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Em meio à crise, EUA arquivam planos de abrir consulados no Iraque

Além da retirada final das tropas do Iraque que o presidente americano, Barack Obama, anunciou na sexta-feira, problemas fiscais nos Estados Unidos estão forçando uma redução drástica nos planos de programas diplomáticos e culturais, antes considerados vitais para acalmar o Iraque e afastar o país do Irã.

Nos últimos meses, o Departamento de Estado planejava estabelecer um consulado na cidade ainda inquieta de Mosul, com 700 funcionários e equipe de segurança e avançavam com planos para a criação de um consulado na cidade etnicamente dividida e potencialmente explosiva de Kirkuk.

Esses projetos já foram arquivados ou indefinidamente adiados, e pedidos de alguns líderes iraquianos para abrir consulados no sul dominado pelos xiitas, onde o Irã exerce influência desmedida, foram rejeitados.

Em conjunto, a redução da escala das ambições americanas tanto para sua influência militar quanto cultural enfatiza a realidade de que um Iraque pós-América está tomando forma mais rápida e completamente do que muitos iraquianos e americanos tinham imaginado. Essa realidade tem animado muitos iraquianos e americanos, cansados de mais de oito anos de guerra e ocupação, mas outros estão com medo.

"Os EUA não deveriam dar as costas ao Iraque", disse Labid Abawi, vice-chanceler do país, em entrevista neste sábado. "O Iraque precisa dos EUA, e os EUA precisam do Iraque."

A mudança na relação acontece em um momento delicado para o Iraque e a sua região. O Iraque encontra-se rodeado por nações que passam por mudanças significativas.

O Irã, que há muito tem procurado aumentar sua influência sobre seu vizinho, tem sido encorajado pela Primavera Árabe, que tem derrubado ou reduzido o poder de vários líderes de tendência ocidental. A Síria, por sua vez, vem sofrendo meses de agitação a qual os líderes iraquianos temem poder cruzar a fronteira e reabrir o que antes era uma via para combatentes da Al-Qaeda.

Internamente, muitas questões permanecem sem solução. Vinte meses após uma eleição nacional, os principais blocos políticos do país não conseguem concordar sobre quem deve comandar os ministérios da Defesa e do Interior. O Parlamento ainda não aprovou uma legislação sobre como as receitas do petróleo e do gás do país devem ser divididas – anos depois de o governo Bush (2001-2009) ter estabelecido que tal lei seria essencial para o progresso.

A questão para saber se Bagdá ou a região curda deve manter o domínio sobre Kirkuk também permanece sem solução.

Autoridades dos EUA enfatizam que ainda planejam um grande aumento em programas diplomáticos e culturais – fundamentos do chamado soft power – que disseminarão escritórios americanos por todo o país na maior missão diplomática desde o Plano Marshall.

No sábado, a secretária de Estado Hillary Clinton ressaltou os laços que continuarão a existir entre os dois países – e emitiu o que pareceu ser uma advertência velada ao Irã.

"À medida que abrimos esse novo capítulo de um relacionamento com um Iraque soberano, aos iraquianos nós dizemos: 'A América está com vocês e irá ajudá-los nos próximos passos de sua jornada para proteger a sua democracia’", disse a repórteres em Dushanbe, Tajiquistão. "E aos países da região, especialmente os vizinhos do Iraque, queremos enfatizar que a América vai estar ao lado de seus aliados e amigos, incluindo o Iraque, na defesa da nossa segurança e dos nossos interesses."

Mas a expansão de uma presença diplomática será muito menor do que se imaginava, vítima não apenas de restrições orçamentais, mas também de uma consciência crescente de que a decisão de terminar uma presença militar americana torna muito mais difícil para os diplomatas realizar seu trabalho em segurança. O anúncio de Obama na sexta-feira foi uma reviravolta em relação ao início desse ano, quando oficiais militares recomendaram manter até 20 mil soldados no Iraque em 2012.

Christopher R. Hill, um ex-embaixador dos EUA no Iraque, teme que mesmo uma presença menos expansiva possa ser arriscada.

"Eu e muitas outros tememos a sustentabilidade de manter tantos diplomatas em tantos lugares distantes", disse. "Se você não tem liberdade de movimento, voltamos à questão de saber se vale a pena o esforço do orçamento e o risco pessoal de manter esses oficiais lá."

As reações em Bagdá na sexta-feira à noite e sábado, após as declarações de Obama, foram silenciosas, um reflexo possível de uma mistura de emoções no país.

Muitos iraquianos – especialmente os curdos étnicos, intelectuais seculares e sunitas incomodados com o poder xiita – manifestaram ansiedade sobre o que o país pode se tornar sem uma presença militar dos EUA.

"O anúncio de Obama de retirar todas as tropas americanas é uma vitória para os iraquianos, mas temos de estar conscientes da influência iraniana e suas tentativa de exercer controle sobre o Iraque", disse Haidar al-Mulla, porta-voz e legislador do Iraqiya, o bloco político que ganhou a maioria dos assentos nas eleições parlamentares do ano passado.

Mas outros, como aqueles que comemoraram recentemente o fechamento de uma base americana em Mosul, veem apenas oportunidades nos sinais crescentes de que os EUA estão realmente partindo. Estudantes, poetas e autoridades locais levantaram a bandeira iraquiana na segunda-feira e seguravam cartazes onde se lia: "Parabéns à cidade de Mosul nesse grande dia, o último soldado ocupante partiu."

O Sheik Shakir Ghalib disse: "O dia do fim da ocupação traz uma felicidade tão grande que não posso descrevê-lo. A felicidade é imensa para mim. Conforme eu vejo o povo da minha cidade comemorar a saída dos americanos da cidade de profetas, meus olhos choram e oramos para que Deus abençoe nossos mártires e libertem nossos prisioneiros."

As discussões no último ano sobre o futuro papel dos Estados Unidos no Iraque, tanto dentro do governo quanto entre os dois países, deixou clara a capacidade cada vez menor dos EUA em definir os resultados no Iraque, bem como uma certa falta de interesse em um Congresso consumido por questões domésticas.
 

"Acho que pessoas muito cuidadosas acreditam que deveria haver uma presença residual no Iraque", disse Hill. "Mas há muitos americanos que não querem ouvir a palavra 'Iraque' e não irão defender uma presença contínua, portanto, há menos interesse por parte do Congresso."

Os planos do Departamento de Estado ainda precisam de aprovação do governo iraquiano e de financiamento do Congresso. O departamento pediu US$ 6,2 bilhões para financiar suas operações para o ano fiscal de 2012.

As apostas no Iraque permaneçam claras, assim como as inevitáveis perguntas sobre o seu futuro. Será que um governo frágil terá inclinação para o autoritarismo e para mais violência, ou ele irá se tornar estável e democrático? Será que os EUA deixam um legado positivo, um retorno pelo que gastou em vidas e dólares ao longo da guerra? Essa é uma meta que nenhuma tropa poderia garantir.

"Nunca houve uma garantia suficiente de um resultado aceitável", disse Richard N. Haass, presidente do Conselho de Relações Exteriores.

Hill, o ex-embaixador, expressou dúvidas semelhantes sobre qualquer intervenção continuada poder criar o forte aliado que os EUA esperavam ser o legado de uma guerra que custou tantas vidas americanas e iraquianas e prejudicou tanto os cofres dos EUA.

"Podemos dizer que é um aliado", disse Hill, "mas uma invasão nunca é uma boa base para a formação de uma aliança."

Tim Arango e Michael S. Schmidt

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