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O que representam as fugas de presos ligados ao PCC no Paraguai e no Acre

Duas fugas e em apenas dois dias dezenas de membros da facção criminosa Primeiro Comando da Capital (PCC) estão nas ruas novamente. Primeiro, 76 homens fugiram de um presídio em Pedro Juan Caballero, no Paraguai, por um túnel. Depois, outros 25 escaparam da Penitenciária Doutor Francisco D'Oliveira Conde, no Acre.

No Paraguai, o diretor do presídio e 30 agentes penitenciários foram presos e serão investigados sob a suspeita de colaborarem com a fuga. Mas o que simbolizam essas fugas para a maior facção criminosa do Brasil?

O desembargador aposentado Wálter Maierovitch, fundador do Instituto Brasileiro Giovanni Falcone de Ciências Criminais, acredita que as fugas podem ter sido coordenadas e que são uma demonstração de força da facção fundada em 1993.

"Talvez essas ações em outros países sejam sinais de força e de que o PCC quer uma tratativa com o governo. Talvez para forçar a volta dos líderes (transferidos para presídios federais) para São Paulo. Ou menos policiamento em certas áreas", afirmou.

Por outro lado, ele diz que será um "grave erro" se o governo aceitar ou der publicidade a casos como esses.

"Seria um erro negociar. Não se faz tratativas com o crime organizado. Quando houve tratativas entre o Estado e a máfia na Itália não deu certo. O crime se sentiu mais forte e declarou guerra", afirmou.

Já Bruno Paes Manso, pesquisador do Núcleo de Estudos da Violência da USP e um dos autores do livro A Guerra: a ascensão do PCC e o mundo do crime no Brasil (Ed. Todavia), vê as fugas como algo natural e que ainda não é possível dizer se foram coordenadas.

"Nesses 25 anos de PCC e quase 40 anos da facção Comando Vermelho o objetivo de quem está preso é fugir. As fugas são muito valorizadas e algumas vezes custam caro, por conta da engenharia e até pagamento de propina para funcionários", afirmou.

O pesquisador da USP conta que a novidade nesta fuga do Paraguai é haver pela primeira vez um resultado claro da presença do PCC no sistema penitenciário do país. Ele explica que a facção paulista tem uma leitura de segurança pública de guerra contra o sistema e de crescer nas brechas do sistema, com uma atuação considerada violenta.

"Já o Paraguai", aponta Manso, "tem relação mais orgânica com o crime, como a venda de cigarros para contrabando ou até mesmo de maconha". Isso ocorre, explica ele, porque essa economia informal de venda, incluindo armas e outros produtos, gera muitos empregos e faz com que os chefes dessas estruturas sejam bem reconhecidos.

"Agora, o PCC chega com uma postura de guerra ao sistema. E eles tentando aprender lidar com isso. É um grupo forjado na segurança, na guerra antissistema tentando dominar o crime de um país onde o sistema era em conjunto com política e mercado", afirmou o pesquisador da USP.

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Facção em expansão

De acordo com o jurista Maierovitch, o PCC atua hoje 22 Estados brasileiros e possui cerca de 30 mil membros. Só em São Paulo, são 8 mil. Para ele, isso demonstra uma "expansão impressionante" e um indicativo de que o grupo pode se tornar uma organização tão poderosa a ponto de ser considerada uma máfia.

Na avaliação dele, após a onda de ataques que promoveu em 2006, o PCC ganhou mais força e "se tornou uma organização pré-mafiosa". "Hoje, tem controle de território, social e difunde o medo, além de poder ter influência eleitoral, assim como teve a Marcha da Sicília em favor do partido da Democracia Cristã na Itália", afirmou.

Para ele, apesar de uma transnacionalidade das atividades do PCC, como Paraguai, Bolívia e alianças com colombianos, ainda falta uma atuação maior em outros países para que o grupo seja considerado, de fato, uma máfia. Mas, acrescenta, o PCC "caminha a passos largos" para se tornar uma organização mafiosa e talvez não tenha atingido esse nível porque não tem o "intelecto necessário".

"Hoje, a máfia mais forte é a 'Ndrangheta calabresa, que foi descoberta operando na bolsa de Frankfurt. O que o PCC tem hoje nessa dimensão? O que deve ser feito para evitar chegar nesse ponto é atacar a economia do crime organizado. Precisa de mais policiais infiltrados para saber onde o PCC lava dinheiro para sufocá-lo", afirmou.

Já Bruno Paes Manso não acredita que isso deva acontecer com o PCC. Um dos entraves, no ponto de vista dele, é a dificuldade do grupo fazer alianças nos cargos políticos e instituições de maior representatividade pública.

"Uma máfia demanda uma conivência das instituições. E eu tenho um certo ceticismo de até que ponto eles têm isso, apesar de ter poder financeiro para corromper agentes do Estado. O PCC é visto hoje como o grande inimigo brasileiro. No Brasil, querem que os bandidos morram, sejam exterminados e quando um parlamentar é visto facilitando a vida da facção costuma ser escorraçado", afirmou.

O pesquisador da USP afirma que a situação é diferente, no entanto, em relação às milícias. Isso porque esses grupos, segundo ele, têm capacidade de influenciar moradores e fazerem o discurso de propiciar mais segurança, além de uma maior capacidade de influenciar na política.

"A máfia iria mais para o lado das milícias. Acho que esse seria o caminho mais brasileiro porque o PCC é mais uma federação que regulamenta a compra e venda de drogas. Já as milícias têm o discurso de combate ao crime, mas também ganham dinheiro com ele. Elas possuem uma proposta de Estado em permanente combate ao crime, mas que lucra muito com ele", afirmou.

Os dois especialistas concordam, no entanto, que a saída é sufocar as finanças e diminuir as margens de lucro para que as facções tenham menos poder.

"O PCC tem investido em vendas para fora do país. Ele tem acesso a exportação via porto de Santos e consolidou receitas no Paraguai, além de ter expandido para outros lugares", disse Bruno Paes Manso.

Para Maierovitch, é necessário entender a dimensão financeira do PCC, não negociar de forma alguma e evitar confrontos políticos ou divulgações. Ele cita especialmente a fala do ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro, que, em uma publicação no Twitter disse que se os fugitivos do PCC "voltarem ao Brasil, ganham passagem só de ida para presídio federal."

"Não se responde ao crime. O que se viu de musculatura do PCC hoje é algo de um gigante. Esse tipo de bravata de facção não se responde, mas se age. Podem ser pessoas inexpressivas fugindo. Essa atitude é um populismo equivocado apenas para mostrar para a população e jogar para torcida", afirmou o desembargador aposentado.

 

 

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