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Morto pelos EUA, general era herói no Irã

Morto em um ataque calculado americano nesta sexta-feira (03/01) em Bagdá, Qassim Soleimani era considerado por muitos como a segunda pessoa mais poderosa do Irã, atrás apenas do líder supremo Ali Khamenei, e, provavelmente, à frente do presidente Hassan Rohani. 

O comandante era líder da poderosa Força Quds da Guarda Revolucionária iraniana, unidade de elite responsável pelo serviço de inteligência e por conduzir operações militares secretas no exterior.

A Força Quds apoia, por exemplo, grupos que atuam à margem do Estado em muitos países do Oriente Médio, como o Hisbolá libanês, o Hamas e a Jihad Islâmica Palestina na Faixa de Gaza e na Cisjordânia, os Houthis no Iêmen e milícias xiitas no Iraque, Síria e Afeganistão.

"Soleimani é o agente mais poderoso do Oriente Médio hoje, e ninguém nunca ouviu falar dele", disse um ex-agente da CIA (a agência de inteligência americana) no Iraque à revista New Yorker em 2013.

Para o Irã, a morte de Soleimani representa a perda de um ícone cultural, que simbolizava o orgulho nacional e a resiliência enquanto o país enfrentava os EUA e suas sanções.

Embora tenha tido o cuidado de evitar envolver-se publicamente na política, a figura de Soleimani ganhou com os anos importância perante as forças americanas e israelenses, que atribuem a ele os vários ataques por procuração iranianos no Oriente Médio.

Soleimani, que sobreviveu a várias tentativas de assassinato nas últimas décadas arquitetadas por americanos, israelenses e potências árabes, ganhou status de herói em seu país. 

"A sua estratégia foi construída com base na ideia de defesa avançada, que era afastar as ameaças da fronteira iraniana. Ele construiu fortes laços com o Hisbolá no Líbano e com grupos de milícias no Iraque", explica a especialista Sanam Vakil. "Essa estratégia expandiu a influência do Irã de uma forma pouco convencional e desestabilizadora em toda a região, mas protegeu o Irã e deu alavancagem a Teerã em alguns países."

As forças armadas convencionais do Irã sofrem há 40 anos com sanções americanas, mas a força de elite de Soleimani conseguiu com sucesso construir um programa de míssil balístico. A Força Quds pode, além disso, atacar na região através de forças como o Hisbolá do Líbano e os rebeldes Houthis do Iêmen. 

Como chefe da Quds, Soleimani liderou todas as ações secretas iranianas das últimas décadas e frequentemente se deslocou entre o Iraque, o Líbano e a Síria. Os membros da Força Quds foram, por exemplo, destacados para a longa guerra da Síria para apoiar o presidente Bashar al-Assad, bem como para o Iraque na sequência da invasão americana de 2003 que derrubou o ditador Saddam Hussein, um inimigo de longa data de Teerã.

Muitos consideram que Soleimani era a segunda pessoa mais poderosa do Irã, atrás apenas de Khamenei, e, provavelmente, à frente do presidente Hassan Rohani. Através de uma mistura de operações secretas e coerção diplomática, ele foi mais responsável do que ninguém no país por projetar a influência do Irã na região.

Soleimani juntou-se à Guarda Revolucionária em 1979, quando o aiatolá Khomenei voltou ao Irã e desencadeou a queda do xá, no que viria a ser conhecido como a Revolução Islâmica.

Ele conseguiu sobreviver à brutal guerra entre o Irã e o Iraque durante a década de 1980 para assumir o controle da Força Quds de elite da Guarda Revolucionária na década de 1990. No entanto, ele só ganharia notoriedade pública com a invasão do Iraque, liderada pelos EUA em 2003.

O general iraniano foi responsável pela supervisão das táticas do Hisbolá durante a guerra de 2006 com Israel e é considerado o arquiteto de um acordo de cessar-fogo entre milícias xiitas e os militares iraquianos em 2008.

As autoridades americanas descrevem Soleimani como uma peça central para ambições iranianas na região. De acordo com o ex-diretor geral da CIA David Petreaus, Soleimani disse-lhe uma vez: "General Petreaus, você deve saber que eu, Qassem Soleimani, controlo a política do Irã em relação ao Iraque, Líbano, Gaza e Afeganistão."

Na Síria, por exemplo, as suas forças apoiaram os combatentes do regime na luta bem sucedida contra o território rebelde e no desenraizamento de grupos extremistas islâmicos sunitas, incluindo o "Estado islâmico". Analista veterano do Oriente Médio e autor de um livro sobre o "Estado Islâmico", Hassan Hassan avaliou que sua morte enfraquece as aspirações regionais do Irã, mais notavelmente na Síria.

"As oportunidades para o Irã na Síria são muitas vezes maiores quando combinadas com a consolidação no Iraque e no Líbano," escreve Hassan no Twitter. "Recentemente, vimos o que o Irã pode fazer. Mas, agora, a sua capacidade de capturar a Síria está enfraquecida".

A escalada de tensão ocorre no momento em que o Iraque já estava à beira de uma guerra por procuração de potências da região, e pouco depois de um cerco de dois dias à embaixada dos EUA em Badgá por uma multidão de militantes iraquianos. O Pentágono acusou Soleimani de ter coordenado o ataque.

"É impossível o Irã não responder à morte de Soleimani"

Soleimani, líder da poderosa Força Quds da Guarda Revolucionária iraniana, foi morto nesta sexta-feira (03/01) por um bombardeio americano em Bagdá ordenado por Donald Trump.

O general Soleimani era chefe da unidade de elite responsável pelo serviço de inteligência do Irã e por conduzir operações militares secretas no exterior.

Para Sanam Vakil, vice-chefe e pesquisadora sênior do programa para Oriente Médio e Norte da África o instituto Chatham House de Londres, uma resposta iraniana à morte do general é inevitável.

Em entrevista à DW, ela diz que uma escalada na região é provável, sobretudo no Iraque, e no momento considera difícil evitar um conflito militar total entre Teerã e Washington.

DW: Qual é a importância de Soleimani no Irã?

Sanam Vakil: Qassim Soleimani era um estrategista e general muito bem sucedido e desenvolveu a doutrina atual da política externa iraniana. Acredita-se que a doutrina tenha obtido muito sucesso ao afastar as ameaças das fronteiras iranianas e fortalecer as relações assimétricas de Teerã com atores não estatais em todo o Oriente Médio.

Soleimani tinha uma relação muito próxima com o líder supremo do Irã. No entanto, o general trabalhava dentro do sistema da Guarda Revolucionária.  A sua morte vai ser incrivelmente celebrada e lamentada ao mesmo tempo dentro do Irã. E vai ser quase impossível para a República Islâmica não responder ao seu assassinato.

Qual era a estratégia de Soleimani?

A sua estratégia foi construída com base na ideia de defesa avançada, que era afastar as ameaças da fronteira iraniana. Ele construiu fortes laços com o Hisbolá no Líbano e com grupos de milícias no Iraque. Essa estratégia expandiu a influência do Irã de uma forma muito pouco convencional e desestabilizadora em toda a região, mas protegeu o Irã e deu alavancagem a Teerã em alguns países.

O que esperar do Irã agora?

É muito complicado agora prever a resposta imediata iraniana. Eu acho que provavelmente o primeiro passo do governo iraniano será lamentar a morte de Qassim Soleimani e fazer uma grande cerimônia de luto por ele. Ao mesmo tempo, eles vão planejar como responder à morte. Será impossível para o governo iraniano não responder à sua morte. Portanto, a questão é na verdade é como será essa resposta.

Penso que vai haver uma série de consequências que poderemos ver nos próximos dias. Primeiro de tudo, a escalada no Iraque é a forma mais provável que eu acho que os iranianos vão responder. Este é um lugar que já está em conflito e que tem um vácuo de poder.

Outra possibilidade é aumentar a atividade de enriquecimento de urânio. Ao mesmo tempo, não podemos ignorar que o Irã pode começar a atacar navios no Golfo Pérsico e pode até atacar um país do Golfo Árabe com mísseis, semelhante aos ataques de 14 de setembro.

Por que os EUA mataram Soleimani?

O ataque foi preventivo. Foi baseado no fato de que as agências de inteligência dos EUA tinham informações sugerindo que Soleimani estava planejando novos ataques a funcionários do governo e militares dos EUA no Oriente Médio. Mas não tenho certeza se o governo americano pensou em algumas das consequências potenciais da sua ação ou se está preparado para proteger os seus militares das consequências deste conflito se o Iraque virar uma zona de guerra, com mísseis iranianos atacando bases americanas e mais perdas de vidas americanas. É muito difícil não ver um conflito militar total entre Teerã e Washington.

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