Search
Close this search box.

Ataque a Wielun marcou início da 2ª Guerra

"As sirenes de alarme me acordaram do sono profundo. No início, eu não sabia o que era. Saltei da cama, vi os meus pais na varanda. Minha mãe disse ao meu pai que provavelmente era um teste. Meu pai concordou, mas se admirou que fosse tão cedo", conta Jan Tyszler, nascido em 1933, em entrevista à Deutsche Welle. Logo depois as bombas começaram a cair.

Tyszler recorda que no fim de agosto de 1939 "a guerra já estava no ar" e que se falava constantemente dela. Mas ninguém pensava que sua cidade fosse o primeiro alvo da Luftwaffe, a Força Aérea alemã.

Em 1939, Wielun, a pouco mais de 200 quilômetros de Varsóvia, ficava a apenas 20 quilômetros da fronteira alemã. Sem cruzamentos de trânsito, sem ponte para defender, não tinha praticamente qualquer importância estratégica. Por isso havia apenas alguns soldados poloneses estacionados.

"Já com as primeiras bombas, fugimos para o quintal ao lado, onde meu pai, que era serralheiro, tinha uma oficina de mecânico. Ficamos lá, sentados, tremendo, na vala onde se checa os carros por baixo. À tarde, éramos os únicos que ainda tinham a casa em pé. Todos os outros prédios haviam virado ruínas." A família, como quase todos os sobreviventes, deixou a cidade no mesmo dia. Quando a Wehrmacht (Forças Armadas nazistas) marchou sobre a cidade, Wielun tinha apenas algumas centenas de moradores.
 

O ataque aéreo perpetrado por 87 bombardeiros foi comandado por Wolfram von Richthofen. Em abril de 1937, como chefe do Estado-Maior da Legião Condor, ele fora corresponsável pela destruição da cidade basca de Guernica, em que milhares de civis perderam a vida.

Em Wielun, ele teve mais uma oportunidade para aplicar o assim chamado "bombardeio de saturação" ou "de área", na época uma nova tática, em que se considerava aceitável haver vítimas civis, como parte da guerra. Von Richthofen não arriscava nenhuma perda entre os nazistas, pois não se esperava resistência na pequena cidade quase sem militares.

Wielun foi palco do primeiro crime de guerra da Segunda Guerra Mundial. Em vários bombardeios entre 4h35 e 14h, foram destruídos 70% da cidade, e 1.200 dos 16 mil habitantes perderam a vida.

O ataque à Polônia foi precedido de várias ações fictícias, com as quais a máquina de propaganda do Terceiro Reich quis fabricar motivos para uma guerra. Uma das provocações mais conhecidas foi o assalto à emissora alemã em Gliwici, perto da fronteira polonesa. Na tarde de 31 de agosto de 1939, alguns homens da SS, a tropa de elite do regime nazista, chegaram à emissora armados e em trajes civis, para transmitir que a emissora havia sido ocupada por poloneses do Terceiro Reich.

Outros veículos de comunicação alemães noticiaram a existência de rebeldes poloneses em solo alemão, supostamente apoiados pelo Exército polonês. Assim, Hitler tentava mobilizar seus soldados e retratar os alemães como vítimas.

Ataque à península de Westerplatte

Dez minutos depois do primeiro ataque aéreo a Wielun, seguiu-se a ofensiva à península de Westerplatte, em Gdansk, onde poloneses e alemães viviam numa relação tensa. Habitada predominantemente por alemães, Gdansk foi declarada cidade livre no Tratado de Versalhes, após a Primeira Guerra Mundial, estando, assim, fora do controle do Reich alemão. O porto, a alfândega e o transporte ferroviário estavam sob administração polonesa. Na estância balneária de Westerplatte, a Polônia tinha um depósito de munições guardado por militares.

Em 1º de setembro de 1939, dez minutos após o primeiro bombardeio contra Wielun, os alemães atacaram o depósito de munições. A agressão pelo navio de guerra alemão Schleswig-Holstein foi seguida pela do SS-Heimwehr Danzig, assim como por ataques aéreos. A ofensiva durou uma semana. Enquanto o número de vítimas no lado alemão é estimado em 3.400, houve apenas 15 mortos do lado polonês.

Na Polônia, ainda hoje a defesa da Westerplatte é reverenciada como um símbolo do heroísmo polonês na Segunda Guerra Mundial, tendo em conta a superioridade militar esmagadora do adversário. Há décadas, os alunos das escolas da Polônia aprendem que os alemães bateram continência aos soldados poloneses quando tiveram de abandonar Westerplatte após a rendição, em respeito à luta incrivelmente corajosa.

Memória de Wielun

Os ataques a Gdansk e Westerplatte são considerados o início da Segunda Guerra Mundial. Lá, em 2009, Vladimir Putin e Angela Merkel lembraram os 70 anos do começo do conflito. O então presidente polonês, Lech Kaczynski, que pouco antes protestara veementemente contra a invasão russa da Geórgia, aproveitou a presença do convidado russo para alertar sobre o renascimento de "tendências neoimperialistas".

Dar acentos atuais a comemorações históricas faz parte da política do partido governista polonês Lei e Justiça (PiS). O fato de em 2019 o presidente e seu governo não se deslocarem para Gdansk na manhã de 1º de setembro, mas sim para Wielun – onde se encontrarão com Frank-Walter Steinmeier, o presidente da Alemanha – não é o resultado de uma redescoberta da história. Esta, aliás, é a primeira vez que um chefe de Estado alemão é convidado à cerimônia em Wielun.
 

Gdansk é um dos últimos bastiões da oposição na Polônia, por isso as solenidades deverão ser fortemente influenciadas pelos políticos oposicionistas. A península de Westerplatte em si é um tema controverso entre o PiS e a maioria liberal da prefeitura, porque o partido integrou o local histórico ao  Museu da Segunda Guerra Mundial

 de Gdansk, para torná-lo um instrumento adicional na luta para conscientizar os poloneses de sua história.

O clima político na cidade não é dos mais amenos. Seus habitantes ainda estão em choque pelo assassinato do prefeito liberal Pawel Adamowicz no início de 2019. O PiS não pode contar com "concessões" na cosmopolita Gdansk.

Uma vez que os 80 anos da eclosão da guerra acontecem em plena campanha eleitoral pelas eleições parlamentares de outubro, o PiS não quer perder o controle sobre a solenidade. De Wielun, as autoridades viajarão a Varsóvia para se encontrar com o presidente dos EUA, Donald Trump, e assim salientar mais um aspecto: a importância das relações transatlânticas para a Polônia.

Todos os anos, no amanhecer do dia 1º de setembro, os habitantes de Wielun são acordados por sirenes de alarme que lembram os ataques aéreos de 80 anos atrás. Jan Tyszler, que em 1939 tinha seis anos e teve de fugir das bombas em vez de ir à escola, está lá todos os anos. Também em 2019 ele pretende regressar à cidade natal e visitar a casa em que viveu, que ainda continua de pé.

"Quero que ouçamos sempre essas sirenes de alarme simbólicas, e nunca mais as sirenes de verdade", diz o aposentado de 86 anos. Para ele, a visita de um presidente alemão a Wielun é um gesto que já deveria ter acontecido há muito tempo.

 

 

 

Compartilhar:

Leia também
Últimas Notícias

Inscreva-se na nossa newsletter