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GHBR – Conselho Mundial de Igrejas novamente em campo contra o Brasil


Jamil Chade
Colaborou Victória Damasceno
publicado UOL 29 Agosto 2019

 
GENEBRA – Uma versão fundamentalista do cristianismo está legitimando medidas do governo Bolsonaro que vão justamente contra as bases da religião — entre elas a discriminação, violação aos direitos humanos e mesmo a proteção do planeta. O alerta está sendo feito por parte das igrejas nacionais que, alarmadas com a situação no país, se reuniram na Suíça para debater o cenário religioso no Brasil e pedir a ajuda do Conselho Mundial de Igrejas para que uma estratégia seja estabelecida.

Nos anos 70, o Conselho Mundial de Igrejas foi fundamental para bancar as ações de religiosos no Brasil que lutavam contra a ditadura. Entre as várias iniciativas, o grupo financiou os trabalhos da coleta de dados de vítimas e torturadores, que acabaria sendo conhecida como "Brasil: Nunca Mais".

Agora, a organização ecumênica considera que a situação de direitos humanos no Brasil voltou a ser problemática, principalmente quando há uma utilização da religião para legitimar a retirada de direitos.

Entre uma parcela das igrejas brasileiras, a constatação é de que, sozinhas, não terão a capacidade de se organizar para fazer frente às tendências políticas atuais. Portanto, pedem a ajuda das igrejas de todo o mundo.

Em sua maioria, os participantes do encontro foram de igrejas protestantes, mas a reunião também contou com um representante da Confederação Nacional dos Bispos Brasileiros (CNBB).

Família "foi colocada como desculpa"

O reverendo Agnaldo Gomes também constata os desafios dos grupos religiosos. "Como igreja, precisamos primeiro pedir perdão por nossa omissão durante tanto tempo", declarou o presidente da Aliança das Igrejas Presbiterianas e Reformadas da América Latina (AIPRAL). "E sobre o silêncio dos que não tiveram a coragem de se expressar claramente. Estão se apequenando. Precisamos fazer o evangelho ser ouvido", disse.

Segundo ele, o caminho terá de ser o do diálogo, inclusive com não-cristãos. "No Brasil, estamos tentando entender o que acontece", disse. "De fato, estamos num caldeirão em efervescência e talvez não estejamos temos clareza da dimensão de tudo que está ocorrendo", afirmou.

Assim como outros participantes do encontro, seu temor é o de se legitimar, com a igreja, comportamentos discriminatórias.

Segundo ele, a defesa da família foi colocada "como a grande desculpa", inclusive na campanha eleitoral. "Mas isso é apenas a fachada. O que se tem é a retirada de direitos", alertou. "Os evangélicos estão sendo usados como margem de manobra", completou.

Repercussão no Brasil

O reverendo Welerson Alves Duarte, presidente da Assembleia Geral da Igreja Presbiteriana Conservadora do Brasil, discorda com as colocações levadas à Genebra. Para ele é importante entender com profundidade o que as pessoas entendem hoje por fundamentalismo, pois "o conceito está distorcido". "Nós usamos para caracterizar aqueles que têm suas práticas fundamentadas na Bíblia, independentemente do que diz a política", diz.

Para exemplificar, o pastor utiliza as pautas LGBTs, que estavam no centro da discussão na reunião com o CMI. "A concepção que nós vemos na bíblia é que família é a união entre homens e mulheres. A prática homossexual não é correta, não é que a Deus criou originalmente, mas nem por isso vamos discriminar o homossexual", diz. "As pessoas deturpam o conceito para nos chamarmos de homofóbicos, e eu não sou. Tenho boas relações com pessoas que são", diz, mas faz a ressalva de que um homosexual não poderia se tornar membro da sua congregação.

Também debatido entre ministros presentes na reunião, a ideia de que a mistura entre a religião e a política é uma má ideia, reverbera no Pastor Edmilson Vila Nova, presidente da Convenção Batista Nacional. "Ao longo da história vemos que todas as vezes que a igreja se alinhou com o poder político isso foi muito danoso. Isso é danoso para igreja e para a sociedade. A fé cristã não se dá por atos políticos."

As igrejas batistas protestantes são popularmente conhecidas por serem uma denominação mais liberal em relação às demais denominações evangélicas. Nesse sentido, o pastor acredita que o momento em que o Brasil vive é muito mais "liberal do que fundamentalista", e que as pautas relacionadas aos direitos humanos "não estão sendo banalizadas" pela igreja.

"As pessoas devem ser respeitadas independentemente da religião, da cor ou da opção sexual, e todos devem ser livres para emitir opiniões, inclusive igrejas", diz, para elucidar que condenar a práticas LGBTs e pautas feministas como o aborto é "condenar o pecado, e não o indivíduo".

A separação entre o Estado e a Igreja, é tema também defendido pelo pastor Joel Müller, presidente interino da Igreja Evangélica Luterana no Brasil. Por outro lado, o pastor participou do encontro com a Frente Parlamentar Evangélica em Brasília no último dia 8. A reunião, liderada pelo deputado Silas Câmara, terminou em um encontro com o presidente Jair Bolsonaro, acompanhado pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, e da Casa Civil, Onyx Lorenzoni.

Ele reverbera que o fundamentalismo é danoso, por impor o "tradicionalismo de forma preconceituosa e a imposição da fé da Igreja ao Estado". "Usar a religião para violar direitos humanos é um equívoco, a menos que haja deturpação das Escrituras Sagradas", diz.

Mas pondera."A Bíblia não nos autoriza o racismo, sexismo ou outra forma de preconceito, mas não pode ser usado como manual de sociologia, pois se trata da Revelação de Deus e da sua obra de criação e salvação da humanidade, essencialmente no relacionamento deste Deus criado com o seu povo", conclui.
 

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