Yuwen Wu
editor do site bbcchinese.com
Depois de fugir da prisão domiciliar, um dos ativistas pró-direitos humanos mais famosos da China, Chen Guangcheng, divulgou um vídeo na internet dirigido ao primeiro-ministro, Wen Jiabao.
Na gravação, Guangcheng pede a Jiabao que inicie uma investigação das forças de segurança locais que, segundo o dissidente, submeteram ele e sua família a espancamentos e assédio, entre outras acusações.
Ele ainda pediu ao primeiro-ministro garantias de segurança para sua mulher, mãe e filha e solicitou que Jiabao investigasse como a vigilância de sua prisão domiciliar era financiada, por suspeitar de corrupção.
"Se fizermos uma investigação completa e falarmos a verdade às massas, o resultado é óbvio; mas se você continuar ignorando isto, o que o povo vai pensar?", diz o dissidente, encerrando o vídeo de 15 minutos.
O fato de Chen Guangcheng ter escolhido falar diretamente a Jiabao, ao invés de endereçar o vídeo para o presidente Hu Jintao ou outros líderes chineses, destaca um desejo de desafiar o primeiro-ministro a colocar em prática pedidos que o próprio Jiabao já fez várias vezes, por reforma polícia e fim da corrupção do governo.
Jiabao com frequência apresentou um lado mais suave da liderança chinesa, visitando locais atingidos por desastres e chorando com o sofrimento do povo.
Mas, neste caso, é muito improvável que o premiê, ou qualquer outra liderança chinesa, responda ao vídeo de Chen Guangcheng.
A fuga do dissidente ocorre em um momento delicado para a China. A secretária de Estado americana, Hillary Clinton, chega a Pequim na próxima semana para a quarta rodada do Diálogo Estratégico e Econômico Estados Unidos-China.
A imprensa do mundo inteiro vai acompanhar de perto como os dois lados vão lidar com o caso.
Destaque, questionamento e pressão
A fuga dramática do dissidente e seu vídeo colocou a situação de Chen Guangcheng novamente em destaque internacional.
Depois deste episódio deverão ocorrer perguntas constrangedoras para autoridades chinesas durante entrevistas. Organizações de defesa dos direitos humanos deverão retomar a pressão ao governo chinês para suspender o tratamento cruel dado a Guangcheng e sua família.
Guangcheng tem lutado sozinho contra as autoridade há mais de uma década.
Cego de nascimento, ele aprendeu direito sozinho e, em uma de suas mais dramáticas batalhas, enfrentou as autoridades da província de Shangdong, onde mora, devido à implementação brutal da política de um filho.
Mais de 7 mil mulheres foram obrigadas a se submeter a abortos ou esterilizações na região. Elas não contavam com proteção legal, a não ser a fornecida pelo dissidente e por outros advogados corajosos que divulgaram o escândalo na imprensa.
Em 2006, ele foi condenado a quatro anos de prisão, não pela atividade contra o Estado, mas sob a acusação de "danos ao patrimônio público". Desde que saiu da cadeia em 2010, ficou confinado em prisão domiciliar, sendo vítima de espancamentos e assédio organizados pelas autoridades locais.
O caso do dissidente chamou a atenção de internautas na China, que mantiveram uma campanha de apoio na web, e também de organizações de defesa dos direitos humano no mundo todo.
Muitas pessoas tentaram visitar Guangcheng em seu vilarejo, incluindo o ex-embaixador americano John Huntsman e o astro de Hollywood Christian Bale.
Eles, assim como jornalistas, amigos e cidadãos comuns, foram afastados pelas autoridades antes mesmo de conseguir entrar no vilarejo. Os menos famosos foram espancados pela polícia.
Escolhas difíceis
Dissidentes como Chen Guangcheng podem ser uma dor de cabeça constante para as autoridades, mas eles mesmo têm poucas opções.
Se saírem da China e começarem uma vida nova, exilados no Ocidente, conseguem a liberdade, mas perdem o contato com suas famílias e amigos.
Nos últimos anos, o escritor dissidente Yu Jie, o ativista defensor dos portadores do vírus da Aids Gao Yaojie e a muher e a filha do advogado dissidente Gao Zhisheng foram para os Estados Unidos.
Todos receberam ajuda da China Aid, uma organização baseada no Texas. Bob Fu, diretor da entidade, disse que Chen Guangcheng relutava em deixar o país, pois queria continuar na China para lutar por sua causa.