Metin Gurcan
Voz da Turquia
As pessoas hoje em dia se perguntam seriamente se a Turquia está prestes a se separar do Ocidente e da OTAN. Será a abertura da Turquia para o Oriente, que se tornou mais notável após a tentativa de golpe de 15 de julho, uma reação passageira à falta de interesse demonstrado pelos Estados Unidos e Europa, ou será a escolha de política não-alinhada e mais independente de Ancara? A lua de mel entre Ancara e Moscou nas últimas semanas se tornará em uma aliança de longo prazo?
As respostas a essas perguntas podem ser encontradas entre os indicadores segurança militar da Turquia, em vez de indicadores políticos e econômicos. A percepção do país de ameaças e aliados possui mais peso em suas escolhas estratégicas de longo prazo. Depois do recente comentário do Presidente Recep Tayyip Erdogan de que se a Turquia tomar o seu lugar na Organização para Cooperação de Xangai (OCX), isso “lhe permitirá agir mais livremente”, tem havido uma drástica elevação na especulação de que a Turquia pode deixar o bloco de segurança ocidental.
De acordo com o General Leonid Ivashov, o diretor da Academia de Estudos Geopolíticos da Rússia, a guinada da Turquia na direção da OCX é a jogada certa a ser feita. Ele contou à agência de notícias Sputnik, dirigida pelo governo russo, que, conforme Ancara inicie seu processo de ascensão à OCX, ela deve também iniciar o processo para deixar a OTAN. Ivashov, que observou que o presidente-eleito americano Donald Trump rotulou a OTAN como uma instituição obsoleta, e disse que a Turquia tem que fazer seus cálculos e decidir de acordo com isso.
Rebatendo os comentários linha dura de Ivashov está o Secretário-Geral Jens Stoltenberg, que esteve em Istambul para a Assembleia dos Parlamentares da OTAN em 19 de novembro e teve uma longa reunião com Erdogan. Se referindo a observação de Erdogan de que a Turquia poderia se juntar à OCX, Stoltenberg disse: “Tenho certeza que a Turquia não fará coisa alguma que poderia prejudicar o conceito de defesa conjunta … e a unidade da OTAN”.
A assembleia da OTAN em Istambul focou em questões como a das relações EUA-OTAN na era Trump, o futuro da aliança, a preferência da Turquia pelos sistemas de defesa de mísseis e aérea de grande altitude, a situação dos oficiais turcos trabalhando para a OTAN que não querem retornar à Turquia e estão buscando asilo, se a turquia nomeará novos oficiais para postos na OTAN, e a formação da força de treinamento da OTAN no Mar Negro.
O professor Mustafa Kibaroglu, um dos maiores especialistas nos assuntos da OTAN; na Universidade MEF em Istambul, contou ao Al-Monitor: “Não importa quem diga o que, eu não acho que a Turquia deixará a OTAN no futuro próximo. De qualquer forma, a OCX não tem a estrutura que pode ser uma alternativa à OTAN. E ainda mais, não tenho tanta certeza de que a OCX queira a adesão da Turquia”.
Arda Mevlutoglu perito da indústria de defesa pensa que a retórica e manobras políticas de Ancara nos últimos tempos se resume em jogadas em uma jogo de xadrez diplomático sendo jogado com o Ocidente logo em seguida da tentativa de golpe de 15 de julho. “É por isso que eu não acho que as relações militares entre a Turquia e a Rússia alcançarão o nível de uma aliança. Sabemos que as relações militares da Turquia com a Rússia, especialmente em defesa de aquisições, têm sido bem limitadas”.
Complicando ainda mais a cooperação para a defesa entre os dois estão “A filiação da Turquia à OTAN; a crise da Ucrânia e a anexação da Crimeia, que levou as relações entre a Rússia e o Ocidente ao ponto de ruptura; e recriminações mútuas entre a OTAN e a Rússia”, contou Mevlutoglu ao Al-Monitor.
Para Mevlutoglu, um dos resultados mais interessantes da melhora nas relações entre a Turquia e a Rússia tem sido o interesse da Turquia no sistema de defesa antiaéreo russo S-400 (a OTAN relata o nome: SA-21 Grumble).
Turan Oguz, pesquisador da indústria de defesa, acha que a questão mais importante é a crise de confiança que se aprofunda entre a Turquia e o Ocidente, o que é muito perceptível em esferas de defesa e segurança. A Turquia tem estado extremamente agitada ao ponto de emitir ameaças aos Estados Unidos e ao Ocidente por questões tais como drones armados, sistemas defesa antiaérea com mísseis de longo alcance e tecnologias avançadas de câmeras e motores. Se existir uma divisão quanto a defesa e segurança, “a primeira causa disso será a recusa de nossos aliados ocidentais em entender a Turquia e suas preocupações”, contou Oguz ao Al-Monitor.
A atual lua-de-mel entre a Rússia e a Turquia pode se transformar em uma aliança de verdade? De acordo com um perito em ciência política, Kerim Has da Universidade Estadual de Moscou, a resposta é não. Has acredita que a Rússia quer usar suas relações com a Turquia como um instrumento.
“A Rússia acredita que as estruturas estatais e fronteiras no Oriente Médio estejam fadas a mudarem, que atores não estatais terão um papel mais proeminente e, dessa forma, um período turbulento durante o qual alianças de segurança serão redesenhadas está no futuro próximo. A partir desse ponto de vista, a intenção da Rússia de abrir novas esferas de influência na região é compreensível”, contou ele ao Al-Monitor.
Ele acha que a Rússia espera que a administração de Trump que logo vai começar iniciará um processo similar à Brexit para a OTAN. Um rumo não planejado como esse para a União Europeia e a OTAN sem dúvida agradaria à Rússia. “Para um processo tão imprevisível assim para a UE e a OTAN, a Rússia precisa da Turquia”, disse ele.
Para que a Rússia conte com Ancara como uma parceira militar e de segurança a longo prazo, a Turquia tem que deixar a OTAN, disse ele.
“No momento, a Rússia não possui um aliado militar estratégico. Países como a Bielorrússia, Cazaquistão e Armênia não são países para defender a Rússia, mas que precisam da proteção da Rússia”, acrescentou Has.
O interesse real da Rússia não está em uma lua-de-mel com a Turquia, mas em um sacolejar da lua-de-mel do sistema de segurança ocidental.
Resumindo, não parece que a Turquia irá se separar do Ocidente. A não ser que a Rússia surja com um conceito de segurança coletiva e sustentável similar ao da OTAN, não é realístico esperar que um galanteio se transforme em uma aliança plena.
Mas então, por as emoções reinarem em Ancara e tudo ser secundário às políticas domésticas, talvez ninguém queira uma decisão analítica.
Fonte: www.al-monitor.com