A intervenção da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) no Afeganistão foi a mais ambiciosa e exigente de sua história, uma operação que chegou a pôr em xeque sua própria existência, mas que hoje é considerada o modelo para o futuro da Aliança, apesar das enormes dúvidas sobre seu resultado final.
O conflito afegão, dez anos após o início da intervenção liderada pelos Estados Unidos, serviu para testar as capacidades e os limites de uma organização que buscava sua identidade após o fim da Guerra Fria. O Afeganistão é não só a primeira operação aliada fora da Europa, mas de longe a maior e mais complexa em todos os sentidos.
Para o diretor do centro de estudos Carnegie Europe, Jan Techau, independentemente de seu sucesso ou fracasso, a missão afegã serviu para definir o papel da Otan para o hoje e o amanhã, como já mostra sua atual missão na Líbia. "Será uma ferramenta para dirigir intervenções, para 'multilateralizar' conflitos, algo indispensável", indica Techau à agência EFE.
No entanto, isso nem sempre foi assim. Por volta de 2008, muitos temiam que o Afeganistão pudesse representar um fracasso para a Otan, enfraquecida pelas divergências entre alguns de seus membros. À época, EUA e Reino Unido advertiram abertamente sobre isso, os dois países com mais soldados no organismo e com as áreas mais complexas a seu cargo, danificados pelo que consideravam insuficiente compromisso de outras potências como França e Alemanha.
"Há dois anos, o Afeganistão se via como um fracasso que podia enfraquecer a Otan", lembra Techau. A Aliança começou seu trabalho no Afeganistão em 2003, encarregando-se da chamada Força Internacional de Assistência para Segurança (Isaf, na sigla em inglês), inicialmente com 5 mil soldados e em uma região específica, que seria expandida de forma paulatina a todo o território afegão.
Após a nova orientação dada nos últimos anos, hoje há no Afeganistão mais de 130 mil soldados de 49 países, a maioria deles americana, mas com um papel muito relevante de outras nações. Trata-se, certamente, da primeira coalizão militar realmente global, com presença de todos os países-membros da Otan, mas também de países que vão da Nova Zelândia à Mongólia, da Armênia à Coreia do Sul.
O custo em vidas foi enorme, com mais de 2,7 mil militares mortos desde 2001, e persistem as dúvidas sobre se o trabalho de tantos anos atingirá o objetivo de estabilizar Afeganistão. A Otan começou em julho deste ano a transferir a responsabilidade da segurança às forças afegãs em sete províncias, após uma bem-sucedida ofensiva para acabar com os santuários talibãs no sul e leste do país.
Esse começo da transição é o ponto de partida de um processo que deve culminar no final de 2014 com Cabul controlando todo o território e, consequentemente, permitir a retirada da Otan. No entanto, os ataques da resistência talibã não param de aumentar, sobretudo contra a população civil, e fizeram com que a violência no país tenha aumentado em relação a anos anteriores.
Até o quartel-general dos aliados, na ultraprotegida "zona verde" de Cabul foi alvo nas últimas semanas dos atentados rebeldes, que veem na retirada progressiva das forças internacionais a oportunidade de recuperar o controle do país diante do temor de grande parte da população e do risco de guerra civil.
"Os resultados no terreno serão fundamentais. Se conseguirmos manter o êxito no campo de batalha (…), convenceremos os afegãos (de que poderão seguir adiante)", explica à agência EFE um alto comando aliado, sob condição de anonimato. Segundo esta fonte, a preocupação principal da Otan não são os "ataques espetaculares" dos últimos meses, mas manter o controle sobre todo o território e continuar formando as Forças Armadas e a Polícia do Afeganistão para que possam se encarregar da segurança do país.
Ainda com dúvidas sobre como e quando deixará o país, a Otan acredita que sai reforçada do Afeganistão e com capacidade demonstrada para "se encarregar da operação mais complicada do mundo, manter sua unidade, coesão e força ao longo dos anos", acrescenta. "Acho que quando esta missão for concluída, a Aliança emergirá mais forte, mais efetiva e mais unida do que nunca", resumia no ano passado o secretário-geral da Otan, Anders Fogh Rasmussen, em discurso.