Uma situação embaraçosa ocorrida há três anos na Estação Espacial Internacional (ISS) pode piorar ainda mais as já não muito amistosas relações entre a Rússia e os EUA. Em 2018, um buraco foi identificado no módulo de habitação da espaçonave Soyuz MS-09, o que levou a uma extensa investigação concluída esta semana pela Roscosmos e encaminhada às autoridades do país.
Na Rússia, os procedimentos jurídicos têm trâmites diferentes, segundo o site de notícias RIA Novosti. Os resultados das investigações são enviados à polícia para permitir que as autoridades decidam se devem iniciar ou não um processo criminal.
O país não tem um sistema de grande júri como nos EUA, onde os investigadores entregam suas provas aos promotores, que decidem se apresentarão as acusações.
Embora não tenham sido divulgados detalhes sobre a investigação, existem algumas suspeitas sobre o que possa ter ocasionado o orifício de 2 mm de largura, que poderia ter despressurizado a ISS em menos de duas semanas, caso não tivesse sido imediatamente detectado.
Um ataque de micrometeoroide foi uma das primeiras hipóteses, logo descartada. Alguns meios de comunicação russos relataram, na época, que o buraco teria sido causado por um defeito de fabricação ou teste, o que parece ser a teoria mais plausível.
Acusação sem provas contra a única mulher a bordo da ISS
No entanto, fontes do governo russo espalharam rumores infundados de que, talvez, uma astronauta da Nasa tivesse perfurado o buraco de maneira proposital.
Os tripulantes do módulo Soyuz MS-09 eram o cosmonauta russo Sergey Prokopyev, o alemão Alexander Gerst, da Agência Espacial Europeia (ESA), e a norte-americana Serena Auñón-Chancellor (sobre quem pesa a acusação).
Em abril deste ano, a agência de notícias TASS – serviço estatal russo oficial de comunicação – divulgou, sem provas, que Auñón-Chancellor teve “uma crise psicológica aguda” após sofrer um caso de trombose venosa profunda no espaço. Durante o surto, ela teria feito o buraco na tentativa de acelerar o retorno à Terra. Prontamente, a notícia foi desmentida pela Nasa.
Agora, com o anúncio de que a investigação foi concluída, outra teoria da conspiração foi lançada. No artigo do RIA Novosti, há relatos de que Auñón-Chancellor pode ter feito o buraco “devido ao estresse após um relacionamento romântico fracassado com outro membro da tripulação”.
Considerando que, além dos três tripulantes da Soyuz, tinham mais três astronautas a bordo da ISS na época (sendo dois da Nasa), e que Auñón-Chancellor era a única mulher no grupo, essa acusação sem provas não representa apenas mais um round do embate entre os dois países, mas também um caso escancarado de claro machismo – o que é um golpe baixo.
É importante ressaltar, mais uma vez, que o conteúdo real do documento encaminhado para análise das autoridades policiais não foi revelado, então, não se sabe se, de fato, essas acusações constam ali. Ainda assim, a Nasa, mais uma vez, manifestou indignação, afirmando veementemente que esses ataques à astronauta são sem fundamento.
“Esses ataques são falsos e carecem de credibilidade”, disse o administrador da agência, Bill Nelson, ao site ArsTechnica. “Apoio totalmente Serena e todos os nossos astronautas”.
De acordo com o Ars, esses ataques são realmente falsos. Na época do incidente, a equipe técnica da Nasa responsável pela ISS foi capaz de determinar imediatamente a localização precisa dos astronautas americanos a bordo da estação antes do vazamento ocorrer – e no momento em que começou. Nenhum deles estava perto do segmento russo onde o veículo Soyuz estava atracado, informação esta que foi compartilhada pelas autoridades americanas com o governo russo na ocasião.
Relação entre Rússia e EUA têm piorado nos últimos tempos
Esta última provocação – funcionários da agência e os advogados de Auñón-Chancellor estão furiosos com as acusações – veio em um momento perigoso. Depois que os militares russos destruíram um satélite próprio, o Cosmos 1408, como parte de um teste antissatélite no início deste mês, os astronautas a bordo da ISS tiveram que se abrigar dentro de suas espaçonaves por mais de duas horas, preocupados com os destroços.
Além disso, uma caminhada espacial que estava programada para terça-feira (30), também teve que ser adiada, embora não tenha ficado imediatamente claro que isso foi devido aos destroços da colisão do Cosmos 1408. Isso sem falar que, neste ano, naves espaciais russas já haviam deixado o laboratório orbital fora de controle não uma, mas duas vezes.
Agora, só resta aguardar o desenrolar da história da investigação sobre o incidente ocorrido em 2018 e descobrir como ficarão as relações entre os dois países depois de tudo isso.