Redação DefesaNet
Com material do CONJUR e STF
O Supremo Tribunal Federal acolheu o recurso de familiares de um pescador que pretendem que a República Federal da Alemanha os indenize pela sua morte, em 1943, quando um barco pesqueiro foi afundado por um submarino alemão na costa brasileira. Por maioria, em julgamento do recurso com repercussão geral (Tema 944), o Plenário fixou a tese de que Estados estrangeiros que pratiquem atos em violação aos direitos humanos não gozam de imunidade de jurisdição no Brasil e podem responder judicialmente por eles.
O ataque ao barco pesqueiro Changri-lá matou dez pescadores em julho de 1943, durante a 2ª Guerra Mundial, em mar territorial brasileiro, nas proximidades de Cabo Frio (RJ). Em 2001, o Tribunal Marítimo reconheceu, oficialmente, que a causa do naufrágio foi o torpedeamento da embarcação pelo submarino U-199 alemão, levando os netos e as viúvas dos netos de um dos pescadores a ajuizar, em 2006, a ação de ressarcimento de danos materiais e morais.
Na primeira instância, a ação de reparação foi extinta sem resolução de mérito, pois o juízo da 14ª Vara Federal da Seção Judiciária do Rio de Janeiro declinou de sua competência. A família recorreu ao Superior Tribunal de Justiça (STJ), mas o recurso não foi admitido com base na jurisprudência daquela corte, que impede a responsabilização de Estado estrangeiro por ato de guerra.
No recurso extraordinário ao Supremo Tribunal Federal, a família do pescador sustentou que deve ser considerada a submissão expressa da Alemanha, por tratados internacionais, à jurisdição do local onde foram praticados os crimes de guerra e contra a humanidade durante o regime nazista. Argumentaram, ainda, que não há ato legítimo de império (decorrente do exercício do direito da soberania estatal) na prática de crime de guerra e contra a humanidade já julgados e condenados por Tribunal Internacional nem imunidade de jurisdição para atos atentatórios aos direitos humanos.
O julgamento foi iniciado em março deste ano e suspenso por pedido de vista do ministro Alexandre de Moraes.
Em seu voto, o relator, ministro Edson Fachin, destacou a prevalência dos direitos humanos como princípio que rege o Estado brasileiro nas suas relações internacionais (artigo 4º, inciso II, da Constituição). Segundo ele, a partir da Constituição de 1988, os atos de gestão praticados por Estado estrangeiro passaram a ser passíveis de questionamento na Justiça brasileira. Contudo, não havia a mesma previsão para os chamados atos soberanos de império, como no caso do ataque alemão ao pesqueiro no litoral brasileiro.
O ministro citou vários países onde a imunidade de jurisdição vem sendo relativizada ou afastada para casos de atos de império ou de crimes contra a humanidade. Lembrou, também, que o Brasil ainda não se vinculou à Convenção das Nações Unidas sobre a Imunidade de Jurisdição dos Estados ou a tratado congênere e que prevalece, aqui, o chamado Direito costumeiro, que também deve estar em conformidade com a Constituição Federal.
Na avaliação do ministro, em decorrência da situação, as famílias das vítimas, além de privadas de seus entes queridos e da subsistência que eles proviam, foram privadas da resposta, do direito à verdade e do acesso à Justiça, o que considera mais uma violação de direitos humanos. "Um crime é um crime", afirmou. "A imunidade, assim, deve ceder diante de um ato atentatório aos direitos humanos".
Acompanharam o entendimento do ministro Edson Fachin, no sentido de que a imunidade de jurisdição não é absoluta e que pode ser afastada em caso de crimes contra os direitos humanos, as ministras Rosa Weber e Cármen Lúcia e os ministros Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski e Luís Roberto Barroso.
Imunidade absoluta
Para a corrente que divergiu do relator, aberta pelo ministro Gilmar Mendes, é absoluta a imunidade de jurisdição de Estado estrangeiro por atos de império, inclusive os praticados em contexto de guerra. Segundo o ministro, deve ser mantida a jurisprudência do STF nesse sentido, que reflete, também, a interpretação majoritária da comunidade internacional, "sob pena de criarmos um incidente diplomático internacional". Seguiram a divergência os ministros Marco Aurélio (aposentado), Alexandre de Moraes, Nunes Marques e Luiz Fux.
A tese de repercussão geral fixada foi a seguinte: "Os atos ilícitos praticados por Estados estrangeiros em violação a direitos humanos não gozam de imunidade de jurisdição". Com informações da assessoria de imprensa do STF.
# |
Data |
Navio |
Tipo Tonelagem |
Comandante |
Agressor Causa |
Local e Posição |
Salvos |
Mortos |
1º |
22 de março de 1941 |
Taubaté(d) |
cargueiro 5 099 |
Mário Fonseca Tinoco[1] |
Alemanha ataque aéreo |
12 |
1 |
|
2º |
cargueiro/ passageiro 5 152 |
João Joaquim de Moura |
U-432 torpedo |
costa da Carolina do Norte 60 mn do Cabo Hatteras |
84 |
1 |
||
3º |
cargueiro 4 085 |
Jacob Benemond |
U-432 tiros de canhão |
costa da Virgínia |
46 |
0 |
||
4º |
(Cabedello) |
cargueiro 3 557 |
Pedro Veloso da Silveira(†) |
Itália [nota 2] torpedo |
0 |
54 |
||
5º |
7 de março de 1942 |
(Arabutan) |
cargueiro 7 874 |
Aníbal Alfredo do Prado |
U-155 torpedo |
costa da Carolina do Norte 81 mn do Cabo Hatteras |
50 |
1 |
6º |
8 de março de 1942 |
(Cayrú) |
cargueiro/ passageiro 5 152 |
José Moreira Pequeno(†) |
Alemahnha U-94 torpedo |
130 mn a SE de Nova York |
36 |
53 |
7º |
1º de maio de 1942 |
(Parnahyba) |
cargueiro 6 692 |
Raul Francisco Diégoli |
Alemanha torpedo |
a leste de Trinidad e Tobago |
65 |
7 |
8º |
18 de maio de 1942 |
(Commandante Lyra) |
cargueiro 5 052 |
Severino Sotero de Oliveira |
Itália torpedo |
a 900 km a NE de Natal |
50 |
2 |
9º |
24 de maio de 1942 |
cargueiro 4 996 |
João Batista G. de Figueiredo |
Alemanha torpedo |
46 |
6 |
||
10º |
1º de junho de 1942 |
cargueiro 5 970 |
Eurico Gomes de Sousa |
Alemanha torpedo |
64 |
0 |
||
11º |
5 de junho de 1942 |
Paracuri (Paracury) |
veleiro 265 |
n/d |
Alemanha tiros de canhão.[2] |
n/d |
n/d |
|
12º |
26 de junho de 1942 |
cargueiro 3 666 |
Ernesto Mamede Vidal |
Alemanha Alemanha torpedo |
500 km a NE de Porto Rico |
48 |
0 |
|
13º |
26 de julho de 1942 |
cargueiro 4 942 |
José Martins de Oliveira |
U-66 torpedo |
a NE de Trinidad e Tobago |
48 |
4 |
|
14º |
28 de julho de 1942 |
cargueiro 4 772 |
Aécio Teixeira da Cunha |
Alemanha torpedo |
a leste de Barbados |
56 |
6 |
|
15º |
28 de julho de 1942 |
navio-tanque 2 347 |
Renato Ferreira da Silva(†) |
U-155 torpedo |
100 mn a leste de Barbados |
34 |
1 |
|
16º |
15 de agosto de 1942 |
(Baependy) |
passageiros 4 801 |
João Soares da Silva(†) |
Alemanha torpedo |
ao largo da foz do Rio Real, |
36 |
270 |
17º |
15 de agosto de 1942 |
passageiros 4 871 |
Lauro Augusto Teixeira de Freitas(†) |
Alemanha torpedo |
ao largo da foz do Rio Real, |
11 |
131 |
|
18º |
16 de agosto de 1942 |
(Annibal Benevolo) |
passageiros 1 905 |
Henrique Jacques Mascarenhas |
Alemanha torpedo |
costa norte da Bahia |
4 |
150 |
19º |
17 de agosto de 1942 |
(Itagibe) |
passageiros 2 169 |
José Ricardo Nunes |
U-507 torpedo |
145 |
36 |
|
20º |
17 de agosto de 1942 |
cargueiro 1 075 |
José Coelho Gomes |
Alemaanha torpedo |
15 |
20 |
||
21º |
19 de agosto de 1942 |
(Jacyra) |
barcaça de carga 89 |
Norberto Hilário dos Santos |
Alemanha explosivos |
6 |
0 |
|
22º |
(Ozorio) |
cargueiro 2 730 |
Almiro Galdino de Carvalho(†) |
Alemanha torpedo |
costa do Pará |
34 |
5 |
|
23º |
(Lages) |
cargueiro 5 472 |
Osvaldo Simões da Silva |
Alemanha torpedo |
costa do Pará |
46 |
3 |
|
24º |
cargueiro 1 223 |
Américo de Moura Medeiros(†) |
Alemanha torpedo |
24 |
16 |
|||
25º |
cargueiro 5 187 |
José Francisco P. de Medeiros |
U-504 torpedo |
ao largo de Port Elizabeth |
57 |
1 |
||
26º |
cargueiro 3 766 . |
José dos Santos Silva |
Alemanha torpedo |
|
52 |
5 |
||
27º |
cargueiro 6 075 |
Eurico Gomes de Souza |
Alemanha torpedo |
50 |
0 |
|||
28º |
2 de março de 1943 |
(Affonso Penna) |
cargueiro/ passageiro 3 540 |
Euclides de Almeida Basílio |
Itália torpedo |
ao largo de Porto Seguro, Bahia |
117 |
125 |
29º |
1º de julho de 1943 |
(Tutoya) |
cargueiro 1 125 |
Acácio de Araújo Farias(†) |
Alemanha torpedo |
30 |
7 |
|
30º |
4 de julho de 1943 |
cargueiro 5 228 |
Jony Pereira Máximo |
Alemanha torpedo |
ao largo de Salinópolis, Pará |
37 |
5 |
|
31º |
22 de julho de 1943 |
pesqueiro 20 |
João da Costa Marques(†) |
U-199 tiros de canhão |
ao largo do Arraial do Cabo |
0 |
10 |
|
32º |
31 de julho de 1943 |
cargueiro/ passageiro 8 235 |
Arthur Monteiro Guimarães(†) |
U-185 torpedo |
ao largo da foz do Rio Real, |
106 |
28 |
|
33º |
passageiros 4 998 |
Antônio da Barra |
Alemanha torpedo |
litoral de Alagoas |
50 |
22 |
||
34º |
cargueiro/ passageiro 4 663 |
Mário Amaral Gama |
Alemanha torpedo |
litoral de São Paulo |
51 |
12 |
||
35º |
19 de julho de 1944 |
1 737 |
Cap. João Batista M.G. Roxo |
Alemanha torpedo |
ao largo do Farol de São Tomé, |
176 |
99 |
Total: 1.081 mortos[nota 1] e 1.686 sobreviventes