.
No que se refere às Armas Biológicas, o Brasil repetidamente vem dando um desfalque desde 2012. No caso da Convenção de Armas Convencionais, a dívida do governo brasileiro persiste desde 2011.
Desde 2010, a dívida acumula-se também na Convenção Anti-Minas, em um total de US$ 91 mil. O Estado apurou que, em algumas secretarias, circulou a ideia no ano passado de suspender a contratação de novos funcionários brasileiros enquanto as contas não fossem pagas.
Resposta. Ao Estado, o Itamaraty indicou que uma resposta em relação à dívida não caberia à chancelaria e um grupo foi criado em 2015 para lidar com as contribuições atrasadas do Brasil na ONU. “A respeito do pagamento de contribuições brasileiras junto a organismos internacionais deve ser consultada a Comissão Interministerial de Participação em Organismos Internacionais (Cipoi), com Secretaria-Executiva no Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão”, indicou.
Procurado, o Ministério do Planejamento afirmou que apenas tinhas dados até 2014. "Com relação à Convenção sobre a Proibição do Desenvolvimento, Produção e Estocagem de Armas Bacteriológicas (Biológicas) e a Base de Toxinas e sua Destruição (CPAB), as informações disponíveis indicam que o País possui pagamentos atrasados da ordem de US$ 164,9 mil, que contemplam até o ano de 2014", indicou. "O Ministério do Planejamento não possui registro de informações sobre as contribuições de 2015 a 2017", explicou.
Ainda assim, o governo garante que pagará suas dívidas. "A estratégia de regularização desses pagamentos se insere na programação orçamentária de 2017, onde existe previsão de recursos", completou.