Search
Close this search box.

BR-CN – Retórica anti-China de Bolsonaro causa apreensão sobre Brasil em Pequim

Nota DefesaNet

Para o texto em inglês desta matéria cesse:

BR-CN – Bolsonaro's anti-China rants have Beijing nervous about Brazil Link

O editor

 

Por Jake Spring

Reportagem adicional de Marcela Ayers, Anthony Boadle e Maria Carolina Marcello em Brasília, Rodrigo Viga Gaier e Marta Nogueira no Rio de Janeiro

 

BRASÍLIA (Reuters) – O governo da China está tentando fazer as pazes com o candidato presidencial que lidera as pesquisas no Brasil, Jair Bolsonaro (PSL), cuja retórica anti-China ameaça esfriar um relacionamento comercial lucrativo que vem beneficiando os dois países.

Diplomatas chineses em Brasília se encontraram duas vezes com alguns dos principais assessores de Bolsonaro nas últimas semanas, segundo participantes das reuniões. Sua meta é ressaltar a cooperação no maior país da América Latina, cujos grãos e minerais abasteceram a ascensão da China e tiraram milhões de brasileiros da pobreza no boom de commodities resultante.

Bolsonaro retratou a China, a maior parceira comercial do Brasil, como um predador que quer dominar setores cruciais da economia.

Como sua própria economia desacelera, a China não pode se dar o luxo de se envolver em mais uma guerra comercial custosa como a que irrompeu entre Pequim e Washington.

O comércio bilateral entre a China e o Brasil foi de 75 bilhões de dólares no ano passado, de acordo com estatísticas do governo brasileiro. Desde 2003 a China investiu bilhões de dólares nos setores de petróleo, mineração e energia do Brasil, e está disposta a financiar projetos de ferrovias, portos e outras modalidades de infraestrutura para acelerar as remessas de grãos brasileiros.

Mas Bolsonaro, à semelhança do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, tem criticado a China insistentemente em sua campanha, dizendo que os chineses não deveriam ter permissão de possuir terras brasileiras ou controlar indústrias essenciais. Nacionalista ardoroso, Bolsonaro tem grandes chances de vencer o segundo turno de domingo com larga vantagem.

“Os chineses não estão comprando no Brasil. Eles estão comprando o Brasil”, alertou Bolsonaro diversas vezes.

 

Entre as empresas na alça de mira está a China Molybdenum, que comprou uma mina de nióbio de 1,7 bilhão de dólares em 2016. Segundo Bolsonaro, o próprio Brasil deveria desenvolver o empreendimento.

O nióbio é usado como um aditivo ao aço para tornar o metal mais forte e mais leve. A demanda pelo nióbio está em alta por montadoras, empresas aeroespaciais e uma série de outras indústrias.

O Brasil controla cerca de 85 por cento do suprimento mundial, e Bolsonaro quer que sua nação colha os benefícios.

Bolsonaro também já registrou sua oposição à privatização planejada de alguns ativos da estatal Eletrobras devido ao temor de que compradores chineses deem os maiores lances.

Autoridades da China Molybdenum não quiseram comentar, mas seis executivos de alto escalão de empresas chinesas que operam no Brasil disseram à Reuters que estão acompanhando os comentários do capitão da reserva com graus variados de inquietação.

“Estamos um pouco preocupados com suas opiniões extremas”, disse um executivo chinês de infraestrutura à Reuters.

Os flertes de Bolsonaro com Taiwan são igualmente incômodos para Pequim, que considera Taiwan uma província renegada.

Em fevereiro, Bolsonaro se tornou o primeiro candidato presidencial brasileiro a visitar Taiwan desde que o Brasil reconheceu Pequim como o único governo chinês, em consonância com a política de Uma China dos anos 1970.

A embaixada chinesa no Brasil emitiu uma carta classificando a viagem de Bolsonaro a Taiwan como uma “afronta à soberania e à integridade territorial da China”.

A postura combativa de Bolsonaro contrasta acentuadamente com o restante da América Latina, cujos líderes acolheram os investimentos, os empréstimos e as compras de commodities da China —e pode fazê-lo se chocar com os poderosos setores do agronegócio e da mineração, para os quais Pequim é um cliente indispensável.

As ações da Vale, a maior produtora de minério de ferro do mundo, por exemplo, atingiram sua maior cotação no mês passado graças à demanda chinesa por seu minério de alta qualidade.

O agronegócio, por sua vez, vem colhendo os benefícios do atrito da China com Trump. Pequim reduziu acentuadamente a compra de soja norte-americana, preenchendo o vácuo com grãos brasileiros. As exportações brasileiras de soja para a China aumentaram 22 por cento em valor neste ano, e atualmente cerca de 80 por cento das exportações de soja do Brasil têm a nação asiática como destino.

Por ora a guerra comercial EUA-China vem alavancando o Brasil, mas Jorge Arbache, ex-secretário de Relações Exteriores do Ministério do Planejamento, disse que o país não deveria abusar da sorte.

O Brasil “não pode se dar o luxo de abrir mão de seu maior parceiro comercial e de investimento”, disse Arbache. “Não existe uma economia no mundo que possa ocupar o espaço que a China ocupa”.

ENCONTROS PARTICULARES

Diplomatas chineses se reuniram com o principal conselheiro econômico de Bolsonaro, Paulo Guedes, no início de setembro para debater a importância do relacionamento bilateral, disse Qu Yuhui, ministro-conselheiro na embaixada de Brasília, à Reuters na segunda-feira.

A equipe chinesa retratou sua nação como uma parceira que não compete economicamente com o Brasil, segundo Qu, que esteve na reunião, e outra pessoa a par da questão.

Guedes recebeu um convite para ir à China fortalecer seu conhecimento sobre a segunda maior economia do planeta, disse Qu. Ele contou que os diplomatas chineses deixaram claro que gostariam de conhecer Bolsonaro em pessoa, mas nenhum encontro foi marcado.

“Independentemente de direita ou esquerda, queremos conversar e impulsionar o desenvolvimento suave das relações China-Brasil, que acreditamos beneficiarem os dois países”, afirmou Qu. “Temos confiança de que, quem quer que seja o presidente do Brasil, melhoraremos as relações China-Brasil”.

Guedes não respondeu a pedidos de comentário.

Se Bolsonaro for eleito, sua primeira reunião importante com os chineses aconteceria no início de sua Presidência —o Brasil sediará a cúpula dos Brics de 2019, um evento ao qual o presidente chinês, Xi Jinping, deve comparecer.

Bolsonaro está satisfeito com as compras chinesas de commodities, mas o capitão da reserva do Exército desconfia das muitas aquisições recentes de Pequim nos setores de energia e infraestrutura do Brasil.

Em 2016 a China Three Gorges Corp pagou 4,8 bilhões de reais para operar duas das maiores hidrelétricas brasileiras. No ano passado, a State Grid Corp da China adquiriu o controle da CPFL Energia e uma subsidiária por mais de 17 bilhões de reais, enquanto a HNA Airport Holding Group adquiriu uma participação majoritária do segundo maior aeroporto do país.

No momento se acredita que no ano que vem o Brasil negociará uma série de concessões e empresas estatais, entre elas ferrovias e ativos de energia.

Até agora Bolsonaro foi vago a respeito de como agiria para frear os investimentos chineses que considera indesejáveis. O Brasil não tem um equivalente do Comitê de Investimento Estrangeiro dos EUA, que analisa as implicações de investimentos estrangeiros em companhias norte-americanas sobre a segurança nacional.

Bolsonaro também precisa ser cauteloso com a gigantesca bancada do agronegócio, que ocupa mais de 40 por cento das cadeiras do Congresso.

A grande maioria dos agricultores apoia Bolsonaro, mas deixou claro que manter boas relações com a China, seu maior cliente de exportações, é essencial.

“A economia é muito mais importante do que a propaganda para conseguir votos”, disse o executivo de uma empresa do setor que não quis se identificar. “Não dá para mudar isso facilmente sem repercussões graves.”

 

 

Compartilhar:

Leia também
Últimas Notícias

Inscreva-se na nossa newsletter