STJ restringe atuação das Guardas Municipais
André Luís Woloszyn
Analista de Assuntos Estratégicos, Especialista em Ciências Penais, Mestre em Direitos Humanos, diplomado em Inteligência Estratégica pela Escola Superior de Guerra e em Segurança Digital pela Organização dos Estados Americanos (OEA)
Desde que a Constituição Federal de 1988 foi promulgada, a atuação das guardas municipais no Brasil estão envolvidas em uma discussão acerca de sua competência na atuação da segurança pública. De um lado, a Constituição Federal de 1988, norma máxima do ordenamento jurídico brasileiro, de outro, a partir de 2014, a Lei nº 13.022, que criou o Estatuto Geral das Guardas Civis Municipais (GCM).
O art. 144 da Constituição Federal é claro quando apresenta quais as instituições responsáveis pela segurança pública no país, indo além, ao especificar as missões de cada uma destas. No parágrafo 5º, cita que os municípios “poderão” criar guardas municipais, destinadas a proteção de bens públicos municipais, serviços e instalações, ou seja, uma atividade exclusivamente patrimonial. A Lei nº 13.022, de 08 de agosto de /2014, também não a considera entre as instituições que fazem parte da segurança pública quando no art. 5º, inciso IV, expressa como competência específica “colaborar, de forma integrada com os órgãos de segurança pública, em ações conjuntas que contribuam com a paz social”. O parágrafo único do referido artigo reforça esta posição de atuação conjunta e de apoio, desde que haja a presença de uma das instituições elencadas no art. 144 da CF.
Basicamente, isso significa que é vetado as guardas municipais o patrulhamento ostensivo em locais fora dos limites patrimoniais do município (parques, praças, prédios e outros bens públicos municipais) e a realização de prisões decorrentes de crimes praticados fora destes limites, sem que haja o acompanhamento de uma instituição policial.
Este entendimento foi corroborado recentemente, no mês de setembro, em decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que invalidou as provas em um julgamento por tráfico de drogas, colhidas por integrantes da Guarda Civil Municipal de São Paulo, considerando terem sido obtidas ilicitamente, ou seja, por não terem competência legal para atuar na abordagem e revista pessoal de suspeitos fora dos limites patrimoniais, mesmo que dentro dos pressupostos do Código de Processo Penal.
A contrário sensu, tal decisão atinge todas as GCM, uma questão meramente jurídica, sem adentrar no campo da competência técnica de seus integrantes. Por hierarquia das leis, enquanto não forem inseridas no art. 144 da CF como instituição de segurança pública, problemas de competência deverão persistir com prejuízos maiores para estas instituições, incluindo sua credibilidade. A decisão do STJ, por enquanto, não é vinculativa, mas certamente será utilizada em favor dos réus em processos semelhantes.
É inegável que uma atuação mais ampla das GCM, no patamar de insegurança que convivemos, traria benefícios a segurança pública como um todo e é esta a questão que deveria ser o centro do debate. Me parece que o problema da Lei nº 13.022/2014 é interpretativa, exageradamente pró GCM e não uma questão de inconstitucionalidade, fato corroborado pela decisão do STJ, embora existam diversas Ações de Inconstitucionalidade (ADIN) no STF, aguardando julgamento.
Por outro lado, a luta por maiores competências legais no Congresso Nacional acarretaria uma consolidação institucional das GCM neste cenário. Contudo, no momento, possuem graves consequências. Além das provas serem consideradas ilegais pela Justiça, em determinados casos, o que anula o devido processo legal e o trabalho de seus integrantes, poderá redundar em abuso de autoridade de parte destes por extrapolar sua competência constitucional.