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Isolamento diplomático da Rússia – uma estratégia complicada em Genebra Internacional

Em fevereiro, a aparente calma de Genebra foi abalada pela indignação em relação à Rússia. A invasão da Ucrânia se tornou sua maior preocupação em todas as 38 organizações internacionais lá sediadas. À medida que a guerra perdura, o país se isola. Rússia foi excluída de alguns debates ocorridos na Organização Mundial do Comércio (OMC).

Perdeu seu status de país "observador" na Organização Europeia para a Pesquisa Nuclear (CERN). Mais recentemente, a Organização Internacional do Trabalho (OIT) decidiu suspendê-la até um cessar-fogo.

"O isolamento aumenta. É hora de acabar com esta agressão bárbara, que contraria os valores da OIT", declarou Simon Manley, embaixador da Grã-Bretanha na ONU em Genebra, à agência de notícias AFP.

Um diplomata da missão da União Europeia na ONU confirma que deixou de ter reuniões bilaterais com seus homólogos russos. Como ficará a situação da Rússia na chamada "Genebra internacional".

O país é membro permanente do Conselho de Segurança da ONU e também de inúmeras organizações internacionais. Se a polarização continuar, há o risco que as conversações em andamento fiquem paralisadas e acordos sejam desfeitos.

Pedido de exclusão

A presença da Rússia no Conselho de Direitos Humanos (CDH) da ONU é considerada problemática. Vários países-membros, além de 30 ongs solicitaram a exclusão da Rússia do órgão. "Obviamente se fala muito sobre a exclusão. Grã-Bretanha, União Europeia, ongs e muitos outros países pressionam.

Ter um membro do Conselho cometendo violações graves e sistemáticas dos direitos humanos mina sua credibilidade", afirma Marc Limon, diretor do think-tank Grupo de Direitos UniversaisLink externo. Os que defendem a exclusão ressaltam o problema da credibilidade.

"Qual seria o impacto da suspensão sobre o CDH? Seria positivo, pois o órgão demonstraria dessa forma estar defendendo seus princípios. Honestamente acredito ser a única forma de enviar uma mensagem à Rússia", acrescenta Limon.

Porém a exclusão do país governado por Putin é mais difícil que parece. Embora a maioria dos países-membros do CDH tenha votado para abrir uma comissão de inquérito sobre Ucrânia – esta prevê uma investigação reforçada da situação no terreno – a exclusão do país pode não ter os efeitos esperados. Condenar a invasão e suspender a adesão da Rússia não é a mesma coisa.

A suspensão requer o apoio de pelo menos dois terços dos votantes na Assembléia-Geral da ONU, o que é muito difícil ocorrer na situação atual, informam fontes diplomáticas. "Não considero que estamos isolados", declarou Gennady Gatilov, embaixador da Rússia na ONU em Genebra. "

Alguns países apoiam nossa posição, dentre eles China, Índia e outros países". Somente Rússia e Eritréia votaram contra a comissão de inquérito sobre a situação dos direitos humanos na Ucrânia.

China e a Índia, dois dos maiores aliados da Rússia, se abstiveram. Gatilov afirma que muitos países haviam sido pressionados pelos EUA e seus aliados para apoiar a Ucrânia. "Mas isso não significa que esses países concordem inteiramente com as políticas dos Estados Unidos e seus aliados", acrescentou o diplomata russo.

<script async src=”https://platform.twitter.com/widgets.js” charset=”utf-8″></script> Descontentamento

A invasão russa da Ucrânia também provocou reações na OMC. Ao todo, 14 delegações, incluindo União Européia, Estados Unidos, Grã-Bretanha e Japão condenaram em 15 de março a agressão militar da Rússia contra a Ucrânia, a descrevendo como uma "violação flagrante do direito internacional e da Carta da ONU".

Os países concordaram em suspender o status de nação mais favorecida (NMF) para a Rússia, e também suspenderam o progresso de Belarus para aderir à OMC. O status de nação favorecida é um princípio do sistema comercial multilateral que garante a igualdade de comércio para todos os membros. No dia seguinte, a Rússia reagiu.

"Estamos profundamente perturbados com os desenvolvimentos na OMC, que preparam o caminho para um completo desmantelamento do sistema comercial multilateral baseado em regras", declarou o representante do país. O congelamento diplomático vai além do nível formal.

A Rússia também foi expulsa do grupo de coordenação dos países desenvolvidos na OMC. UE e EUA argumentam que os valores centrais da OMC são mais importantes e, portanto, não incluirão mais a Rússia neste grupo informal.

"A expulsão da Rússia desse grupo não foi só simbólico, mas em termos práticos não há impacto direto sobre o comércio. Não estamos falando aqui de tarifas. Esta é mais uma questão interna da OMC", declarou o representante da UE na OMC.

 

Grupo de Coordenação dos Países Desenvolvidos

Existem quatro grupos regionais na OMC: Grupo da África, Grupo da América Latina e Caribe, Grupo da Ásia em Desenvolvimento e Países Desenvolvidos.?

O grupo de países desenvolvidos coordena as indicações do Conselho e do presidente do Comitê, incluindo as que se alternam anualmente entre os membros dos países desenvolvidos e os dos países em desenvolvimento.?Também participam das reuniões da "Sala Verde", onde um número limitado de países troca opiniões para facilitar o consenso antes de chegar a um acordo. 

O grupo de coordenação é composto por 11 delegações, incluindo Suíça, mas não inclui a China. Os membros são Austrália, Canadá, UE, Islândia, Japão, Liechtenstein, Nova Zelândia, Noruega, Suíça, Reino Unido e EUA. A Rússia tinha o status de país "associado".

Enfraquecendo o multilateralismo

Mas alguns acreditam que isolar a Rússia só pode enfraquecer a ONU e outras organizações multilaterais. "Trazer a guerra na Ucrânia para uma perspectiva global não serve em nada aos interesses do Ocidente", diz André Liebich, professor aposentado do Instituto Universitário de Altos Estudos Internacionais (IHEID) Liebich acredita que tentar expulsar a Rússia da Genebra Internacional não traria nenhum benefício a longo prazo para o Ocidente, uma vez que a Rússia é um jogador global.

"O isolamento da Rússia só dificultará o trabalho das organizações internacionais e enfraquecerá o multilateralismo". Neste contexto, "a saída dos membros da ONU do discurso de Lavrov foi a abordagem errada", diz o professor, se referindo a uma saída encenada em 1º de março durante o discurso do ministro russo das Relações Exteriores, Sergey Lavrov, no CDH.

Para a OMC, que está três meses à frente de sua conferência ministerial prevista para ocorrer em junho, mas que já está sem impulso político. A mudança poderia tornar mais difícil chegar a um consenso. A condenação da invasão militar russa na Ucrânia está se espalhando para reuniões de outras organizações internacionais em Genebra.

Na reunião da Convenção sobre Diversidade Biológica no Centro Internacional de Conferências em Genebra, que começou em 14 de março, representantes da Ucrânia e da Rússia discutiram sobre a guerra.

Nas reuniões, vários países ocidentais também condenaram a agressão da Rússia em suas declarações de abertura. Em 8 de março, o conselho do CERN, composto por 23 países-membros, manifestou apoio aos colaboradores ucranianos e sua pesquisa. Ao mesmo tempo, suspendeu o status de país "observador" da Rússia e interrompeu a cooperação com o país.

 

O que é significa o status de "observador"? 

Países-membros como França, Alemanha, Itália, Suíça e Reino Unido são financiadores da Organização Europeia para a Pesquisa Nuclear (CERN) e estão representados no conselho de administração.

Já países "observadores", dentre eles EUA, Japão e antes de 8 de março a Rússia, podem participar das sessões abertas do conselho, mas não têm direito a voto.

Países "associados" como Índia, Paquistão, Ucrânia participam das reuniões do conselho, do comitê de Finanças e do comitê de Política Científica. Seus representantes e a indústria dos seus países podem participar de concorrências públicas do órgão.

As operações do CERN podem ser afetadas como resultado da decisão. Atualmente a maior parte dos cientistas participantes nos projetos do CERNLink externo, incluindo o acelerador de partículas mais potente do mundo, o Grande Colisor de Hadron (LHC) vem da Rússia.

As medidas têm se tornado mais rígidas e os projetos do CERN podem ser atrasados. Em 25 de março, a participação de cientistas em projetos e eventos conjuntos com a Rússia e Belarus foi suspensa.

Até o momento, mais de 1100 cientistas de 27 instituições acadêmicas e científicas russas participavam dos programas do CERN. "O impacto científico está sendo estudado atualmente e nosso objetivo será minimizar o impacto em nossos pesquisadores e na ciência", disse um porta-voz.

Repetindo ou escrevendo a história?

Embora seja muito cedo para avaliar o impacto da guerra sobre as instituições da ONU, as tensões fazem lembrar o período anterior à II Guerra Mundial: nos anos 1930, após a invasão da Manchúria pelo Japão e a invasão da Finlândia pela União Soviética, alguns paises-membros, especialmente os que tinham governos fascistas (Espanha, Itália, Alemanha) se retiraram – ou foram expulsos – da Liga das Nações em Genebra, a predecessora da ONU.

 

Em 14 de dezembro de 1939, a Liga das Nações expulsou a União Soviética em resposta à invasão da Finlândia pelos soviéticos em 30 de novembro. ©United Nations Archives at Geneva

Com o Conselho de Segurança da ONU incapaz de impor um cessar-fogo devido ao poder veto da Rússia, seu propósito de manter a paz internacional parece ineficaz.

O Ocidente impôs severas sanções econômicas contra a Rússia, mas que não estão impedindo o prosseguimento da guerra. O clima político global é tão tenso como nunca.

"Os países não irão abdicar do seu poder de veto no Conselho de Segurança. Estamos presos aos resultados da II Guerra Mundial. Já se passaram mais de 70 anos desde o fim do conflito e ainda vivemos como se estivéssemos no rescaldo dessa guerra", avalia Liebich.

"A União Soviética desempenhou um papel nas Nações Unidas em Genebra e isto facilitou o fim da Guerra Fria. Penso que a guerra na Ucrânia só termina através de negociações entre a Ucrânia e a Rússia."

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