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Ausência de Chávez não será o fim do chavismo, dizem analistas

Claudia Jardim

A eventual ausência em definitivo do presidente da Venezuela, Hugo Chávez, não representará o fim do chavismo, na avaliação de analistas ouvidos pela BBC Brasil. Segundo eles, o movimento político continuará enquanto durar a unidade de seus líderes restantes, mesmo sem a presença de seu fundador.

Críticos de Chávez o acusam de adotar um estilo excessivamente centralizador e de não ter construído uma liderança alternativa ao longo de seus 14 anos no poder, capaz de dar continuidade ao projeto da revolução bolivariana. Esse perfil, acreditam eles, teria criado uma espécie de "Chávez-dependência" que gera dúvidas sobre o futuro do governo sem Chávez no comando.

"Aqueles que sonham que depois de Chávez não há chavismo tomarão um banho de água fria quando se depararem com a realidade", afirmou à BBC Brasil o ex-ministro Jesse Chacón.

Segundo ele, se Chávez tiver que se afastar da vida pública, o chavismo terá por "necessidade" que formar uma liderança coletiva. "Por uma simples razão: na geração dirigente não há quem aglutine tudo o que é Chávez. Não há ninguém capaz disso, nem dentro, nem fora do chavismo."

A historiadora Margarita López Maya também prevê, no início, uma união pragmática dos chavistas, sem a qual existe o risco do movimento chegar ao fim.

"Se se dividem agora, sabem que irão afundar”, disse Maya. Porém, ela acredita que os líderes “mais cedo ou mais tarde entrarão em um processo de fratura a médio e longo prazo."

Trio do poder

A discussão sobre o futuro da Venezuela sem Chávez era assunto vetado entre os dirigentes e a base chavista há pouco mais de dois anos. Aquele que ousava criticar a "onipresença" do presidente podia ser acusado de "contrarrevolucionário" e ser expulso de qualquer assembleia ou discussão.
 

Chávez é considerado a única figura capaz de unificar as diferentes correntes e movimentos sociais que compõem o chavismo. Sem ele, a tendência de disputas internas é eminente.

Antecipando a tensão interna, antes de viajar a Cuba para submeter-se à sua quarta cirurgia para combater um câncer na região pélvica, Chávez deixou uma espécie de testamento político e indicou seu vice-presidente, Nicolás Maduro, como eventual sucessor na liderança chavista. A decisão, no entanto, não dá absoluta autonomia a Maduro.

O trio que compõe a cúpula da direção chavista não trabalha, por enquanto, de maneira separada. Maduro, cuja força política vem de sua origem sindical, precisa do presidente da Assembleia, Diosdado Cabello, o número dois no triângulo de poder, para dialogar com os militares – um dos pilares de sustentação do chavismo.

Ambos, no entanto, necessitam do pouco carismático ministro de Energia e Petróleo, Rafael Ramirez, o número três do triângulo. Ramirez é conhecido popularmente como o "dono do talão de cheques" por controlar a estatal petroleira PDVSA, coração da economia do país.

Nas últimas semanas, dirigentes políticos opositores e os meios de comunicação privados vinham alimentando informações sobre uma suposta divisão entre Maduro e Cabello. Para responder aos rumores, os dois chegaram a se abraçar em duas diferentes manifestações públicas, para baixar a tensão na base chavista que, por enquanto, só confia em Chávez.

"Dizem que Diosdado e eu estamos nos matando (…) Estamos nos matando de lealdade a Chávez e à pátria", disse Maduro, ao abraçar a Cabello.

O presidente venezuelano permanece hospitalizado em Cuba após sofrer complicações em sua quarta cirurgia. De acordo com o governo, a infecção respiratória que enfrenta está controlada, porém a insuficiência respiratória persiste.

Há mais de um mês Chávez não é visto ou ouvido em público, fator que aumenta a tensão no país sobre o futuro da Presidência e as consequências de uma eventual era pós-Chavez.

Mito

Outro desafio para o chavismo como movimento é a herança carismática de Chávez. Sua simbologia tende a fortalecer o governo e sua carga emotiva, porém, isso também tende a ser uma "carga pesada" para aquele que pretenda ocupar seu lugar na liderança política do chavismo.
 

"É um dos personagens mais importantes e significativos dos últimos cinquenta anos. Há poucos com seu calibre. No contexto latino-americano, é o mais interessante desde Fidel Castro", afirmou o historiador britânico Richard Gott, especialista em América Latina, autor do livro À Sombra do Libertador – Hugo Chávez Frias e a transformação da Venezuela.

Para Gott, sem Chávez, a Venezuela entrará em um período de "normalização". "Será um país normal, sem tanta projeção, sem um líder carismático", afirmou.

Especialistas ouvidos pela BBC Brasil, tanto simpatizantes como críticos à revolução bolivariana, concordam com a definição do Chavismo como um movimento histórico, de bases populares, que tem como pilares ideológicos "o socialismo, o anti-imperialismo, a justiça social, soberania nacional e integração latino-americana".

Para além dos termos conceituais, na opinião do analista político Oscar Schemel, da Consultoria Hinterlaces, "o chavismo se constitui em uma unidade emocional, numa identidade de classe e em uma nova cultura político popular", afirmou Schemel.

Desde que foi diagnosticado com câncer, a figura política de Chávez como mito passou a se fortalecer.

Dezenas de missas, cultos, rituais indígenas e de santería (culto afro local) são realizadas diariamente em nome da recuperação da saúde do presidente.

Nas ruas, velhos e novos grafites com a imagem de Chávez disputam espaço nos muros da capital. Em algumas casas, a foto do "comandante" está colocada em um altar, sempre acompanhado de uma vela.

"Ele (Chávez) nunca vai morrer. Mesmo se não estiver mais aqui, seu pensamento nunca morrerá", disse uma simpatizante, durante manifestação de apoio ao presidente.

 

 

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