Cel R1 Péricles da Cunha
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Hoje, 18 de outubro, 33 anos atrás, uma atitude tomada que muito me orgulha: fui o único oficial do Exército BRASILEIRO a reagir contra o discurso do todo poderoso Ulysses Guimarães, presidente da Assembleia Constituinte, na promulgação da Constituição: chamou, todos nós, militares, de facínoras:
“A sociedade foi Rubens Paiva, não os facínoras que o mataram. (Muito bem. Palmas prolongadas)”.
Isso, na presença de autoridades, do corpo diplomático, das representações estrangeiras …. E DOS CINCO MINISTROS MILITARES, TODOS GENERAIS DE QUATRO ESTRELAS que impassíveis permaneceram.
E reagi com o artigo “A MULHER DE LOT”, publicado em “O Estado de S. Paulo”, 18/10/1988: “O Dr. Ulysses, com toda a sua experiência, ainda não aprendeu a mensagem do Velho Testamento: ‘A mulher de Lot olhou para trás e se converteu numa coluna de sal’.
E mais me orgulho por ter sido coerente com o meu proceder, nestes 33 anos: reagir sem agredir, lançando SEMPRE pontes para a convergência.
Leia a íntegra do artigo:
O ESTADO DE S. PAULO – ESPAÇO ABERTO – 18 Outubro 1988
A MULHER DE LOT
Cel R1 Péricles da Cunha
O Dr. Ulysses, com toda a sua experiência, ainda não aprendeu a mensagem do Velho Testamento: "A mulher de Lot olhou para trás e se converteu numa de sal".
Ao lembrar o caso Rubens Paiva – “A sociedade foi Rubens Paiva, não os facínoras que o mataram. (aplausos acalorados)” -, na hora em que o Brasil olhava para o futuro que se descortinava com a promulgação da Constituição, deu a impressão de que discursava, não para a Nação, como o líder maior da Constituinte, mas como o candidato a cortejar aquela minoria radical que, esquecida do paredón, vive deslumbrada a cantar loas ao ditador cubano.
Violências e desrespeitos aos direitos humanos ocorreram no passado recente, mas não é justo pinçar um caso reconhecidamente lamentável e condenável, para avivar feridas que a todos interessas ver cicatrizadas. Por acaso não era também sociedade o pracinha de 18 anos que foi pulverizado por um carro-bomba enquanto guarnecia o Quartel do Ibirapuera? Um jovem totalmente inocente sacrificado por mãos tão assassinas como as que mataram Rubens Paiva.
"A sociedade sempre acaba vencendo”, como afirmou”, mas a inércia e o interesse menor de grupos podem levar a grandes sacrifícios. A sociedade, liderada pelo dr. Ulysses, clamou por “diretas já”, em 1984, enquanto Tancredo Neves costurava um acordo de cúpulas para chegar ao poder sem o voto do povo.
O Estado dilapidou as reservas cambiais recebidas pela Nova República ao usar o Plano Cruzado para fins eleitorais. A sociedade elegeu a bancada majoritária de governadores e constituintes do PMDB e está pagando a conta dos desmandos da economia.
A sociedade elegeu majoritariamente o PMDB para a Constituinte e clamou pelos quatro anos para Sarney. Dr. Ulysses não foi a sociedade ao possibilitar que as burras abarrotadas do Estado neutralizassem seu partido a ponto de permitir que minorias concedessem os cinco anos, frustrando a vontade popular.
Não será avivando feridas do passado que construiremos uma grande nação, não será lembrando a Intentona de 35 ou os momentos difíceis do regime militar que resolveremos nossos problemas. Toda guerra é cruel e, se conseguíssemos filmar somente as ações de um dos lados, qualquer que seja, veríamos as atrocidades cometidas, todas dignas de facínoras.
Pensei que a Constituinte tivesse no ensinado a olhar para a frente, mas o seu presidente deu uma demonstração de que pelo menos os nossos políticos continuam propensos a obsessões retrospectivas, com o futuro limitado à próxima eleição. Talvez esta atitude seja fruto de incertezas; quando não se tem seguro o presente, é difícil pensar no futuro, é mais fácil cair na recriminação mútua. Não se alcança a grandeza buscando explicação para a próxima debilidade. A grandeza se alcança fazendo o difícil e o difícil é evitar o atalho da demagogia e enfrenta o duro caminha por onde só transitam os estadistas.
Olhar para trás quando faltam 135 semanas para entrarmos no século 21 é, no mínimo, uma perda de tempo de que não mais dispomos. Uma das poucas certezas que temos é a de que já nasceu a nossa força de trabalho para o primeiro quarto de século e o seu perfil não é nada promissor. Nossos problemas são tantos e tão complexos que somente serão resolvidos se tivermos a coragem de enfrentá-los olhando sempre para a frente e usando o passado unicamente como subsídio e nunca como fim.
Precisamos de um estadista de porte de um De Gaule que juntou os cacos de uma França mutilada pela guerra, restabeleceu a grandeza nacional e ganhou o reconhecimento de todos os franceses; do porte de um Roosevelt que, recebendo de Hoover o cadáver de uma estrutura econômica aniquilada pela crise de 29, empreitou a ressurreição com um perfil no qual predominava a justiça social; de um estadista com a capacidade de sintetizar as demandas populares e seus anseios, e traduzi-los num projeto nacional que conte com amplo apoio da maioria; que seu comportamento vise exclusivamente ao bem público com o resgate da verdadeira cidadania sem medíocres “opções pelos pobres” e “tudo pelo social”, que não passam de pura retórica a ocultar a verdadeira intenção de manter a pobreza sob controle para projetos eleitorais; que diga aos brasileiros: “ Vamos esquecer as rixas do passado as rixas do passado e vamos lutar para que nunca mais ocorram lutas fraticidas, que a única forma de evitarmos retrocessos é através da criação de uma sociedade justa.
A luta deve ser pata que a Constituição-cidadã, a Constituição-coragem do dr. Ulysses perca seus qualitativos e se transforme na Constituição brasileira que orientará o nosso futuro e não adquira o derradeiro e perigoso adjetivo de Constituição-decepção a dar razão aos pregoeiros da Constituição-utopia.
Não percamos mais tempo olhando para trás para que não caiamos no mesmo erro da mulher de Lot.