J.R. Guzzo
Estado de S.Paulo
8 dezembro 2019
Vamos combinar uma coisa, desde já: ainda não foi inventada neste mundo uma maneira mais eficaz de concentrar renda, preservar a pobreza e promover a desigualdade do que negar ao povo jovem uma educação decente – apenas decente, só isso. Vamos combinar mais uma coisa: só há uma chance na vida de adquirir os conhecimentos básicos para a melhoria da condição social de quem nasceu pobre, e essa chance é a escola básica.
Se for perdida, ela não volta nunca mais; é perfeitamente inútil ficar falando em “resgate da pobreza”, “ascensão social”, “mais igualdade” e outros requisitos para um “mundo mais justo” depois que o garoto saiu da escola e não aprendeu o que deveria ter aprendido. Não é preciso ser nenhuma Finlândia, Cingapura e outros parques temáticos sociais que enfeitam nosso planeta. Basta o cidadão aprender o suficiente para fazer as operações essenciais da matemática, distinguir física de química e entender o que leu numa página escrita em linguagem corrente.
Há um acordo geral sobre essas realidades? Se houver, é bom já ir se acostumando com o seguinte fato: praticamente todas as ideias que circulam por aí para melhorar o Brasil são a mais pura e lamentável perda de tempo.
O que adianta esquentar a cabeça discutindo se o deputado Rodrigo Maia vai salvar a República dos perigos da “polarização”? Ou se os gigantes da nossa “engenharia política”, seja isso lá o que for, vão bater um suco de Lula com Luciano Huck, misturar tudo o que há no meio, e tirar daí o segredo do centro-esquerda-moderado-sociológico-popular que vai levar os 200 milhões de brasileiros direto para o céu? Adianta três vezes zero.
Não vai adiantar nunca, quando ninguém mais se lembra, entre todos os condes e viscondes da política e das classes intelectuais deste País, da calamidade social que nos foi anunciada há menos de uma semana. Que calamidade? Coisa simples: na última e mais respeitada avaliação da qualidade da educação no mundo, feita em 2018 em 79 países, o Brasil ficou entre os 20 piores. Nossos jovens, para resumir a ópera, não sabem nada de matemática, ciências e leitura – ou nada que preste para alguma coisa realmente útil. Não há horizonte viável num país assim, é claro. Mas como ninguém está ligando, é assim que o País vai continuar.
Mudar como, se a elite que se diz responsável, pensante e equilibrada continua achando que o grande problema da educação no Brasil é o ministro Weintraub? Que diabo ele tem a ver com o desastre dos últimos 30 ou 40 anos – mesmo que seja o pior ministro de Educação do mundo?
Vamos continuar nos queixando, nas mesas-redondas de televisão e nas palestras para empresários, que o Brasil é um país injusto, que temos de “distribuir renda”, que é preciso dialogar com as “comunidades”, etc. etc – mas ninguém quer ensinar a moçada a somar fração, perceber o que é um átomo ou entender o que está escrito num texto de quinze linhas, mesmo porque há uma multidão que não sabe escrever um texto de quinze linhas.
É inútil, como fazem nove entre dez políticos, comunicadores e cientistas sociais, querer que as pessoas tenham igualdade nos resultados quando não são iguais nos méritos. Não há como ser igual nos méritos, ao mesmo tempo, se o sujeito que sabe menos não teve oportunidades iguais de aprender as coisas que foram aprendidas pelo sujeito que sabe mais.
É tolo supor que quem sabe menos pode ganhar o mesmo que quem sabe mais, ou ter as mesmas recompensas na vida – tão tolo como achar que você vai ser contratado pelo Real Madrid porque joga futebol com a turma do prédio. A igualdade não é um direito – é o resultado do que o cidadão aprendeu. Não há “políticas públicas”, nem “vontade política”, que possam resolver isso.