Maj Rodolfo Leonardo Borges Carneiro Amorim
Apesar de nos últimos anos o Brasil ter apresentado um crescimento econômico pouco expressivo, a abundância de recursos como energia, alimentos e matérias-primas é fator que contribui para um crescimento sustentado. Entretanto, nos anos de 2007 e 2008, a capacidade militar brasileira para defesa de suas riquezas estava em níveis muito baixos.
Com um efetivo de cerca de 300.000 militares, as Forças Armadas eram praticamente estáticas e apresentavam dificuldades de manutenção do material obsoleto e de falta de treinamento adequado de seus quadros1.
Enquanto isso, no entorno, o Chile destacava-se com uma força armada moderna e bem treinada. A Venezuela adquiria armamentos, navios e aviões militares modernos e fomentava alianças estratégicas com Cuba, Equador, Bolívia e Nicarágua2. O Brasil estava prestes a perder sua posição de destaque como principal potência militar da região3.
Essa realidade causou reação do governo brasileiro. Recursos foram liberados para concluir projetos antigos: submarino nuclear, mísseis de cruzeiro, satélite geoestacionário e fortalecimento da indústria nacional de defesa. Desde então, o orçamento militar foi aumentado em cerca de 50% e o gasto do PIB, com defesa, tem se mantido em uma média de 1,6%4, possibilitando a aprovação de programas de equipamentos para as forças militares.
A Política Nacional de Defesa (PND) aponta que, apesar do Brasil não ter nenhum inimigo que possa ameaçá-lo, o contexto mundial de diminuição de recursos minerais, alimentos e energia constitui rico potencial5.
O objetivo central da PND é de garantir, pela via militar, uma resposta à agressão externa. Para tanto, é necessário que o Brasil possua ferramentas militares para proteção dos seus interesses, no território nacional ou no exterior. Contudo, em longos períodos de paz, aparenta desnecessária a ideia de manutenção de um aparato de defesa.
A Estratégia Nacional de Defesa (END), complemento fundamental à PND, introduz o conceito de capacidades como norteador para o planejamento de longo prazo da defesa nacional. As capacidades substituem a noção de inimigo no planejamento, e as compras de equipamentos passam a ser baseadas em necessidades reais e não em oportunidades6.
Capacidade para responder às novas demandas, como resultado do surgimento de novos autores e problemas: o terrorismo, o narcotráfico nas fronteiras, a descoberta de reservas de petróleo no pré-sal, a soberania da Amazônia, dentre outras demandas7.
A END enfatiza, ainda, a necessidade de uma maior integração entre civis e militares na análise e elaboração de políticas de defesa para o País8. O propósito é romper o conceito de segurança nacional que atribui, exclusivamente, às Forças Armadas o seu papel de “tutora”9, ampliando o debate com a sociedade civil e a universidade, que têm papel fundamental na geração de pesquisas e novas tecnologias.
Para que também possa alcançar credibilidade como ator capaz de influenciar as decisões globais, o Brasil precisa adquirir instrumentos adequados de projeção de poder “por ar, água e terra”. Dessa forma, terá a capacidade de participar de ações militares com equipamentos modernos e compatíveis aos utilizados pelas potências mundiais. Entretanto, para um País com limitações econômicas, parece ser impossível ser forte em todos os setores, o que demanda o estabelecimento de prioridades para defesa.
As prioridades mais adequadas, no momento, são a negação do uso dos mares brasileiros por potências hostis, a vigilância e o controle do espaço aéreo e a criação de brigadas móveis e flexíveis para ação imediata em todo o território nacional, com prioridade para o norte do Brasil10.
A aquisição e o desenvolvimento de materiais bélicos inovadores – submarinos, viaturas e aeronaves – contribuirão para as Forças Armadas atingirem um novo patamar operacional e tecnológico. Da mesma forma, concede capacidade para opor-se às “novas ameaças” quando a situação exigir, de fato, o emprego do poder militar em sua plenitude para salvaguardar o patrimônio, o território, a soberania e os interesses vitais do País11.
Assim, para alcançar um nível adequado de dissuasão, a Marinha do Brasil deve possuir esquadras compostas por submarinos convencionais e nucleares, assim como navios aeródromos e fragatas aptas a impedir o livre uso do mar por uma potência oponente. Esses meios serão apoiados pela Força Aérea Brasileira, dotada de modernas aeronaves capazes, também, de apoiar a mobilidade da Força Terrestre pelo transporte aeroestratégico e contribuir para o monitoramento e controle aeroespacial, naval e terrestre.
As Forças Armadas brasileiras devem estar aptas para lançar mísseis guiados e de cruzeiro, por plataformas aéreas, marítimas e terrestres e ter uma artilharia antiaérea capaz de proteger suas infraestruturas críticas. Sempre que possível, Marinha, Exército e Aeronáutica devem ser capazes de constituírem forças conjuntas, com meios navais, terrestres e aéreos12.
Em síntese, aumentar a capacidade militar do Brasil implica ter poder adequado para proteger o território e o espaço aéreo nacional contra possível intimidação. Infere-se, ainda, a necessidade de uma maior integração entre civis e militares na análise e elaboração de uma mentalidade de defesa nacional; nesse aspecto, foi fundamental a publicação tanto da Política quanto da Estratégia Nacional de Defesa.
Enfim, em face das peculiaridades das novas demandas, ressalta-se que para cumprir sua destinação constitucional, as Forças Armadas devem organizar-se em torno de capacidades militares para alcançarem credibilidade e aptidão dissuasória contra qualquer ameaça à nossa soberania.
REFERÊNCIAS
- BERTONHA, João Fábio. Brasil: uma potência militar emergente? O problema do uso da força nas Relações Internacionais do Brasil no século 21. Revista Brasileira de Política Internacional, v. 53, n. 2, p. 107-124, 2010.
- OLIVEIRA, Eliézer Rizzo. A estratégia nacional de defesa e a reorganização e transformação das Forças Armadas. Interesse Nacional, p. 71-83, abr/jun. 2009.
- BERTONHA, op. cit., p. 117.
- ALMEIDA, Carlos Wellington de. Política de defesa no Brasil: considerações do ponto de vista das políticas públicas. Opinião Pública, v. 16, n. 1, p. 220-250, 2010.
- BRASIL. Ministério da Defesa. Política Nacional de Defesa. Brasília, DF, 2016.
- BERTONHA, op. cit., p. 118.
- BRASIL. Ministério da Defesa. Estratégia Nacional de Defesa. Brasília, DF, 2016.
- AMORIM NETO, Octavio. The Impact of Civilians on Defense Policy in New Democracies: The Case of Brazil. Latin American Politics and Society, p. 1-28, 2019.
- ALMEIDA, op.cit., p. 241.
- BERTONHA, op. cit., p. 118.
- PAIVA, Luiz Eduardo Rocha. O Presente e o Futuro da Dissuasão Brasileira. In FILHO, E. B. S.; MORAES, R.F. Defesa Nacional para o Século XXI: Política Internacional, Estratégia e Tecnologia Militar. Rio de Janeiro: IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), 2012.
- Ibid., p. 336-337.
Sobre autor: Atualmente, o Major de Infantaria Rodolfo Leonardo Borges Carneiro Amorim é aluno da Escola de Comando e Estado-Maior do Exército, e mestrando do Instituto de Meira Mattos/ECEME. É da turma de 2003 da Academia Militar das Agulhas Negras. Dentro os principais cursos realizados na carreira, destaca o Curso de Pós-Graduação em Direito Militar (FADISMA, em 2006); Curso de Instrutor de Educação Física (EsEFEx, em 2007); e Curso de Aperfeiçoamento de Oficiais (EsAO, em 2012). As últimas funções exercidas foram de Chefe da Seção de Pessoal do 35º Batalhão de Infantaria (Feira de Santana–BA, 2013 e 2014) e de instrutor da Academia Militar das Agulhas Negras (Resende-RJ, 2015 a 2018).