Ariel Palacios
Jorge Lanata, que nos anos 80 fundou o jornal Página 12, tornou-se um dos emblemas do jornalismo investigativo. Apresentador do programa de TV Jornalismo para Todos, Lanata transformou-se no pesadelo do governo da presidente Cristina Kirchner, que alterou o horário das transmissões estatizadas dos jogos dominicais de futebol para o mesmo horário de seu programa. Lanata os superou em audiência. Há poucos dias lançou o livro 10 K – A Década Roubada, que analisa os casos de corrupção do governo do casal Kirchner.
Existe diferença na ação de corrupção do governo Kirchner com outro período também marcado pelos escândalos do tipo, o do governo de Carlos Menem?
Os menemistas pediam diferentes graus de propina, que iam do “padrão internacional” de 10% até os argentinos 40%. No início dos anos 90 denunciamos as negociatas de Emir Yoma, cunhado de Menem. O caso veio à tona em razão de uma carta da embaixada dos EUA em Buenos Aires queixando-se não da propina em si, mas da elevada porcentagem. Os integrantes do governo Kirchner saíram desse esquema e optaram por uma via diferente: participam das empresas. É o caso de uma empresária que herdou uma concessão de uma estrada, mas não sabia direito como funcionava o vínculo com o governo. Aí soube que todo mês teria de levar uma sacola de lixo, dessas usadas pelos condomínios, cheias de euros. Os euros são os preferidos pelo kirchnerismo, pois têm notas de 500 e são mais fáceis de transportar porque são muitos mais leves que os dólares. A corrupção no kirchnerismo é mais estrutural. No menemismo a pessoa pagava a propina e estava tudo resolvido. No kirchnerismo a pessoa tem de pagar todos os meses. Não acho que Néstor Kirchner sentia-se um ladrão. Acho que ele sentia que estava conseguindo dinheiro para sua política. Benito Mussolini e os fascistas também faziam algo parecido: “compravam” partes de empresas (ou sua totalidade) e com isso faziam política.
A fortuna do casal Kirchner cresceu 4.567% entre 1995 e 2010…
O incrível é que esse crescimento exponencial é oficial, pois está na declaração de bens. Mas o mais incrível é que os juízes tenham encerrado os processos que investigavam o enriquecimento dessas pessoas, especialmente durante o período em que elas ocupavam cargos públicos. Os políticos argentinos nem sequer conseguem que suas declarações oficiais de bens pareçam sérias.
Apesar das evidências contra o vice-presidente, Amado Boudou, Cristina continua a respaldá-lo…
Cristina não abandonará Boudou. Mas esse vice vai levar Cristina para o fundo do poço. Já é tarde para o governo livrar-se dele, que será processado. Ele não renunciará, mas sofrerá muita pressão para deixar o governo, até por parte de setores kirchneristas que não simpatizam com ele.
Em 2015, quando definirão o próximo presidente, os argentinos levarão em conta os casos de corrupção? Ou pesará mais o “rouba mas faz”?
Destes anos todos ficará uma coisa boa: a revalorização das instituições. Infelizmente na maior parte da história os argentinos nunca se preocuparam muito com elas. Mas nos últimos tempos está ocorrendo uma mudança de paradigmas. As pessoas consideram agora que a divisão dos poderes é importante e precisamos juízes independentes. Caso nas próximas eleições vençam os peronistas, não ocorrerá uma onda de processos de corrupção. Os peronistas nunca julgam os peronistas.