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J.R. GUZZO – É proibido pensar

J. R. Guzzo
O Estado de São Paulo
17 Maio 2020

Faz sentido o cidadão brasileiro ser proibido de trabalhar e, ao mesmo tempo, continuar obrigado a pagar impostos, até o último centavo e nem um minuto depois do prazo? É claro que não faz. Mas no Brasil de hoje é cada vez mais perigoso ter a lógica do seu lado – não tente ter razão, porque você será punido.

Experimente, a propósito, pedir ao prefeito Bruno Covas que não cobre a parcela de junho do IPTU, porque há dois meses não entra um tostão no seu bolso. Só a ele? Não: a Covas ou a qualquer outro dos 5 mil prefeitos que há por aí. Vão chamar o guarda municipal, dizer “fique em casa” e lhe socar uma multa no lombo.

Há nestes tempos de covid-19 uma quantidade cada vez maior de coisas que não fazem o menor nexo – mas são consideradas perfeitamente normais pelos que mandam nas 27 repúblicas mais ou menos independentes em que o País foi dividido após a decisão do STF de abolir a federação brasileira em nome da saúde pública.

A epidemia parece ter tornado ilegal a tarefa de pensar. O resultado é não apenas a destruição do sistema de produção, do trabalho e da vida social, mas da liberdade. Quem não concorda com o pensamento único está errado em princípio. Quando as coisas ficam assim, é inevitável a vitória do disparate. 

Sinceramente: você acha possível confiar, de verdade, em figuras como João Doria ou Wilson Witzel? A mesma pergunta poderia ser feita em relação à maioria dos demais governadores, ou aos prefeitos, deputados e senadores. Não é preciso fazer nenhuma pesquisa de Ibope para saber a resposta. Mas o fato é que foi entregue aos políticos o poder de decidir o que é essencial ou não para você. Esqueça o que está escrito na Constituição; são eles que resolvem no momento quais são os seus direitos e quais são suas obrigações. É 100% irracional. 

Acaba de ser aprovada na Câmara dos Deputados, com mais de 250 votos, uma lei vinda do Senado que dá ao síndico do prédio o poder de proibir que os moradores façam festas ou recebam amigos em seus apartamentos – ou deixem os convidados usar o estacionamento de visitas. Nem na Alemanha de Hitler ou na Rússia de Stalin há registro de algo parecido.

Leitos são retirados de hospitais públicos e transferidos para “hospitais de campanha” – onde passam a ser explorados por ONGs privadas, que recebem dinheiro do erário para fazer isso. Não se pede comprovação para qualquer coisa que é dita por um militante do “distanciamento social” – o governador Doria, por exemplo, disse que salvou “25 mil vidas” com as medidas que tomou. Fica por isso mesmo.

Passou a valer no Brasil a ideia de que a atividade econômica mata pessoas. O cidadão é proibido de circular de carro, ir à academia de ginástica ou cortar o cabelo no barbeiro, mas permite-se que ônibus e metrôs circulem superlotados. O prefeito Covas ameaça repetidamente os paulistanos com as proibições maciças de um lockdown (tem preguiça, até, de pensar em português) sem fornecer a mais remota demonstração científica de que isso sirva para alguma coisa útil.

Ao contrário: em Nova York, a cidade mais atingida pela epidemia em todo o mundo, mais de 80% das vítimas da covid-19 estavam em casa, cumprindo quarentena, quando foram infectadas. Os políticos que passaram a dar ordens na sua vida são os mesmos que se recusam a suspender os salários do funcionalismo público. Não só isso: acabam de dar aumento à polícia do DF, onde um soldado ganha a partir de agora R$ 6,5 mil por mês. 

Num país onde o presidente já teve três ministros da Saúde em dois meses e exibe a cada dia sua incapacidade de governar em meio a dificuldades, não poderia haver combinação pior.

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