Ricardo Salles
Ministro do Meio Ambiente
Por mais de uma década, jogou-se para debaixo do tapete o debate sobre boa parte dos problemas da Amazônia, fazendo de conta que ali não havia mais de 20 milhões de brasileiros que precisavam, além das pautas ambientais, de saúde, educação, saneamento, moradia e, acima de tudo, alternativas de emprego e renda que lhes permitisse viver dignamente.
Criou-se o paradoxo da região mais rica do Brasil em recursos naturais, com os piores índices de desenvolvimento humano (IDH).
Ao não se preocupar em criar oportunidades para a região, abriu-se espaço para que tais desassistidos fossem sendo cada vez mais facilmente cooptados pelas atividades ilegais de roubo de madeira, garimpo ilegal e grilagem de terras.
Tal realidade não é muito diferente do que ocorre nas periferias dos grandes centros urbanos, cada vez mais expostas, pela ausência de perspectivas, ao envolvimento com o tráfico de drogas e o crime organizado.
O Plano Nacional de Combate ao Desmatamento Ilegal, elaborado pelo MMA, baseia-se em cinco vetores que envolvem ações de competência de diversos ministérios:
(i) Regularização Fundiária, matéria afeita ao Ministério da Agricultura, através do INCRA
(ii) PSA – Pagamento pelos Serviços Ambientais, tema do MMA,
(iii) ZEE – Zoneamento Econômico e Ecológico, envolvendo Minas e Energia, além de Agricultura, MMA, Infraestrutura, Desenvolvimento Regional, e Justiça, através da FUNAI,
(iv) Bioeconomia, que envolve desde Economia, até Meio Ambiente, Agricultura e Ciência e Tecnologia, e,
(v) Fiscalização, Comando e Controle, que demanda ações de IBAMA e ICMBIO, ambos do MMA, além de Polícia Federal e Força Nacional, ambos da Justiça, Forças Armadas, do Ministério da Defesa, além do papel fundamental das Policias Militares estaduais.
Por essa razão, quando sugeri ao Presidente da República a criação do Conselho da Amazônia, e a sua coordenação pelo Vice-Presidente Gen. Mourão, que, diga-se, vem fazendo um grande trabalho de centralizar e avançar em tais ações dispersas em vários ministérios, tínhamos como objetivo justamente fazer andar uma agenda estruturante aguardada há décadas.
Em primeiro lugar, é necessário fazer a regularização fundiária, sem a qual se torna quase impossível identificar e punir os verdadeiros responsáveis pelos crimes ambientais.
Por outro lado, ao se titular propriedades faremos valer em face dos proprietários o Código Florestal e seus preceitos, dentre eles a reserva legal de 80% e as APPs, áreas de preservação permanente. Uma vez regularizadas as propriedades, a segunda medida baseia-se no PSA, pagamento pelos serviços ambientais prestados por aqueles proprietários que, inscritos e validados no CAR – Cadastro Ambiental Rural, cuidam bem de suas reservas legais e áreas de preservação permanente, além de prevenir incêndios e adotar práticas sustentáveis em suas áreas.
O Governo Federal lançou o Floresta+, programa que prevê remunerar pequenos agricultores, quilombolas e comunidades tradicionais que preencham esses requisitos, com verba de 500 milhões de reais que ajudarão a criar incentivos econômicos para a preservação.
Ao mesmo tempo, a exemplo dos planos diretores das cidades, precisamos ter o ZEE – Zoneamento Econômico Ecológico da Amazônia, identificando as necessidades e potencialidades de cada parte daquela vasta região.
O ZEE que poderá dizer onde é preciso e possível ter hidrovias, expansão urbana, linhas de transmissão, lavoura ou mineração, com o devido cuidado e licenciamento ambiental.
Não é crível admitir que diante de tamanha riqueza mineral de ouro, manganês, diamante, nióbio, cassiterita, ferro etc., aquela população de mais de 20 milhões de pessoas ficará inerte, vivendo na miséria, e sem cogitar a sua exploração.
Melhor do que adotar a postura outrora vigente de um avestruz, que coloca a cabeça no buraco e não vê o que ocorre ao seu redor, é preciso reconhecer que essa pressão existe e discutir formas realistas de regularizar atividades de forma compatível com a preservação ambiental e submetida ao seu devido licenciamento.
Diversos países do mundo exploram de maneira legal as suas riquezas minerais em locais ambientalmente sensíveis, e isso porque souberam estabelecer regras e parâmetros para tanto. Ao Brasil, se coloca o mesmo desafio, sob pena de não o fazendo abrir espaço para a ilegalidade generalizada e o desrespeito ambiental que tomou conta da região, há décadas.
Além disso, temos também a bioeconomia, que através da lei de repartição de benefícios da biodiversidade, e a ratificação do protocolo de Nagoya, aguardado há anos, abre uma grande possibilidade para que haja investimento na indústria de agregação do produto florestal e da biodiversidade, de forma que a floresta em pé, preservada, tenha mais valor do que a devastada. Para tanto, é preciso mudar a mentalidade até então vigente, avessa à presença do setor privado na Amazônia.
É preciso atrair pequenos, médios e grandes empreendedores para atuar na bioeconomia, gerando emprego e renda para a região. Por fim, a importância de uma fiscalização moderna nas operações de comando e controle de Ibama, ICMBIO, Polícia Federal e Força Nacional, requerem equipes completas e orçamento adequado, que há anos vem se deteriorando.
Ademais. deveriam ser apoiadas pelas polícias militares estaduais, o que nem sempre ocorre, gerando assim a necessidade de contar com o apoio das Forças Armadas, através das operações de GLO – Garantia da Lei e da Ordem. Essas ações são importantes para coibir os crimes ambientais mas devem ser acompanhadas das medidas estruturantes do desenvolvimento sustentável para a região.