Por Pyotr Romanov – Texto do Moscow Times
Tradução, adaptação e edição – Nicholle Murmel
Atolados em neve até os joelhos e castigados por golpes de vento gelado, políticos estão preocupados com o que eles creem ser um debate relevante: decidir se, de fato, está acontecendo uma nova Guerra Fria. “Faltam os componentes de uma Guerra Fria”, delcarou o ministro das Relações Exteriores russo, Sergei Lavrov e uma triste tentativa de negar os ataques diplomáticos, políticos e econômicos do Ocidente contra Moscou.
Também ignorando deliberadamente o impacto que as contra-sanções da Rússia causaram na economia da Itália e vários outros países europeus, o ministro das Relações Exteriores italiano, Paolo Gentiloni falou no subjuntivo para sugerir que uma nova Guerra Fria “seria um absoluto desastre”.
A Rússia e o Ocidente estão engajados em um conflito de informação e propaganda. Sanções mútuas foram impostas. Ambos os lados aumentaram dramaticamente a frequência dos exercícios militares. Em um retorno ao passado, a Rússia exibe seu equipamento militar mais moderno durante as comemorações do Dia da Vitória e o Ocidente reforça suas fronteiras no leste com presença militar pesada.
A European Leadership Network (ELN) – uma ONG britânica composta por vários militares da reserve de toda Europa – publicou um relatório com o título "Preparing for the Worst: Are Russian and NATO Military Exercises Making War in Europe more Likely?" (“Preparando-se para o pior: os exercícios militares da Rússia e da OTAN tornam mais provável a guerra na Europa?”, em tradução livre). A ELN responde à própria pergunta dizendo que sim, ambos os lados estão de preprando para um confronto de escala total. Isso soa familiar? Houve uma época em que ambas as partes publicavam relatórios nesse estilo regularmente.
Os acontecimentos recentes na Ucrânia são quase um replay dos conflitos da primeira Guerra Fria. Poucas pessoas agora lembram, mas a lição mais importante que os Estados Unidos e a União Soviética aprenderam coma Guerra da Coreia em 1953 foi que duas potências podiam empatar em um confronto maior por causa de uma guerra regional.
No fim das contas, na era nuclear, ambos os lados podiam dividir o mundo e definir suas relações de uma forma que garantisse segurança mútua. Várias crises globais – incluíndo a crise dos mísseis de Cuba em 1962 – somadas ao crescimento rápido da capacidade nuclear soviética, gravaram essa noção na mente dos políticos americanos e russos. Afinal, por que arriscar um conflito direto?
O Ocidente e a URSS sempre brigaram através de guerras indiretas envolvendo tropas de outras nações. Moscou e Washington nunca se enfrentaram no Oriente Médio, Ásia, América do Sul ou África. Eles apenas ajudaram seus aliados-marionetes com dinheiro, armas, consultoria militar e, é claro, “recomendações” impossíveis de serem recusadas pela maioria dos governos. A Ucrânia é o primeiro confronto de segunda mão nessa nova onda que pode se tronar toda uma nova série de conflitos nessa continuação da Guerra Fria.
Ambas as partes provavelmente vão usar chantagem atômica dessa vez também, apesar de ser quase certo que as tensões não vão escalar ao ponto de acontecerem ataques reais. Porém, esse “quase” tem um perigo considerável. Como a História nos mostra, o risco de falha humana ou técnica aumenta sempre que a situação se agrava. Sendo assim, não é inteligente enterrarmos nossas cabeças na terra e negar o fato óbvio de que o estado atual das coisas é muito sério e perigoso. É melhor enfrentar a verdade do que se refugiar em ilusões.
Aqueles que não querem admitir que essa Guerra Fria renovada existe argumentam que os dois lados têm diferenças ideológicas irreconciliáveis assim como o Ocidente e o bloco socialista tinham no passado. É verdade. Porém, o livre mercado e a democracia estão em estágios diferentes de desenvolvimento na Rússia e no Ocidente, e só isso já cria bastante tensão. O perigo imediato agora está enraizado no passado mais distante.
É claro que fatores ideológicos, políticos econômicos e muitos outros são importantes, pois impulsionam ou travam a evolução de um país. Mas sob uma perspectiva histórica ao longo dos séculos, a consideração mais importante é a posição em que Pedro, o Grande, colocou a Rússia durante seu reinado.
É essa posição que mais define o potencial do país ainda hoje – e não a autocracia dos czares, o plano de Estado soviético ou o livre mercado de Vladimir Putin. E porque o “urso russo” não alterou sua área de influência na última década, nem encolheu para o tamanho de um esquilo ou concordou em se tornar bicho de estimação do Ocidente como aconteceu durante o governo de Boris Yeltsin – chegando até mesmo a criticar abertamente o Ocidente a começar pelo discurso de Putin em Munique em 2007 – a desconfiança em relação a Moscou só cresceu.
Claro, alguns podem argumentar que o medo dos políticos ocidentais é exagerado, já que a Rússia já é assolada por seus próprios problemas: índices demográficos negativos, corrupção generalizada e uma “democracia soberana” que só atrasa seu desenvolvimento. Porém, a História dá algum fundamento para as “suspeitas desagradáveis”. Quem garante que a Rússia pós-URSS não irá surpreender o Ocidente como já fez antes? Afinal, os russos não apenas se receusaram a ceder sob o peso das sanções impostas, como se uniram em torno de seu líder com ainda mais entusiasmo.
Por fim, um país gigantesco como a Rússnia naturalmente tem interesses maiores, que irão colidir inevitavelmente com os de outros países. A questão é como as partes tentaram resolver esse problema.
Uma alternative é confiar no equilíbrio de poder, como os Estados Unidos e a URSS fizeram antes. O ator dominante pode promover seus interesses à força, como os EUA fizeram no mundo desde o colapso do bloco soviético. Ou então, conceções podem ser feitas para que se chegue a um certo equilíbrio de interesses. Até o momento, Moscou e o Ocidente não tiveram lá muito sucesso com essa abordagem, e a única opção razoável acabou sendo a atual Guerra Fria.
Serão necessaries vários anos de esforços penosos para acarmos uma saída desse impasse, assim como a suceção de gerações de líderes polícos tanto no Ocidente como na Rússia.